Você já ouviu falar em biologia sintética? Provavelmente sim, ainda mais se você viu o texto do Guilherme Kundlatsch publicado aqui. Mas você sabe o que é? O que faz? Suas aplicações? Bom, eu sou bióloga, mestre e doutora em genética de microrganismos e, mesmo assim, não conhecia tão bem biologia sintética! Mas tive a sorte de participar do Jamboré Brazuca – Uma experiência de Biologia Sintética no Brasil, que ocorreu nos dias 2 e 3 de março de 2018, na Escola Superior de Agricultura Luiz de Queiroz (ESALQ-USP) em Piracicaba, São Paulo, e contou com cerca de 70 participantes. Aqui eu vou contar um pouquinho sobre o evento, sobre biologia sintética e como essa área vem trabalhando no limite do conhecimento e promete revolucionar (ainda mais) a maneira como fazemos ciência.

Participantes do Jamboré Brazuca (Fonte: Maria Letícia Bonatelli)

É impossível falar de biologia sintética sem falar da competição International Genetically Engineered Machine, ou iGEM (em português, Competição Internacional de Engenharia de Sistemas Biológicos). Esse evento começou em 2003 no Instituto de Tecnologia de Massachusetts (em inglês, Massachusetts Institute of Technology – MIT) e, ao longo dos anos, o evento se expandiu, sendo que em 2017 contou com 310 times de mais 40 países! iGEM é uma organização independente, sem fins lucrativos, dedicada à educação, competição e ao avanço da biologia sintética, além do desenvolvimento de uma comunidade aberta e colaborativa. Sim, quando eu falei que essa área, tão nova, se propõe a revolucionar a forma como fazemos ciência, não me referi somente à abordagem tecnológica pioneira, mas também à forma como pensamos e nos relacionamos no meio científico.

Biologia sintética é um ramo da biologia que une duas grandes e importantes áreas: engenharia genética e biologia molecular. A ideia aqui é justamente utilizar as importantes técnicas da biologia molecular (técnicas de estudo do DNA – extração de DNA, reação em cadeia da polimerase, clonagem e expressão gênica, entre outras) e aplicar à elas os conceitos da engenharia, que irão garantir três palavrinhas-chave: previsibilidade, confiabilidade e eficiência. Como falei anteriormente, sou bióloga e ouvir os palestrantes desse evento descreverem processos de biologia molecular, apropriando-se do vocabulário da engenharia, foi muito curioso! Se isso não é multidisciplinariedade, eu não sei o que é!

Mas para que juntar biologia molecular com engenharia genética? Bom, explicando um pouquinho essa tecnologia, fica mais fácil de entender. Para a galera da biologia sintética, cada parte funcional do DNA é como uma peça de Lego® – uma região promotora ou terminadora, um gene marcador, um gene repressor, entre outros – e, assim como as peças desse brinquedo, elas podem ser combinadas para formar um Biobrick (Bio-tijolo, em tradução livre). O Biobrick é uma unidade funcional, bem conhecida, bem caracterizada e bem descrita (lembra das três palavras-chave lá em cima?) que tem uma função específica. Ele pode silenciar a expressão de um gene, pode deixar uma célula fluorescente, ou pode fazer o que o cientista quiser.

E o Biobrick deve respeitar alguns preceitos: a funcionalidade, onde deve-se conhecer bem qual a função que ele desempenhará numa célula; a modularidade, ou seja, cada Biobrick pode agir sozinho ou combinado com outro e a ortogonalidade, que significa que  um Biobrick não pode interferir na ação do outro. E com o Biobrick em mãos, os pesquisadores podem iniciar o trabalho!

Modularidade dos Biobricks (Fonte: Time SDU-Dinamarca – http://2013.igem.org/Team:SDU-Denmark/Tour40)

 

A aplicação da biologia sintética é muito ampla. Diversas áreas do conhecimento já utilizam a manipulação genética para tentar solucionar problemas – desde tratamento doenças até aumento da produtividade no campo. Mas ainda existem muitos desafios a serem superados e, por isso, é tão importante o empenho e esforço dos pesquisadores que se propõe a desbravar essa área do conhecimento.

E, depois do Jamboré Brazuca, posso dizer para vocês que tive certeza de que o Brasil tem representantes muito capazes e animados nessa área. Sim, os participantes do iGEM de 2017 do Brasil estavam no evento e falaram dos seus projetos! Teve o pessoal da Unesp de Araraquara, com o time AQA Unesp, falando sobre o Insubiota – a alternativa deles para o tratamento de diabetes tipo I com a utilização de probióticos geneticamentes engenheirados; também participou o pessoal da Universidade Federal do Amazonas, do time Amazonas Brasil, falando sobre o CRISPeasy – que visou construir uma “caixa de ferramentas” padronizada do Biobrick para utilizar na engenharia de genoma bacteriana; e o pessoal da Universidade de São Paulo (capital), do time USP Brasil, falando do BioTrojan – que integrou os conceitos de biologia sintética para erradicar doenças transmitidas por mosquitos. Time de peso, hein?

Além de tudo que eu aprendi durante o evento, saí com a sensação de que as pessoas que estão envolvidas com a biologia sintética no país querem fazer uma pesquisa colaborativa e crescer juntos. Seja pelo discurso motivacional de introdução do Guilherme Kundlatsch, embaixador do iGEM Brasil, pela animação e pioneirismo da professora Danielle Pedrolli e até pela disponibilidade e acessibilidade do professor Andrew Endy, uma das figuras mais importantes desta área e que fez um bate-papo super esclarecedor para a galera do evento. Como cientista, iniciativas desse tipo me ajudam a acreditar que uma pesquisa de ponta e colaborativa é possível no nosso país. E já no final do evento, tivemos a apresentação do pessoal que vai tentar participar do iGEM 2018, fica ligado que vem coisa boa por aí!

Participação de Andrew Endy por vídeo-conferência (Fonte: Maria Letícia Bonatelli)

Se interessou e quer saber mais sobre o iGEM? Acessa o site deles (http://igem.org/Main_Page) ou entra em contato com o Guilherme Kundlatsch (guilherme@igem.org), eu tenho certeza de que ele vai ficar animado em ouvir da sua curiosidade sobre o tema.

 

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