Você já reparou que a maioria dos alimentos que consumimos, dos medicamentos que utilizamos e das roupas que vestimos é colorida? As cores acabam sendo um atrativo e, por isso, as indústrias alimentícia, farmacêutica e têxtil acabam empregando corantes em seus produtos, em sua grande maioria, sintéticos, também conhecidos como artificiais.
Há diversos relatos sobre alergias causadas por corantes, por isso algumas pessoas precisam evitar a exposição aos mesmos. Além disso, há também estudos sobre efeitos tóxicos, um pouco mais graves, como mutagenicidade e potencial carcinogênico de alguns corantes artificiais.
Um outro problema associado aos corantes artificiais é a sua baixa biodegradabilidade, que pode levar ao acúmulo dos mesmos, trazendo prejuízos ao meio ambiente. Assim, há um grande interesse mundial no desenvolvimento de processos para a produção de corantes de origem natural, devido aos sérios problemas de segurança de muitos corantes artificiais.
Corantes naturais podem ser produzidos por plantas, animais e micro-organismos na forma de pigmentos, em sua grande maioria, os quais podem ser extraídos destes organismos. Os termos corantes e pigmentos muitas vezes são utilizados como sinônimos, porém apresentam uma diferença conceitual, no que se refere à sua solubilidade, sendo os pigmentos insolúveis e os corantes solúveis nos meios em que serão incorporados.
Dentre os pigmentos de origem vegetal, temos alguns exemplos, como: as clorofilas (verde), os carotenoides (amarelo, laranja e vermelho) e os flavonoides (vermelho, roxo e azul). Esses pigmentos são de fácil extração e vêm sendo utilizados de forma crescente em alguns produtos industrializados. Uma das grandes desvantagens desses pigmentos vegetais é sua baixa estabilidade frente à temperatura, oxigênio e luz, que afetam negativamente a qualidade e aparência dos produtos. No entanto, estudos vêm sendo realizados na tentativa de aumentar a estabilidade dos mesmos e ampliar sua utilização. Se tiver curiosidade a respeito deste assunto, você pode aprofundar seus conhecimentos com esta revisão sobre os corantes e pigmentos derivados de plantas.
Uma fonte bastante inusitada, porém de grande utilização, é o corante extraído de fêmeas de insetos da espécie Dactylopius coccus Costa ou Cochonilha. É um composto de coloração vermelha (ácido carmínico) que, complexado ao alumínio, forma o corante carmim de cochonilha. Estes insetos são originários de alguns países da América Latina, como Peru e México, sendo que aproximadamente 70.000 insetos são necessários para produzir 500 g de ácido carmínico. Este corante é amplamente utilizado pelas indústrias alimentícia e farmacêutica, pois, ao contrários dos corantes vegetais, apresenta uma alta estabilidade frente aos fatores já listados acima, que poderiam levar à sua degradação.
Outras fontes de grande interesse na produção de corantes naturais são os micro-organismos. Algumas espécies de fungos e microalgas são produtores de pigmentos naturais.
Em destaque, fungos filamentosos do gênero Monascus, que já são estudados há muitos anos como produtores de pigmentos naturais. Tais compostos são utilizados como corantes de alimentos, em países orientais, em processos como fermentação de produtos tradicionais da culinária oriental: arroz vermelho fermentado, produtos à base de soja e algumas bebidas. Fungos deste gênero produzem pigmentos nas tonalidades amarela (monascina e ankaflavina), vermelha (monascorubramina e rubropunctamina) e laranja (monascorubina e rubropunctatina).
Um entrave na liberação de corantes naturais produzidos por estes fungos, no mercado, é a produção da micotoxina citrinina por algumas linhagens. Por isso, são necessários estudos para desenvolver linhagens recombinantes que não produzam este metabólito tóxico e que superexpressem estes pigmentos.
As microalgas são produtoras de carotenoides, assim como as plantas. Alguns exemplos são o β-caroteno (laranja), produzido por Dunaliella salina e D. bardawil; astaxantinas (vermelho), por Haematococcus pluvialis; e ficocianina (azul), por Spirulina sp. As microalgas, em sua maioria, são consideradas micro-organismos GRAS (Generally Recognized As Safe, em português, geralmente reconhecido como seguro), permitindo, assim, bioprocessos seguros e que necessitam de poucas fontes de nutrientes, uma vez que estes organismos são fotossintetizadores. Além disso, nem sempre é necessário extrair o pigmento, podendo ser realizada a administração da própria alga em pó devidamente pigmentada, em função do seu status GRAS, o que diminui os custos para a produção do mesmo. Se quiser ler mais a respeito de microalgas, leia este texto do Profissão Biotec.
Há um grande potencial em fontes naturais para a produção e extração de corantes e pigmentos naturais, assim como ferramentas biotecnológicas disponíveis para a produção em larga escala dos mesmos. É importante ressaltar que muitos deles apresentam outras atividades biológicas, dentre elas: atividade antioxidante, precursor de vitamina A (como o betacaroteno), melhora no sistema imune, propriedades antimicrobianas, dentre outras.
Portanto, além de agradar aos nossos olhos, essas moléculas podem trazer muitos outros benefícios, não é mesmo?
Referências
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Durán, N.; Teixeira, M.F.S.; Esposito, E. Pigmentos fúngicos e seu potencial biotecnológico. In: Esposito, E.; Azevedo J.L. Fungos: uma introdução à biologia, bioquímica e biotecnologia, EDUCS. Caxias do Sul, 2004.
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Schiozer, A. L., Barata, L. E. S. Estabilidade de Corantes e Pigmentos de Origem Vegetal, Revista Fitos pg 6-24, 2007.
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Foto de abertura: Dan Brady (http://www.flickr.com/photos/11853009@N07/1382064216/)