Musas da biotecnologia: 8 mulheres que mudaram o rumo da ciência

Embora só exista uma data oficial para o dia internacional das mulheres (dia 8), durante todo o mês de março são feitas campanhas, homenagens, premiações, manifestos e todo tipo de reunião para celebrar essa data tão importante e discutir o papel da mulher na sociedade (leia mais sobre a data e histórico aqui).

Por conta disto, o Profissão Biotec (diga-se de passagem, majoritariamente feminino) não poderia ficar de fora! Trouxemos para você — pesquisadoras que contribuíram imensamente para o desenvolvimento da biotecnologia, as quais devemos ser gratos eternamente!

  • Nettie Maria Stevens (1861-1912)

Fig 1. Nettie Stevens, 1904. Fonte: DNAFTB

Nettie Stevens foi uma das primeiras mulheres reconhecidas na ciência. Cresceu no estado norte-americano de Massachusetts, onde permaneceu até 1896, quando se mudou para a Califórnia para cursar biologia na Universidade de Stanford. Após concluir o mestrado na mesma linha, foi fazer doutorado na Bryn Mawr College, onde em 1901 ganhou uma bolsa de estudos para o Instituto Zoológico de Würzburg, na Alemanha, onde teve o seu primeiro contato com o estudo do papel de cromossomos na hereditariedade.

Nettie continuou a trabalhar nesta linha e em 1905 publicou sua tese intitulada “Estudos da Embriogênese”, onde discutia a diferença cromossômica na distinção sexual dos organismos, tendo como modelo larvas de Tenebrio molitor, conhecido como bicho-da-farinha.

Nos anos subsequentes, Nettie publicou trabalhos com estudos cromossômicos de mais de 50 insetos, tendo parado apenas em 1912, quando faleceu de câncer de mama, aos 51 anos. Esse artigo e esse link trazem um pouco mais sobre a história da nossa pioneira científica.

  • Barbara McClintock (1902-1992)

Considerada uma das 3 pessoas mais importantes para a história da genética (juntamente com  Gregor Mendel e Thomas Hunt Morgan), Barbara McClintock estudou botânica e se tornou doutora em genética pela universidade Cornell, onde passou boa parte da sua carreira até ir para o Cold Spring Harbor, em Nova York.

Foi pioneira na citogenética, tendo como modelo de estudo o milho (Zea mays), a partir do qual estudou como as características hereditárias eram transmitidas e descobriu a existência dos elementos transponíveis, que possibilitam a ativação/inativação de genes. Leia mais sobre elementos transponíveis aqui!

Em 1983 ganhou o prêmio Nobel de Fisiologia e Medicina em reconhecimento pela  “descoberta de elementos genéticos móveis” e 7 anos depois faleceu de causas naturais, aos 90 anos. Na página do prêmio Nobel dedicada a ela, você encontra mais informações sobre a sua vida e pesquisa!

  • Rachel Louise Carson (1907-1964)

Fig. 3. Rachel Carson. Fonte: Rachel Carson Council

Rachel Carson foi a bióloga e escritora responsável pela maior revolução ecológica do mundo, quando lançou o seu livro “Primavera Silenciosa”, onde relatava os perigos que a biodiversidade corria com o uso de pesticidas durante o auge da comercialização das substâncias usadas para tal fim. Lutou no congresso norte-americano por novas políticas destinadas a proteger a saúde humana e o meio ambiente, sofreu forte represália da sociedade (principalmente dos industriários do ramo) e morreu na primavera de 1964, aos 57 anos, de câncer de mama, suposta e ironicamente causados por exposição excessiva a substâncias químicas tóxicas. 8 anos depois, a comercialização do Dicloro-difenil-tricloro-etano (DDT), pesticida tóxico também para humanos, foi finalmente proibida. Para saber mais sobre sua história, acesse esse site!

  • Rosalind Franklin (1920-1958)

Fig. 4. Rosalind Franklin. Fonte: DNAFTB

Nascida em 1920, Rosalind Franklin, se matriculou ainda jovem (1938) no Newnham College, uma faculdade exclusivamente feminina da Universidade de Cambridge. Em seguida realizou pesquisas importantes sobre carbono e microestruturas de grafite, tendo obtido o título de doutorado em biofísica em 1945. Passou 3 anos em Paris aprendendo técnicas de difração de DNA e voltou à Inglaterra diretamente para o King’s College, Londres, onde encontrou Maurice Wilkins, talvez o maior responsável pela injustiça cometida com Rosalind.

