O que é o autismo?
O transtorno do espectro autista (TEA) é um distúrbio do comportamento caracterizado por alterações das funções neurológicas e cognitivas. Dentre elas, está a dificuldade de socialização e aprendizagem, além do comprometimento em realizar atividades da vida diária, como escovar os dentes ou calçar sapatos. Pessoas afetadas por esse transtorno podem apresentar estereotipias (comportamentos repetitivos que visam à autoestimulação), disfunção sensorial, comorbidades gastrointestinais, dentre outros.
Figura 1. Davi, 8 anos, diagnosticado com autismo infantil, durante fonoterapia, cujo objetivo é estimular o contato visual e interação social.
Quais as causas do autismo?
Existem várias possíveis causas para o transtorno, e uma delas é a genética! Para a formação das estruturas do sistema nervoso, é necessário que ocorra uma sequência de estímulos químicos para desencadear os processos celulares: proliferação, migração e conexão dos neurônios nas sinapses para a transferência dos neurotransmissores.
A poda neural é o procedimento fisiológico responsável por deletar conexões neuronais excessivas, para tornar a comunicação neuronal mais eficaz. A alteração em alguma destas etapas, regulada pelos genes, pode afetar o funcionamento de tal maneira que o indivíduo apresente os sintomas que caracterizam o autismo.
Algumas síndromes podem desencadear o autismo, como a síndrome do X frágil, a esclerose tuberosa, a síndrome de Rett, a síndrome de Willians, dentre outras. Além disso, sabe-se que pessoas com autismo podem apresentar anormalidades cromossômicas mais frequentes do que a população geral.
Várias pesquisas detectaram a presença de anormalidades no cromossomo 7q e 13, por exemplo. A região 15q11-13 é outro exemplo de região cromossômica que pode apresentar duplicações de segmentos de DNA, o que a torna vulnerável a rearranjos, comuns em pessoas com TEA.
Contudo, pacientes que não apresentam alterações genéticas também podem ter comprometimento no seu desenvolvimento. Outras explicações plausíveis envolvem fatores ambientais (como intercorrências no útero materno na gestação), alteração do sistema imune e conformações alteradas de proteínas. Apesar das várias possibilidades apresentadas, ainda não se sabe ao certo a causa específica do autismo. Acredita-se que fatores genéticos e ambientais relacionam-se entre si para estas manifestações.
Mundo azul? Como assim?
O azul é conhecido como a cor representativa do autismo. Isso porque este quadro é cerca de 80% mais comum em meninos do que em meninas. Os cérebros masculinos e femininos apresentam diferenças quanto ao desenvolvimento, desde o início do desenvolvimento. A ocorrência de mutações (que são pequenas modificações genéticas) pode desorganizar o desenvolvimento neurológico.
O número de mutações necessárias para o desenvolvimento dos sintomas em meninas é muito maior do que em meninos. Em outras palavras, devem ocorrer alterações mais significativas nelas do que neles para a manifestação dos sintomas autísticos. Além da cor azul, também é usado um símbolo em forma de laço preenchido por um quebra-cabeça, que representa a complexidade e o enigma do distúrbio.
Figura 2. A fita feita de peças de quebra-cabeça coloridas representa o mistério e a complexidade do autismo e é um símbolo mundial da conscientização em relação a esta patologia.
Quais são as contribuições biotecnológicas no autismo?
O desenvolvimento de tecnologias de genotipagem favoreceu pesquisas na área de genética de associação para avaliação de marcadores polimórficos de DNA (SNPs) em pacientes autistas. Devido os avanços em tecnologias de microarranjo, nas quais muitas amostras de DNA podem ser analisadas de forma simultânea, tem sido possível a investigação de milhares de SNPs com apenas uma reação de hibridização, com baixo custo e alto rendimento.
Além dos SNPs, técnicas de biotecnologia, como a reprogramação de células, têm sido utilizadas em células embrionárias de dentes de leite para criar neurônios e astrócitos (células responsáveis por sustentar os neurônios e filtrar o que chega do sistema sanguíneo) e investigar o efeito de combinações entre amostras normais e de pacientes autistas.
