“Vamos mudar a cara da biotecnologia latino-americana” foi a frase mais repetida durante o Primeiro Encontro Latino-americano de Jovens Líderes em Biotecnologia (Allbiotech), realizado em Santiago do Chile. Durante os dias 12 e 13 de Outubro, um grupo de 100 jovens líderes de diversos países da América Latina e mais de 30 palestrantes de grande prestígio discutiram os desafios atuais e futuros da bioeconomia da região. O Profissão Biotec esteve presente e foi representado por Caroline Salvati, líder de produção de conteúdos audiovisuais.
As principais linhas de discussão foram: Recurso Naturais, que envolveu os temas “extração de recursos de forma sustentável” e “futuro da agricultura”; Inovação, com foco na transferência de tecnologias e empreendedorismo na área de ciências da vida; e Impacto Social, como ponto principal a divulgação científica e as perspectivas futuras da biotecnologia.
Centro de Inovação UC Anacleto Angelini, da Pontifícia Universidade Católica do Chile, onde ocorreu o evento.
Dia 1
Na abertura do evento, houve uma palestra sobre Bioeconomia com Elizabeth Hodson, professora emérita da Pontificia Universidad Javeriana (Bogotá, Colômbia). Ela destacou as principais áreas em que a América Latina já está atuando, dentro da Bioeconomia (como bioenergia e agrária), e os maiores desafios: necessidade de estabelecimento de políticas nacionais sólidas, com incentivos atrativos; falta de integração com indústria-academia; e limitada capacidade de implementação de normativas que permitam acesso, aproveitamento e uso comercial dos recursos genéticos (biodiversidade).
Elizabeth Hodson apresentando os desafios da bioeconomia regional.
Em seguida, o tema “Extração Sustentável” foi abordado numa mesa redonda, que contou com a presença de Pamela Chávez (AguaMarina), Adrián Rodríguez, (CEPAL – ONU), Sofía Valenzuela (DiagnoChrome) e Pilar Parada (Fraunhofer – Chile). Foi discutida a necessidade de buscar tecnologias mais sustentáveis para as atividades extrativas, como florestal, aquicultura, mineração e outras, através do uso de biotecnologia. Para isso, é necessário que os pesquisadores olhem com humildade os problemas dessas indústrias e procurem, com olhar científico, novas soluções possíveis.
No entanto, o assunto “Agricultura” foi deixado para uma segunda mesa-redonda, tendo em vista a importância desta atividade econômica na América Latina. Com a presença dos seguintes profissionais da área, Juan Izquierdo (RedBio – FAO), Dominique Chaveau (Fundación para la Innovación Agraria), Juan Eduardo Correa (Monsanto) e Miguel Ángel Sánchez (ChileBio) foi abordado o papel da biotecnologia no futuro do campo, tanto na redução de perdas na produção pelo uso de plantas melhoradas geneticamente, seja por métodos tradicionais ou moleculares, e aplicação de biofertilizantes, bioinseticidas, etc. Outro grande desafio discutido foi o uso dessas tecnologias no cenário da agricultura familiar, de forma sustentável e socialmente justa.
Mesa-redonda “Futuro do Campo”, com a presença de profissionais e pesquisadores da área. Fonte: Allbiotech.
No período da tarde, houve uma mesa-redonda sobre Transferência Tecnológica, que abordou a problemática e a falta de incentivo das universidades e institutos de pesquisa em transferir as tecnologias e torná-las um produto comercializável. Para tal fim, foi discorrido sobre a importância de parcerias universidade-empresa e de ferramentas de Propriedade Intelectual. Um time muito competente formou essa mesa-redonda: Addy Lian (Secretaria de Inovação, Ciência e Tecnologia – México), Loreto Valenzuela (FishExtend), Álvaro Ossa (Direção de Transferência e Desenvolvimento – UCDC), Emilio Sancristán (Nervive) e Alex Berg (Unidade de Desenvolvimento Tecnológico -UdC).
Em seguida, a pauta foi “Bioempreendedorismo”, em uma mesa-redonda com profissionais ilustres de aceleradoras de startups (Bernardo Herrera – Start Up Chile), empresas de investimento (Bernadita Araya – Aurus e Pablo Fernandes – Alerce VC) e empreendedores da América Latina (Camila Sepúlveda – The Not Company e Diego Belmar – Phage Technologies).
Foi destacado pelos membros da mesa que, embora o capital humano seja tão capacitado na América Latina quanto nos Estados Unidos, o “ecossistema” inovador lá é mais dinâmico: há muitos investidores, rede de contatos extensa, maior cobrança e velocidade no desenvolvimento de empreendimentos. Criar esse ecossistema é um dos grandes desafios da América Latina, além de estimular os empreendedores a criar um sentido de urgência, acelerando o desenvolvimento da startup, e incentivá-los a pensar grande, buscando regulamentações de qualidade internacionais para poderem inserir-se nesse contexto.