Ele liderava um grupo de pesquisa sobre DNA, o qual Rosalind foi inserida durante uma breve ausência. Quando retornou, embora ela tivesse ficado com uma linha abandonada há meses, Wilkins deixou claro o seu desprezo e a considerava uma assistente técnica, não uma colega.

Ainda assim, Franklin continuou o seu trabalho e obteve dois conjuntos de fotos de alta resolução de DNA cristalizado. A partir daí, deduziu as dimensões básicas das cadeias de DNA, e a presença dos fosfatos na parte externa do que -embora ela não tivesse percebido na época- era uma estrutura helicoidal.

Nove meses depois, Wilkins mostrou a Watson e Crick os dados de raios-X de Franklin. Os dados pareciam confirmar a estrutura tridimensional teorizada pelos pesquisadores e a partir disto, Wilkins foi incluído quando eles ganharam o prêmio Nobel em 1962, sem nunca terem citado Rosalind nem como colaboradora. Um artigo publicado na Nature em setembro de 2010, intitulado The lost correspondence of Francis Crick” revela trechos de cartas que provam que o “esquecimento” da colaboração de Rosalind não foi acidental. Rosalind faleceu em 1958, sem nunca saber da sua colaboração para uma das descobertas mais importantes da genética e biotecnologia. Leia mais sobre essa história aqui e aqui!

  • Johanna Döbereiner (1924-2000)

Nascida na Checoslováquia, Johanna se mudou para a Alemanha após a segunda guerra mundial, onde começou a estudar Agronomia na Universidade de Munique em 1947. No ano de 1950, após terminar o seu curso migrou para o Brasil para trabalhar no Serviço Nacional de Agropecuária. Em 1957 já era pesquisadora assistente do Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológi­co (CNPq) e em 1968, pesquisadora conferencista. Nesse meio tempo, indo contra o que se acreditava na época sobre a importância de adubos nitrogenados, trabalhou na fixação biológica de nitrogênio (FBN) usando como modelo leguminosas tropicais, e defendeu a substituição da tecnologia anterior por esta.

Com esse estudo, influenciou diretamente o programa de melhoramento da soja brasileira, que passou a utilizar bactérias do gênero Rhizobium  em simbiose ao invés dos adubos anteriormente utilizados. Isso proporcionou uma economia de R$2bi para o país naquela época, e a técnica se espalhou por todo o mundo sendo aplicada e estudada até hoje.

Johanna recebeu inúmeros prêmios, uma cadeira na Academia de Ciências do Vaticano e indicação para o prêmio Nobel de 1997. Em 1996, pouco tempo depois da realização de um simpósio internacional em sua homenagem (onde participaram cerca de 30 países), recebeu o prêmio por Excelência, Destaque Individual da Embrapa.

Johanna faleceu aos 75 anos, no ano 2000 no Rio de Janeiro, deixando para as ciências agrárias um grande legado. Acesse o seu lattes (sim, ele existe) aqui, e o site da Embrapa com aspectos da sua biografia aqui.

  • Maxine Frank Singer (1931-)

Fig. 6. Maxine Singer. Fonte: Alchetron

Nascida em Nova York, foi graduada em química no Swarthmore College em 1952 e em 1957 recebeu o título de doutorado em bioquímica pela Universidade de Yale, onde foi estimulada a seguir a linha de pesquisa de ácidos nucléicos, que estava no auge devido as publicações de Watson e Crick em 1953.

Durante os anos da sua carreira, trabalhou com síntese de RNA, o papel das enzimas na síntese do DNA e RNA,  recombinação genética viral e a estrutura da cromatina.

No início dos anos 60, auxiliou Marshall Nirenberg a decifrar o código genético, fornecendo moléculas sintéticas de RNA de sequência de nucleotídeos conhecidos que permitiram estabelecer que a informação genética está escrita em um código de três letras.

Em 1988, Singer foi eleita presidente da Instituição Carnegie de Washington, uma das mais importantes organizações privadas de pesquisa em biologia, astronomia e ciências da terra.

Recebeu inúmeros prêmios científicos, dentre eles a Medalha Nacional de Ciência (1992), a mais alta honra científica dos EUA e a Medalha de Bem-Estar Público (2007) pela Academia Nacional de Ciências. A sua biografia está disponível aqui!