Na tese de doutorado desenvolvida por Fabiele Baldino Russo, aluna da Universidade de São Paulo, foi observado que uma inflamação nos astrócitos poderia ser uma das causas do autismo.
Figura 3. Representação da estrutura de neurônios cultivados com diferentes astrócitos e seu efeito nas ramificações neuronais.
O uso de biomarcadores é outra ferramenta biotecnológica que tem sido utilizada para desvendar os mistérios do mundo azul. Recentemente, um grupo de pesquisadores publicou um artigo cujo objetivo foi detectar o autismo em amostras de sangue e urina, a fim de avaliar diferenças químicas entre dois grupos amostrais (diagnosticados com TEA e não diagnosticados) Eles observaram níveis mais elevados do marcador de oxidação “ditirosina” e de proteínas e gorduras conhecidas como “produtos finais da glicação avançada” (PFGA).
O mais interessante é que este exame obteve uma porcentagem de acerto de 90%, o que abre uma possibilidade de que esses biomarcadores sejam usados para o diagnóstico de pessoas com autismo. Ainda são necessários maiores ajustes ao teste, contudo ele representa uma ferramenta biotecnológica promissora, devido ao menor custo em relação aos exames genéticos, eficiência e fácil interpretação. Sensacional, não é mesmo?
Torcemos para que as contribuições biotecnológicas continuem sendo ferramentas inovadoras e proporcionem maiores avanços para o entendimento da genética no autismo. E você, conhece outras técnicas ou pesquisas interessantes com este tema? Compartilhe conosco! O profissão Biotec adora interagir e ampliar conhecimento com os leitores.
REFERÊNCIAS
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GUPTA, Abha R; STATE, Matthew W. Autismo: genética. Rev. Bras. Psiquiatr., São Paulo , v. 28, supl. 1, p. s29-s38, May 2006 . Available from <http://www.scielo.br/scielo.php?script=sci_arttext&pid=S1516-44462006000500005&lng=en&nrm=iso>. access on 05 Mar. 2018. http://dx.doi.org/10.1590/S1516-44462006000500005.
SUTCLIFFE, J.S, DELAHANTY RJ, PRASAD HC, MCCAULEY JL, HAN Q, JIANG L, LI C, FOLSTEIN SE, BLAKELY RD. Allelic heterogeneity at the serotonin transporter locus (SLC6A4) confers susceptibility to autism and rigid compulsive behaviors. Am J Hum Genet.;77(2):265-79, 2005.
Excelente artigo.
Gostaria de mais informações sobre profissionais da biotecnologia que possam orientar sobre a realização de exames para verificação de níveis de oxidação de ditirosina e de produtos finais da glicacao avançada (AGE). Tenho um filho de 14 anos submetido à avaliação clínica. Como pai e adulto também possuo praticamente todas as características da síndrome de asperger, elevadíssimas memória e capacidade de concentração, qi muito além da média, isolamento social por falta de paciência com pessoas lerdas etc. Rotulado pelos colegas de Sheldon ou Dr. Hause, caricaturas dos aspeis etc. Tal me deu enorme vantagem na vida acadêmica e profissional . Sou pós doutor em Direito pela Universidade de Roma La Sapienza, professor universitário, procurador federal, com louvor a acadêmico etc. Tenho formação acadêmica na área de Teoria do Conhecimento. E venho acompanhando as pesquisas sobre TEA tanto entre geneticista como entre neurologistas e endocrinologistas. Procuro profissionais para os referidos exames, mesmo sabendo que os resultados não são conclusivos devido ao fato de as pesquisas se encontrarem em andamento. Tendo conhecimento de que o autismo não sindrômico tem origem genética é hereditária, procuro fazer meu diagnóstico clínico, mas aparado com exames laboratoriais mesmo que meramente indicativos. Com o que aumentaria a probabilidade de acerto no diagnóstico do meu filho. Moro no Rio de Janeiro Capital. Obrigado. Aguardo contato.