Biosensor: um insight em um mundo de possibilidades

O mundo é como você o percebe e interage com ele. Das pequenas coisas sociais, como a magia de um olhar, aos milhões de mecanismos físico-químicos que interagem simultaneamente, muitos dos quais não somos capazes de perceber. O mundo em que vivemos é tão molecular quanto uma mesa de bar na sexta-feira. Tudo está em como percebemos nosso entorno. Das forças de Van Der Waals, interagindo nas proteínas dentro de um copo de cerveja, às pontes dissulfeto, estabilizando a queratina dos cabelos vermelhos da ruiva que te lançou um breve olhar. Há quem diga que a vida é assim: uma metáfora molecular.  

Neste mundo de interações físico-químicas, os biossensores podem combinar diferentes componentes biológicos com a finalidade de sinalizar ou mesmo  quantificar a presença de uma determinada substância. É impressionante imaginar que o mundo a nossa volta é um “liga e desliga” molecular – sendo simplista, claro – pois descrever como os componentes moleculares interagem ou deixam de interagir é uma coisa que ainda estamos aprendendo enquanto humanidade. No entanto, a União Internacional de Ciência Pura e Aplicada (IUPAC, do inglês International Union of Pure and Applied Chemistry), define um Biossensor como um “instrumento integrado que é capaz de fornecer uma informação analítica específica quantitativa ou semi-quantitativa através do uso de um elemento de reconhecimento biológico que está em contato direto com o elemento transdutor’’.

Complicado né?! Ou não! Basta fazer a conexão com aquilo que já conhecemos: Um biossensor está intimamente ligado a essência da descrição de biotecnologia no que tange “à utilização de organismos ou partes destes” para a produção de bens e processos de interesse. Os Biossensores acoplam a funcionalidade de um elemento biológico, altamente específico e seletivo, ao poder de sensibilidade de ferramentas eletrônicas capazes de captarem o sinal gerado e o transmitirem como um sinal mensurável.

Existe uma gama de transdutores (a pecinha na máquina que entende que aquilo é um componente e pode emitir um tipo de sinal mensurável) como óptico, piezoeléctrico (cristais de quartzo), magnético, micromecânico (viscosidade, pressão, força de oscilação). Dependendo do tipo de componente celular ou substância que se pretende identificar, um destes sistemas apresentados pode ter maior grau de eficiência.

Enzimas, cofatores, receptores, anticorpos, células de micro-organismos, tecidos de plantas e animais ou organelas, são  bons exemplos de elementos biológicos e são de fundamental importância para o biossensor, pois conferem a especificidade da análise [1]. Por outro lado, a biotecnologia apresenta grandes potenciais de sustentabilidade, sendo capaz de complementar ou até mesmo substituir processos químicos tradicionais, muitas vezes caros, menos eficientes e mais agressivos ao meio ambiente.

Dermal Abyss: Possibilities of Biosensors as a Tattooed Interface.

Se refletirmos um pouco, a aplicação prática dos biossensores está no limite da imaginação, se esta tiver limite, é claro! Uma boa prova deste conceito é o projeto Dermal Abyss que apresenta uma abordagem inovadora para biointerfaces, onde a superfície do corpo é exibida de forma interativa. As tintas de tatuagem tradicionais são substituídas por biossensores cujas cores mudam em resposta a variações no fluido intersticial. Este insight combina avanços na biotecnologia com métodos tradicionais de tatuagem. Ainda está em fase de pesquisa, mas é um bom exemplo de como podemos interagir com o mundo a nossa volta criando os mais variados dispositivos em prol da vida [2].

Os pesquisadores estão investigando como os Biossensores respondem a partir de informações bioquímicas contidas nos fluidos corporais. Como se trata de um projeto de pesquisa, eles estão usando tecidos epiteliais de porcos (Sus scrofa domesticus). No qual, um dos sistemas propostos objetiva determinar a quantidade de Sódio (Na),  outro, descrever faixas de pH por um sistema de cores quando excitado pela luz UV. A partir de uma faixa de cor, que pode ir de azul a marrom, os pesquisadores pretendem descrever a quantidade de glicose.   

Em um futuro não muito distante, a tatuagem poderia ser usado no monitoramento contínuo de portadores de doenças crônicas, como diabetes, sendo capaz de gerar um tipo de diagnóstico, da mesma forma “codificar dados do corpo humano em tempo real”.

Mas, se nós olharmos para o passado, em 1956, Leland C. Clark Jr. já brincava de fazer ciência, o que possibilitou que ficasse conhecido mais tarde como o pai do conceito “biossensor”. Ele apresentou o primeiro biossensor ao mundo: o eletrodo de oxigênio. Este, quando modificado com enzimas, evoluiu para um meio de detecção de glicose e passou a ser comercializado em 1972. Desde então, os biossensores têm sido usados em diversas áreas como o diagnóstico médico, monitoramento do meio ambiente e indústria alimentar [3].

Leland C. Clark Jr

A biotecnologia nos últimos 60 anos caminha a passos largos, e quanto mais aprendemos ou percebemos o mundo a nossa volta, mais somos capazes de criar novas coisas sobre o alicerce do conhecimento que já temos, o que nos permite desenvolver novos dispositivos com características mais eficientes e tornar os métodos de análise mais rápidos e acessíveis. Um insight, uma tatuagem, um diagnóstico, talvez fosse loucura imaginar isso há 60 anos atrás.

Parafraseando o autor Jack Kerouac:

“Os loucos. Os desajustados. Os rebeldes. Os criadores de caso. Os pinos redondos nos buracos quadrados. Aqueles que vêem as coisas de forma diferente (….) mudam as coisas. Empurram a raça humana para a frente. E, enquanto alguns os vêem como loucos, nós os vemos como geniais. Porque as pessoas loucas o bastante para acreditar que podem mudar o mundo, são as que o mudam.”

Tem um insight sobre biotecnologia? comenta aí!

 

[1] A. M. SALGADO , G. JACOBY e L. A. de PAULA. O estado da ciencia do desenvolvimento de biossensores a nível nacional  em Tec. Proc. Quim. e Bioq.Escola de Química. Universidade Federal do Rio de Janeiro. Rio de Janeiro, 2001. Disponível em: <https://run.unl.pt/bitstream/10362/7794/1/Vaz_2012.pdf >. Acesso em 17 de junho de 2017.

 

[2] K. Vega, V. Kan, X. Liu, N. Barry, P. Maes, Joseph Paradiso  

MIT Media Lab, Cambridge, Massachusetts, Estados Unidos. Disponível em: <https://www.media.mit.ed3u/projects/d-Abyss/overview/> . Acesso em 17 de junho de 2017.

 

[3] A. C. Vaz. Tese de Mestrado em Engenharia Biomédica, Faculdade de Ciências e Tecnologia. Universidade Nova de Lisboa. Portugal. Disponível em: <

http://pdf.blucher.com.br.s3-sa-east-1.amazonaws.com/chemicalengineeringproceedings/cobeq2014/1873-17087-137387.pdf >. Acesso em 17 de junho de 2017.

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