  • Françoise Barré-Sinoussi (1947 -)

Nasceu em 1947 nos arredores de Paris e desde a escola demonstrou um interesse genuíno pela ciência, sendo que em 1966 ingressou na Universidade de Paris para obter o grau de bacharel em Ciências Naturais. Em seguida, iniciou sua pesquisa no Instituto Pasteur, onde trabalhou com retrovírus e câncer em camundongos, como o vírus Friend que causa leucemia nesses animais, a partir do qual aprendeu a quantificar a atividade da transcriptase reversa e desenvolveu moléculas sintéticas capazes de inibir-la. Esses achados foram importantes na época e mais importantes ainda em 1981, quando começou a trabalhar com uma nova “epidemia” caracterizada por uma imunodeficiência adquirida observada, sobretudo, – segundo relato – em homossexuais.

Françoise dedicou sua vida a esta pesquisa, tendo conseguido provar que o vírus HIV isolado e caracterizado por seu grupo (antes intitulado LAV) era o agente etiológico da Síndrome da Imunodeficiência Adquirida (SIDA/AIDS), tendo ganhado o prêmio Nobel de Medicina em 2008 por esta descoberta. A página do prêmio dedicada a ela é essa aqui!

  • Mayana Zatz (1947-)

Fig. 8. Mayana Zatz. Fonte: Currículo Lattes

Nascida em Tel Aviv, Israel (1947), Mayana se mudou com a família para o Brasil em 1955, onde se naturalizou. Cursou biologia na Universidade de São Paulo (USP), onde também fez mestrado e doutorado em genética, tendo trabalhado com doenças neuromusculares. Em seguida, morou nos Estados Unidos por dois anos, onde concluiu seu pós-doutorado na Universidade da Califórnia.

Em 1981, Mayana fundou a Associação Brasileira de Distrofia Muscular, que trata afetados por distrofias musculares e auxilia seus familiares, da qual ainda é presidente. Seguindo a mesma linha de pesquisa, foi responsável por localizar genes associados a um tipo de distrofia e pelo mapeamento do gene responsável pela síndrome de Knobloch.

Mayana é coordenadora do Centro de Pesquisas sobre o Genoma Humano e células-tronco (CEGH-CEL)  e do Instituto Nacional de Células-tronco em Doenças Genéticas, membro da Academia Brasileira de Ciências desde 1996 e grã-cruz da Ordem Nacional do Mérito Científico (2000). Ao longo da sua carreira recebeu inúmeros prêmios e condecorações como a Medalha de Mérito Científico e Tecnológico do Governo do Estado de São Paulo (2000), prêmio latino-americano L’Oréal-UNESCO para mulheres em ciência (2001), Prêmio Claudia, oferecido pela Revista Claudia (2001), foi a Personalidade do Ano de 2006 da Ciência segundo a Revista ISTOÉ Gente, ganhou o Prêmio México de Ciência e Tecnologia (2008), dentre outros. Foi também colunista da revista Veja!, onde publicou mais de 250 artigos científicos para leigos. Acesse o seu currículo lattes aqui!

  • Extra: Prêmio L’Oréal-UNESCO

Fundado em 1998, o prêmio L’Oreal-UNESCO For Women in Science baseia-se na na firme convicção de que o mundo precisa de ciência e a ciência precisa de mulheres. Todos os anos são identificadas, recompensadas e incentivadas cientistas de todos os continentes, sendo que duas delas, Ada Yonath e Elizabeth Blackburn, ganharam o Nobel.

Além da Mayana Zatz (2001), outras 5 brasileiras já ganharam o prêmio internacional, sendo elas: Lucia Previato (Microbiologia – UFRJ, 2004), Belita Koiller (Física – UFRJ, 2005), Beatriz Barbuy (Astrofísica – USP, 2009), Marcia Barbosa (Física – UFRGS, 2013), e Thaisa Storchi Bergmann (Astrofísica – UFRGS) em 2015.

Existe também a edição local “Para Mulheres na Ciência”, iniciada em 2006 a partir de uma parceria da L’Oreal Brasil com a UNESCO e a Academia Brasileira de Ciências. Anualmente são escolhidas 7 jovens pesquisadoras brasileiras que são contempladas com bolsas-auxílio como impulso extra para prosseguir os estudos e incrementar a ciência brasileira. Você pode conferir a lista com as vencedoras dos últimos 11 anos aqui!

Acesse o site oficial do programa e conheça um pouco mais sobre a iniciativa, além dos conteúdos vastos e atualizados que são postados lá periodicamente.

Fonte: Environment and Society

Sobre Nós

O Profissão Biotec é um coletivo de pessoas com um só propósito: apresentar o profissional de biotecnologia ao mundo. Somos formados por profissionais e estudantes voluntários atuantes nos diferentes ramos da biotecnologia em todos os cantos do Brasil e até mesmo espalhados pelo mundo.

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