A pandemia do coronavírus impulsionou uma verdadeira corrida para criação de uma vacina para a COVID-19. Atualmente, diversos grupos de pesquisa, no Brasil e no mundo, estão testando mais de 90 vacinas com diferentes tecnologias. Um guia publicado recentemente pela revista Nature destacou quais são essas tecnologias. O Profissão Biotec preparou uma versão em português desse guia e te explica a seguir cada uma dessas tecnologias, e como a biotecnologia é empregada no desenvolvimento dessas vacinas!
Como nossa imunidade responde à infecção pelo novo coronavírus?
Antes de conhecer as tecnologias usadas na produção das vacinas, vamos relembrar como funciona nosso sistema imunológico, e como ele responde à infecção pelo novo coronavírus (vírus SARS-CoV-2)! Quer saber mais sobre como funciona o sistema imune? Leia aqui.
(Bio)tecnologias usadas na produção da vacina para COVID-19
O objetivo da vacina é expor nosso organismo ao vírus de forma que ele não cause a doença, mas induza uma resposta imune capaz de bloquear ou eliminar o vírus, caso sejamos infectados. Para isso, diferentes tecnologias podem ser empregadas, como veremos a seguir.
1- Vacina a partir do vírus
Atualmente, vacinas contra sarampo e poliomielite são produzidas a partir do vírus enfraquecido ou inativado. Cerca de sete grupos de pesquisa ao redor do mundo estão elaborando vacinas contra COVID-19 baseadas nessa técnica e na China a empresa Sinovac Biotech já iniciou os testes clínicos em humanos.
2- Vacina de vetores virais
Para elaborar essa vacina, um vírus (como o do sarampo ou o adenovírus), enfraquecido e que não pode gerar doença, é geneticamente modificado para produzir proteínas do coronavírus. Esse vírus enfraquecido e geneticamente modificado é chamado de vetor viral.
Esse vetor viral, ao ser introduzido no organismo sob forma de vacina, poderá se replicar dentro das células ou não (caso seus genes principais tenham sido desativados), mas produzirá proteínas do coronavírus que estimularão o sistema imunológico, sem induzir nenhuma doença. Cerca de 25 grupos de pesquisa ao redor do mundo estão utilizando essa técnica para criação de vacinas contra a COVID-19.
3- Vacina de ácidos nucléicos
Nas vacinas de ácidos nucléicos, a informação genética (DNA ou RNA) de uma proteína do coronavírus é inserida nas células humanas. Esse material genético, quando introduzido no organismo sob forma de vacina, é capaz de induzir a produção de cópias da proteína do coronavírus pelas próprias células do indivíduo, induzindo uma resposta imune contra o coronavírus.
Pelo menos 20 grupos de pesquisa de diferentes países estudam utilizar essa técnica para elaboração da vacina. A maioria desses estudos, tem como proteína alvo do coronavírus a proteína spike (proteína S), a principal proteína de superfície utilizada pelo vírus para infectar a célula humana.
Uma dessas empresas de biotecnologia é a Moderna Therapeutics, com sede em Cambridge, já obteve resultados iniciais satisfatórios nos ensaios clínicos com 8 pacientes e recebeu aprovação do FDA (Food and Drug Administration) para entrar na segunda fase de testes clínicos com mais 600 pacientes. Se tudo der certo, esta será a primeira vacina produzida a partir de RNA mensageiro (RNAm).
4- Vacina a base de proteínas
Uma das possibilidades para imunização contra o coronavírus é injetar diretamente no indivíduo as proteínas do vírus, os fragmentos de proteínas ou os invólucros de proteínas que imitam a camada externa do coronavírus. Isso estimularia o sistema imune do indivíduo, protegendo-o contra uma infecção futura.
A Universidade de São Paulo (USP) é uma das que estão desenvolvendo vacina VLP. “Colocamos as partes do coronavírus que são importantes para desencadear uma forte resposta do sistema imunológico, para emitir os anticorpos bloqueadores e impedir o vírus de penetrar nas células”, ressalta Jorge Kalil, diretor do Laboratório de Imunologia do Instituto do Coração (Incor – USP).
5- Vacina acelular
Um grupo de pesquisa do Instituto Butantan (SP) estuda a combinação de duas estratégias biotecnológicas para o desenvolvimento de uma vacina acelular. O grupo pretende utilizar proteínas recombinantes de antígenos de superfície do coronavírus (que estimulariam a produção de anticorpos específicos contra o coronavírus) associadas a vesículas de membrana externa (usadas como matriz suporte dos antígenos para que a partícula mimetize o vírus).
A estratégia é baseada no mecanismo que algumas bactérias usam para “despistar” o sistema imunológico, e assim a liberação de material viral associado a vesículas de membrana externa servirá para ativar o sistema imunológico, atuando como “isca” e atraindo células e moléculas de defesa.
A nova vacina usará uma plataforma inovadora de apresentação de antígenos chamada Multiple antigen presenting system (MAPS), desenvolvida em colaboração com a Universidade de Harvard (Estados Unidos). Para isso, um complexo molecular será montado por um sistema de acoplamento semelhante ao usado nas reações de ELISA (ensaio de imunoabsorção enzimática muito usado em vários testes de diagnósticos).
“No mundo todo, e aqui no Brasil também, estão sendo testadas diferentes técnicas. Muitas delas têm como base o que já estava sendo desenvolvido para outros vírus, como o que causou o surto de SARS em 2001. Esperamos que funcionem, mas o fato é que ninguém sabe se vão realmente proteger. Neste momento de pandemia, não é demais tentar estratégias diferentes. A nossa abordagem vai demorar mais para sair, mas, se aquelas que estão sendo testadas não funcionarem, já temos os planos B, C ou D”, diz a Luciana Cezar Cerqueira Leite, pesquisadora do Laboratório de Desenvolvimento de Vacinas do Instituto Butantan.
Em quanto tempo teremos uma vacina para a COVID-19?
A maioria dessas pesquisas está sendo desenvolvida em empresas privadas ou indústria. Os ensaios iniciam-se com estudos de segurança, em animais e humanos, e seguem para estudos mais amplos para identificar se a vacina induz a resposta imune de forma eficiente. Devido a pandemia, e a necessidade urgente de uma vacina, os pesquisadores estão tentando acelerar esses processos, e produzir uma vacina contra COVID-19 em até 18 meses. Seja qual for o tipo de vacina que será produzida, nossa única certeza é de que a biotecnologia será empregada nesse processo!
E enquanto os pesquisadores do Brasil e de todo o mundo estão fazendo a sua parte, desenvolvendo o mais rápido possível uma vacina para a COVID-19, nós aqui vamos fazendo o que podemos também: higienizando bem as mãos, usando máscaras e mantendo o isolamento social, certo?