A história do Halloween remonta a uma tradição celta de mais de dois mil anos, o Samhain, onde se comemorava o fim do verão e das colheitas, e o início do inverno. Era o ano novo celta. Eles acreditavam que durante a noite de transição de estações, ou seja, 31 de outubro de acordo com o calendário da época, o mundo dos vivos e dos mortos se aproximava. Assim, a festa era uma forma de se comunicar com seus ancestrais e, ao mesmo, afastar maus espíritos e energias ruins através de máscaras, fantasias, jogos de adivinhações e muita fartura.

Com o passar do tempo e com o surgimento de outros povos e crenças, o Halloween foi perdendo suas superstições. Com o cristianismo, ele ficou intitulado como “Dia de Todos os Santos”. Hoje, esse dia é mais visto como uma brincadeira de “gostosuras ou travessuras”, que dá margem para a imaginação das crianças e um momento para grandes histórias de terror.

Mas você sabia que o Halloween pode ter muito a ver com a ciência? Selecionamos 3 formas de encarar o famoso dia das bruxas com um olhar biotecnológico!

via GIPHY. “Bruxa, eu sou fabulosa”. Cena do filme “Abracadabra” (1993), comédia que conta a história de uma noite de Halloween em que três bruxas irmãs voltam da terra dos mortos para finalizar seus feitiços e horrores com crianças. Fonte: GIPHY

“Abóbora viva”

As abóboras esculpidas e iluminadas são um dos maiores símbolos do Halloween. Sua origem se deve à lenda do “Jack da Lanterna”. Conta-se que Jack enganou o Diabo por duas vezes e em troca conseguiu que sua alma não fosse condenada ao inferno. No entanto, Deus também não poderia recebê-lo no céu devido às suas tramóias. Então Jack foi obrigado a vagar pela noite com um punhado de carvão para iluminar sua lanterna, que colocou dentro de um… nabo?!

Vocês esperavam abóboras não é?

Então, originalmente eram utilizados nabos, beterrabas e batatas para se esculpir rostos de terror. Quando os irlandeses chegaram ao Estados Unidos trazendo resquícios da antiga cultura celta, passaram a ser usadas as abóboras. Os rostos desenhados em frutas e vegetais são uma forma de afastar Jack, que permanece vagando pela Terra.

Ilustração do filme “O Estranho Mundo de Jack” (1993), de Tim Burton, que se baseia na lenda de Jack, colocando-o como “Rei das Abóboras” para contar a história do dia em que o Halloween quis se transformar em Natal. Fonte: uncannyknack/Deviantart

Seria isso que faz a abóbora viva? Não! Histórias à parte, a abóbora possui uma característica inerente à vida: DNA! E para provar sua existência, nós podemos extraí-lo como apresentado no passo-a-passo abaixo e que pode, inclusive, ser realizado na cozinha de casa.

Esquema para extração de DNA de abóbora baseado em Ponto Ciência.

A extração de DNA consiste na separação do DNA de outros componentes celulares como proteínas, organelas e citoplasma, com o objetivo de purificá-lo para posteriores análises. Estes estudos auxiliam na identificação de doenças, na determinação de testes de paternidade, na diferenciação de micro-organismos e na criação de organismos geneticamente modificados, sendo este um processo básico na área molecular.

Como visto no infográfico, tudo se inicia a partir de uma amostra, no caso a abóbora. Seu corte em pedaços seguido pela trituração em um liquidificador é uma forma de quebrar a parede celular, expondo o conteúdo interno da célula. A temperatura um pouco quente da água promove uma agitação celular maior, agilizando o processo. A peneira é a primeira fase de isolamento, na qual extraem-se componentes celulares menores, formando uma fase aquosa.

O detergente é uma etapa de lavagem afetando a permeabilidade da membrana celular, constituída em sua maior parte por lipídeos, desestabilizando-a. O rompimento da membrana expõe o conteúdo celular. Segue-se o processo de filtração, isolando-se agora os componentes genéticos dos celulares. Por fim, o álcool, juntamente com o sal anteriormente colocado, desidrata o DNA, que por sua vez se agrega, formando uma massa filamentosa e esbranquiçada. Por ser insolúvel em álcool, o DNA se concentra na superfície da solução, podendo ser vistos a olho nu.

Outros experimentos interessantes envolvendo abóboras e outros símbolos do Halloween podem ser encontrados aqui e aqui. Boa diversão!