No final do dia, Alberto Rodríguez, cirurgião-médico e CEO da Levita Magnetics (EUA), contou um pouco da sua trajetória empreendedora, desde a ideação ao desenvolvimento de tecnologias baseadas em magnetismo para realizar cirurgias minimamente invasivas. Destacou também o caminho trilhado desde um hospital em Santiago do Chile até a criação da empresa no Vale do Silício.
Alberto Rodríguez apresentando as novas tecnologias para diminuir o número de incisões e melhorar a qualidade de vida dos pacientes. Fonte: Allbiotech.
Dia 2
Na manhã do dia 13, o foco foi a Cultura Científica e Percepção Pública. Com uma interessantíssima palestra de Gabriel León, pesquisador e diretor do Centro para a Comunicação de Ciência da Universidad Andrés Bello, foi apresentado a problemática da falta de comunicação científica de qualidade para população, que gera imagens distorcidas da profissão de cientista e medo das tecnologias geradas. Sobretudo, o alto consumo atual de informação pelas redes sociais muitas vezes ajuda na propagação de rumores e movimentos infundados, como os militantes “anti-vacinas”. Por tal razão, ele defende que os pesquisadores devem sair do laboratório e conversar com o restante da população, dando a todos o direito de fazer perguntas e de ser críticos com a informação.
Em seguida, foi organizada uma mesa redonda sobre o assunto, com a presença de Cristián Hernandez, (Andes Biotechnologies), Oscar Contreras, (Fundación Ciencia Joven e Fundación Ecoscience Chile) e Maria Mercedes Roca (ISGP – Institute on Science for Global Policy). Discutiu-se a importância de aproximar a ciência ao dia-a-dia da sociedade, da dificuldade da relação entre o jornalismo e a ciência, que muitas vezes distorce alguns conceitos. Além disso, algumas metodologias utilizadas pelos membros da mesa para instigar a curiosidade e comunicar as informações.
“O futuro da biotecnologia” foi o assunto discutido na mesa-redonda seguinte. Biohacking, engenharia genética, próteses produzidas em impressoras 3D, open science foram alguns dos pontos principais de discussão entre Fernan Federic (BioFab Lab), Gino Tubaro (Atomic Lab), Carolina Sepúlveda (CORFO-Chile) e Ana Sifuentes (iGEM).
Após, Ryan Bethencourt inspirou os participantes do evento com uma palestra sobre sua atuação na IndieBio, a maior aceleradora de startups de ciências da vida, localizada no Vale do Silício (Califórnia, EUA). O palestrante apresentou diversos cases de sucesso, desde empresas que estão produzindo “carne de laboratório” até gravatas de seda de aranha em leveduras transformadas geneticamente.
Ryan Bethencourt, Diretor de Programas e Investidor em IndieBio. Fonte: Allbiotech.
No período da tarde, houve “Ignite talks”, onde alguns líderes puderam apresentar os projetos que estão desenvolvendo: criação de uma empresa de fecundação in vitro de bovinos (Ine Hiriart, Argentina), fitorremediação de água contaminadas (Lilian Gonzalez, Bolívia), microbioma associado a plantas (Felix Moronta, Venezuela), engenharia metabólica (Daniel Hernandez, Uruguai).
A última atividade do evento foi um “Biohackathon”, ou seja, uma maratona na qual os líderes se reuniram para buscar alguma solução para 15 desafios atuais da América Latina. Usando metodologias como Design Thinking, os líderes apresentaram suas propostas em um pitch de 3 minutos, e a melhor e mais impactante, escolhida por voto popular, foi vencedora do evento. Com objetivo de produzir proteínas de inseto para alimentar a população, de forma a otimizar o uso de espaços urbanos, a equipe do desafio “Biotecnologia aplicada ao desenvolvimento de cidades mais sustentáveis” conquistou a vitória no Biohackaton.
CANVAS de resolução do desafio do Biohackaton
Embora o Allbiotech esteja na sua primeira versão, ele já foi realizado em alto nível: palestrantes ilustres, equipe de organização muito competente e líderes extremamente motivados. Diferente de outros eventos científicos, este se propõe não só a discutir ciência, mas também a mudar pessoas e motivá-las a construir um futuro melhor para a biotecnologia na América Latina. Se você quer fazer parte dessa equipe, fique ligado no site e no Facebook do Allbiotech, afie seu portuñol e prepare-se, pois ano que vem o evento ocorrerá no México. 😉
“Se quer ir rápido, vá sozinho. Se quer ir longe, vá em grupo.”