Curativos Bioativos: aliando biotecnologia ao tratamento de feridas

A pele, o maior órgão do nosso corpo, é a primeira barreira de defesa ao ambiente externo. Contudo, nem sempre essa barreira se mantém intacta: o dano a ela pode ser causado por acidentes, queimaduras, traumas ou feridas crônicas, podendo deixar os indivíduos machucados mais suscetíveis a infecções. Pacientes diabéticos, em especial, apresentam graves problemas em função da dificuldade de cicatrização, algumas vezes levando à amputação de membros.

Durante a cicatrização de feridas, curativos são utilizados para proteger os tecidos da derme e da epiderme. O desenvolvimento e a fabricação deles são, aliás, importantes segmentos das indústrias médica e farmacêutica. No passado, curativos tradicionais como bandagens naturais e/ou sintéticas, algodão e gaze eram utilizados para manter o ferimento seco, permitindo a evaporação de exsudatos da ferida e impedindo a entrada de micro-organismos danosos. Atualmente, a fabricação destes atingiu altos padrões e agora é baseada no conceito de criar um ambiente ótimo, no qual há a aceleração da cura da ferida, regeneração da pele, troca de oxigênio e prevenção da colonização microbiana.

Ferimento recoberto com gaze. 

Os curativos bioativos são preparados a partir de polímeros que participam efetivamente no processo de cicatrização. Também incluem produtos de engenharia de tecidos, derivados de fontes naturais ou artificiais. Estas tecnologias normalmente utilizam polímeros naturais, como colágeno, ácido hialurônico, quitosana, alginatos, entre outros. Estes biomateriais são atrativos devido à sua biocompatibilidade, ou seja, não causam reações adversas, tóxicas ou carcinogênicas ao paciente, além de serem biodegradáveis.

Além dos polímeros naturais, há diversos sintéticos sendo utilizados para o desenvolvimento de curativos, como poli(ácido lático), poli(ácido glicólico), policaprolactona e polietilenoglicol, já que também apresentam características como biocompatibilidade, além de alguns também serem biodegradáveis. Em alguns casos, a estes polímeros naturais ou sintéticos podem ser incorporados compostos ativos, como antimicrobianos, os quais podem prevenir ou tratar infecções, e fatores de crescimento, que atuam ativamente na cicatrização da ferida.

Com relação à incorporação de outras substâncias  aos curativos, já estão disponíveis no mercado produtos contendo prata nanocristalina (ActicoatTM), iodopovidona (InadineTM) e mel (MedihoneyTM), compostos e substâncias cujas propriedades antimicrobianas são conhecidas. No que concerne ao uso de fatores de crescimento, o fator de crescimento derivado de plaqueta – PGDF, por exemplo, está presente no RegranexTM, para auxiliar no processo de cicatrização de ferimentos. Fibroblastos humanos também podem ser componentes de curativos, como é o caso do DermagraftTM.

Para exemplificar o modo de ação de um desses produtos, de acordo com a empresa fabricante do InadineTM  e de artigos científicos, a iodopovidona, que é a substância ativa do curativo, apresenta um amplo espectro de ação, sendo efetiva até mesmo contra Staphylococcus aureus resistentes à meticilina (MRSA). A substância é liberada de forma gradual e está contida em uma base polimérica de polietilenoglicol, atuando na proteção da ferida e tratando infecções prévias. De acordo com o website da empresa, uma vantagem deste produto é a possibilidade de verificar através da perda da coloração do mesmo, que é originalmente laranja e se torna branco, quando é necessário trocá-lo. Assim, evita-se que ocorram trocas desnecessárias.

Alternativamente à adição de compostos bioativos, há também sistemas com pressão negativa (AvanceTM) ou a vácuo, que auxiliam no controle da drenagem de secreções e na redução da carga bacteriana. Se ficou curioso a respeito desse curativo a vácuo, pode ver este vídeo (em inglês), no qual há uma demonstração de como funcionam.

Curativo de alginato de cálcio (polímero) e mel (propriedades antimicrobianas) da marca MedihoneyTM

A cicatrização de feridas é um processo com cinco estágios: hemostase, inflamação, proliferação e maturação. Nestas etapas uma variedade de células e componentes da matriz atuam juntos para restabelecer a integridade do tecido lesado e o reparo do mesmo. Dessa forma, com o auxílio dos curativos bioativos é possível evitar que contaminações microbianas tragam prejuízos para este processo de cicatrização, bem como o auxílio de fatores de crescimento e de células irão acelerar esse processo.

Etapas de cicatrização de feridas. Adaptado de Inova News Room

É importante destacar que trouxemos apenas alguns exemplos de curativos bioativos que estão no mercado. Há ainda outros produtos disponíveis para comercialização, combinando os mais diversos polímeros e compostos ativos. Além disso, há muita pesquisa nesta área, principalmente em função da grande resistência dos micro-organismos aos fármacos disponíveis, o que aumenta  ainda mais os casos de infecções em âmbito hospitalar.

Parece que as antigas bandagens ficaram no passado, não é mesmo? A Biotecnologia agora nos ajuda também no combate a feridas!

 

Referências

1) Berthet, M., Gauthier, Y., Lacroix, C., Verrier, B., Monge, C., 2017. Nanoparticle-Based Dressing : The Future of Wound Treatment ? Trends Biotechnol. 35, 770-784. doi:10.1016/j.tibtech.2017.05.005

2) Boateng, J.S., Matthews, K.H., Stevens, H.N.E., Eccleston, G.M., 2008. Wound healing dressings and drug delivery systems: a review. J. Pharm. Sci. 97, 2892–2923.

3) Carvalho, I.C., Mansur, H.S., 2017. Engineered 3D-scaffolds of photocrosslinked chitosan-gelatin hydrogel hybrids for chronic wound dressings and regeneration. Mater. Sci. Eng. C 78, 690–705. doi:10.1016/j.msec.2017.04.126

4) Felgueiras, H.P., Amorim, M.T.P., 2017. Colloids and Surfaces B : Biointerfaces Functionalization of electrospun polymeric wound dressings with antimicrobial peptides. Colloids Surfaces B Biointerfaces 156, 133–148. doi:10.1016/j.colsurfb.2017.05.001

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