“DNA zumbi”

Você já pensou em tatuar na pele o DNA de um ente querido? As novas tecnologias utilizadas para tatuagens já foram abordadas pelo Profissão Biotec, mostrando aplicações muito além de uma arte corporal. O Halloween brinca com o desconhecido e traz em sua essência uma conexão com o submundo que faz parte da crença de diversas pessoas. Inspirada nessa conectividade além da vida, a empresa americana de biotecnologia Endeavour Life Sciences criou uma tecnologia chamada “Everence”, que consiste basicamente em incorporar DNA em tatuagens.

A pessoa interessada envia o material biológico (fragmento de pele, cotonete, sangue, cabelo, saliva) para a empresa, que o amplifica e depois o encapsula em polimetilmetacrilato (PMMA), um polímero transparente popularmente conhecido como acrílico e já bastante consolidado na área biomédica.

Estas microcápsulas acrílicas se agregam formando um pó branco e fino, biocompatível e não absorvível, que pode ser misturado com tinta de tatuagem tradicional. Como as microcápsulas estão totalmente fechadas, a princípio o conteúdo dentro delas nunca entrará em contato com o tecido do corpo do cliente, garantindo sua segurança.

Outros materiais como areia, água do mar, cinzas cremadas, tecidos animais e vegetais, dentre outros, também podem ser encapsulados e utilizados na arte corporal, agregando à tatuagem um significado especial baseado na vivência ou saudade de cada um. A intenção é que as pessoas de fato carreguem consigo uma parte daqueles que já se foram e sintam-se melhor a cada memória relembrada e agora marcada na pele.

 Viva - A Vida é uma Festa
A animação “Viva – A Vida é uma Festa” (2017), da Pixar, explora a morte de uma forma alegre e comovente baseada na celebração mexicana do “Dia dos Mortos”. A história une o mundo físico e o espiritual, sendo que o festival equivale ao Halloween em outras culturas. Fonte: Adoro Cinema

Mas calma, você pode marcar sua pele de outras formas para celebrar o Halloween. As fantasias e adereços compõem a transformação visual de pessoas em seres míticos como bruxas, zumbis, fantasmas, entre outros. A representação de pele e sangue é uma das mais clássicas para assombrar os amigos.

Um dos ingredientes-chave desta combinação é a gelatina. Famosa como antigo ingrediente para meios de cultura, ela ainda é acessível e de fácil preparo para você fazer sua “pele artificial”. A capacidade solidificante da gelatina associada a sua estrutura flexível permite diversas criações. Vários vídeos podem ser encontrados no Youtube com o passo-a-passo em casa para elaborar a massa e fazer cortes, feridas e cicatrizes.

Outro componente para esta arte horripilante é a fenolftaleína, um indicador de pH. Quando misturada em uma substância ácida, a fenolftaleína fica incolor; já  em contato  com uma substância básica, ela torna-se rosa. Ao ser jogada em alguma superfície branca, essa mistura mancha o local de rosa escuro, assemelhando-se a sangue, conforme a concentração. No entanto, com o passar do tempo e aumento da temperatura, a base presente evapora, a fenolftaleína volta a ser incolor e a mancha desaparece! Esse experimento é conhecido como “sangue do diabo” e pode render grandes sustos sem perder suas roupas como prejuízo.

Solte a imaginação e choque todo mundo!

“Halloween Potter”

O Halloween se destaca por suas cores, sendo o preto e o laranja as mais clássicas. Essas cores também são originárias da cultura celta, onde acreditava-se que elas representavam a morte e a colheita do outono, respectivamente, simbolizando seres das trevas em contraste com a vitalidade. O roxo veio mais tarde, representando a magia e seres místicos. Esta cor está ligada ao incrível, mas inexplicável: a bruxaria. E é aí que entramos em um dos universos mais emblemáticos já criados: Harry Potter.

Você sabia que diversos feitiços e poções apresentados na saga foram baseados em grandes antiguidades da história e da literatura mundial? Na exposição que virou livro e documentário  “Harry Potter: Uma História de Magia” a escritora J. K. Rowling conta as teorias, ideias e ciência em que se inspirou para criar toda a saga, como conceitos de alquimia, histórias da mitologia, lendas de plantas e estudos de astronomia. O respaldo científico em que muitas criações de J. K. Rowling são baseadas abriu espaço para a existência de feitiços e poções do universo bruxo em nosso mundo trouxa, mas sob a percepção do conceito de ciência.

