Longevidade

Em Dezembro do ano passado, pesquisadores publicaram um artigo na revista Cell mostrando que a expressão dos quatro fatores de Yamanaka (Oct4, Sox2, Klf4 e c-Myc), utilizados para a reprogramação celular em células tronco pluripotentes induzidas (iPSCs), aumentam a expectativa de vida em ratos. Esse aumento, e melhoria de outros marcadores associados ao envelhecimento, se deu principalmente pelo remodelamento epigenético celular no processo de reprogramação parcial.

Figura 1 – Resumo gráfico do artigo “In Vivo Amelioration of Age-Associated Hallmarks by Partial Reprogramming”.

Com a evolução da Ciência e da Medicina, houve um grande aumento da expectativa de vida, fenômeno observado especialmente em países desenvolvidos. No ano de 2014, haviam 46,2 milhões de idosos (acima de 65 anos) no mundo e, estima-se que até 2060, este número chegue a 98 milhões. Naturalmente, com o aumento do número de pessoas idosas, há um maior interesse em entender as vias associadas ao envelhecimento e suas doenças relacionadas.

Figura 2 – Mapa mundial de expectativa de vida de cada país. Fonte: BestLifeRates.Org

O processo de envelhecimento pode ser definido como o acúmulo de alterações deletérias que ocorrem em células e tecidos em idades mais avançadas, e a disfunção destes tecidos, aumentando risco de doenças e mortalidade. Este processo biológico é complexo e multifatorial, estando associado à maior produção de radicais livres, alterações no sistema imunológico, inflamação e funcionamento mitocondrial deficiente. Estas modificações são respostas a alterações genéticas e epigenéticas.

As mudanças epigenéticas não envolvem alterações na sequência de DNA, elas modificam apenas a maneira como as células expressam os genes, levando a alterações fenotípicas sem afetar o genótipo. Estas alterações são normais e ocorrem de maneira natural, mas podem ser influenciadas por vários fatores, dentre eles, o envelhecimento.

Existem pelo menos três sistemas de modificações: metilação do DNA, modificação das histonas e silenciamento de genes por RNAs não codificantes (ncRNA). Estes processos alteram diretamente a expressão de genes associados à longevidade. Devido ao caráter reversível dos mecanismos epigenéticos, principalmente quando comparados a alterações genéticas, essa via é muito promissora para novas terapias visando o aumento da expectativa de vida.

Figura 3 – Mecanismos epigenéticos de metilação do DNA e modificação de histonas. Fonte: Promega

Muitas marcas epigenéticas são alteradas durante o processo de reprogramação celular. Estudos in vitro demonstraram que a reprogramação de células de pacientes idosos altera o tamanho dos telômeros, o perfil de expressão gênica, a atividade enzimática e os níveis de estresse oxidativo, fazendo com que essas células rejuvenesçam. Partindo dessas observações, os pesquisadores analisaram qual o efeito da expressão dos quatro fatores de Yamanaka em ratos. A hipótese era que a expressão destes genes desaceleraria o processo de envelhecimento

Para este estudo, foram utilizados ratos modelos de envelhecimento prematuro que, através de engenharia genética e cruzamentos, continham um cassete de expressão com os quatro genes, cuja expressão pode ser induzida pela administração de um antibiótico. Os níveis de expressão foram baixos para evitar a reprogramação celular, que levaria a uma perda de identidade celular e, com isso, perda de função fisiológica dos tecidos e possível formação de tumores. Dessa forma, o processo foi chamado de reprogramação parcial. Contudo, mesmo com baixos níveis de expressão houve um remodelamento epigenético nessas células, diminuindo a expressão de genes associados com o processo de envelhecimento e outros marcadores, como proteínas de resposta a danos ao DNA, indicando um menor estresse. Diminuição da quantidade de células senescentes e melhor funcionamento mitocondrial também foram observados.

No protocolo cíclico de tratamento utilizado, a expressão dos quatro genes não levaram a formação de teratomas nos ratos, bem como a indução da expressão destes, a partir da 8ª semana de vida, levaram a um aumento significativo na longevidade (Figura 4). Os dados indicam que administração do antibiótico nos controles – ratos que não receberam o cassete de expressão com os quatro fatores de Yamanaka – não alteraram a expectativa de vida. Enquanto que, em ratos expressando os quatro genes, houve um aumento de 6 semanas na longevidade quando comparada à sobrevivência de 50% da população (de 18 semanas para 24 semanas).  

Figura 4 – Kaplan–Meier indicando a sobrevivência dos ratos de cada grupo ao longo das semanas. Dox indica o tratamento (+) ou não () com o antibiótico que induz a expressão dos quatro fatores de Yamanaka.  LAKI é o modelo de envelhecimento precoce e 4F indica a presença do cassete de expressão contendo os quatro fatores de Yamanaka. Fonte: Ocampo et al., 2016.

Além disso, estes ratos apresentaram um melhor processo de regeneração de tecidos como o coração, fígado, pele e músculos esqueléticos. E todas estas melhorias foram acompanhadas por modificações das histonas, dos padrões de metilação do DNA, e diminuição do dano ao DNA, entre outros fatores já conhecidos como importantes para o processo de envelhecimento. A expressão desses genes em ratos idosos do tipo selvagem (WT, do inglês wild type) aumentaram a resistência a doenças metabólicas, como a diabetes, e ao dano muscular.

Com isso, neste novo artigo foi demonstrado o potencial da reprogramação in vivo para melhorar os fenótipos associados ao envelhecimento, aumentando a capacidade regenerativa dos tecidos e a expectativa de vida. Além disso, reafirma a importância da desregulação epigenética e fornece informações importantes associadas a este processo (dano ao DNA, espécies reativas de oxigênio, encurtamento dos telômeros, etc). Ademais, demonstra que o programa epigenético é passível de modificações, podendo originar eventualmente novas estratégias terapêuticas com o objetivo de melhorar a saúde e a longevidade da população.

Referências:

OCAMPO, A.; REDDY, P.; MARTINEZ-REDONDO, P.; LUENGO, A.P.; HATANAKA, F.; HISHIDA, T.; LI, M.; LAM, D.; KURITA, M.; BEYERT, E.; ARAOKA, T.; FERRER, E.V.; DONOSO, D.; ROMAN, J.L.; XU, J.; ESTEBAN, C.R.; NUÑEZ, G.; DELICADO, E.N.; CAMPISTOL, J.M.; GUILLEN, I.; GUILLEN, P.; BELMONTE, J.C. In Vivo Amelioration of Age-Associated Hallmarks by Partial Reprogramming. Cell, v. 167, p. 1719-1733, 2016.

PAL, S.; TYLER, J.K. Epigenetics and aging. Science Advances, v. 2, 2016

SEN, P.; SHAH, P.P.; NATIVIO, R.; BERGER, S.L. Epigenetic Mechanisms of Longevity and Aging. Cell, v. 166, p. 822-839, 2016.

TOSATO, M.; ZAMBONI, V.; FERRINI, A.; CESARI, M. The aging process and potential interventions to extend life expectancy. Clinical Interventions in Aging, v. 2, p. 401-412, 2007.

http://www.whatisepigenetics.com/fundamentals/

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