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via GIPHY– Um dos encantos mais famosos da saga “Harry Potter” é o “Wingardium Leviosa”, utilizado para levitar pessoas e objetos. Não temos nenhuma tecnologia ainda que realize este feito dessa forma, mas conseguimos algo próximo ao “levitar” trens sobre trilhos magnéticos. Fonte: GIPHY

Por exemplo, o encanto Geminio duplica objetos, como o medalhão de Salazar Sonserina, uma Horcrux. Na nossa realidade, temos as impressoras 3D, que são capazes de replicar objetos a partir de um modelo. A tecnologia tem avançado ao ponto em que órgãos e tecidos também já estão sendo criados objetivando a realização de implantes, agindo como um biomaterial.

Seguindo por esse caminho, bandagens inteligentes, dispositivos de liberação prolongada e componentes naturais têm sido pesquisados e explorados como formas para tratar ferimentos como cortes, esfoliações e queimaduras. As propriedades de biocompatibilidade buscadas comparam-se à essência ditamno, uma poção de cura e restauração aplicada por Hermione no braço de Ron, que se recuperou instantaneamente em “Harry Potter e as Relíquias da Morte”.

Para que objetos se tornem à prova d’ água, repelindo-a, é utilizado o feitiço Impervirus. Sua ação é fundamental nos jogos de Quadribol onde os óculos de Harry não ficam molhados em uma disputa abaixo de chuva em “Harry Potter e o Prisioneiro de Azkaban”. Por meio da nanotecnologia, foram criados sprays super hidrofóbicos e oleofóbicos capazes de repelir água e sujeira, respectivamente. Uma barreira de ar é criada na superfície do objeto, impedindo seu contato com essas substâncias. A tecnologia já está sendo aplicada na confecção de vestuários, tintura de carros, isolamento de fios e construção civil.

Ainda não temos uma capa da invisibilidade, mas temos a camuflagem. Alguns animais como o camaleão, o polvo e a lula se destacam nesta arte, sendo bastante estudados pelos cientistas. Esses organismos possuem um sistema complexo de células especializadas, como leucóforos, iridóforos, e cromatóforos, que dispersam a luz, alterando sua pigmentação. Eles são comparados a pixels de painéis televisivos que mudam de cor conforme a luz os atravessa, adaptando-se. Esse processo de transformação permite que o animal se misture ao ambiente em volta ficando, de certa forma, “invisível”. Os estudos na área estão principalmente ligados a estratégias militares, onde uma boa camuflagem pode definir uma reação de ataque ou defesa, assim como no mundo animal.

E aí, curtiram a mistura de ciência, bruxaria e magia? Já haviam pensado no Halloween de uma forma biotecnológica? Conta pra gente!

Texto revisado por Carolina Bettker e Thais Semprebom

Cite este artigo:
CARLI, C. M. Halloween biotecnológico em 3 atos sinistros. Revista Blog do Profissão Biotec, v.3, 2018. Disponível em: <https://profissaobiotec.com.br/halloween-biotecnologico-em-3-atos-sinistros/>. Acesso em: dd/mm/aaaa.

Referências

Mourão, Janaína Pereira. 31 de Outubro – Halloween (2017). Mundo Educação. Disponível em: https://mundoeducacao.bol.uol.com.br/datas-comemorativas/halloween-1.htm. Acessado em 10/09/2018.
Todd Van Luling & Amanda Scherker. 8 Super Weird Things You Didn’t Know About Halloween (2017). The Huffington Post. Disponível em: https://www.huffpostbrasil.com/entry/halloween-weird-facts_n_5948456. Acessado em 10/09/2018.
KASVI. Você sabe como é realizada a Extração de DNA? (2017). Disponível em: https://kasvi.com.br/a-extracao-de-dna/. Acessado em 10/09/2018.
Cabral, Gabriel. Símbolos do Halloween (2018). Disponível em: https://brasilescola.uol.com.br/halloween/simbolos-halloween.htm. Acessado em 10/09/2018.
Santana, Harrson. Não é Harry Potter, é Engenharia Química! (2017). Disponível em: https://www.blogs.unicamp.br/microfluidicaeengenhariaquimica/2017/11/07/nao-e-harry-potter-e-engenharia-quimica/. Acessado em 21/09/2018.

1 Comentário
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Amanda Freire de Souza
Amanda Freire de Souza
5 anos atrás

Eu amei essa materia!!! Minha paixão pela ciencia veio das “bruxas”/”feiticeiras” que eram queimadas vivas la pelo século XV… Elas eram apenas mulheres que detinham conhecimento sobre plantas e quimica eu as vejo como cientistas. Adoro praticar uns feitiços no laboratorio.

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