Imagine a seguinte cena: você está na aula de Biologia Molecular, estudando o ácido desoxirribonucleico (DNA) e a professora (ou professor) fala de seu formato de hélice, das pontes de hidrogênio, das bases nitrogenadas… Mas não só disso. Ela (ou ele) fala também de três figuras muito importantes: James Watson, Francis Crick e Rosalind Franklin, envolvidos na descoberta da estrutura dessa molécula tão importante.
Essa cena te parece familiar? Ela aconteceu de forma parecida durante sua jornada acadêmica? Será que, no seu caso, esqueceram de alguma dessas três figuras ou deram créditos a todas? Por mais que, durante longos anos, Rosalind Franklin tenha ficado esquecida, ela vem recebendo cada vez mais o devido reconhecimento dentro e fora das salas de aula.
Certamente, a maioria dos leitores (senão todos), já conhecem a polêmica do DNA. Por isso, esse texto não vai bater na mesma tecla – ele irá além. Hoje você vai conhecer outros fatos sobre a vida e carreira da interessantíssima Rosalind Franklin. (Mas, se você não conhece a tal polêmica, continue lendo, pois trataremos dela também.)
Uma mulher cientista? COM CERTEZA.
Rosalind Franklin nasceu em Londres, no ano de 1920 e era de uma importante família judia britânica. Aos 15 anos, já havia decidido que seria cientista. Seus pais, entretanto, não acharam que foi uma boa escolha – preferiam que ela estudasse serviço social.
Rosalind, de acordo com seus amigos, era uma mulher amável, mas também teimosa. Isso somado ao fato de que o coração cientista é indomável (a gente sabe, não é mesmo?) só poderia ter um resultado: ela seguiu a carreira de seus sonhos. Formou-se em Química pela Newnham Women’s College (na Inglaterra), recebendo grau equivalente ao bacharelado mas para mulheres. (Isso soa tão absurdo quanto é…)
Após graduar-se, em 1941, ela deveria fazer seu doutorado em físico-química, em Cambridge. Porém, devido à situação crítica na Europa causada pela Segunda Guerra Mundial, jovens solteiras foram recrutadas para serviços relacionados ao conflito. Depois de atuar como um tipo de agente de alerta contra ataques aéreos na Inglaterra (air raid wardens), ela finalmente pôde voltar à pesquisa científica, garantindo seu PhD (grau de doutorado) pela Universidade de Cambridge em um trabalho sobre a porosidade do carvão.
Terminado seu PhD, Rosalind foi a Paris e, no Laboratório Estadual de Química, ela se aprofundou na técnica de cristalografia por raios-x, técnica que usa raios X (um tipo de radiação eletromagnética) para deduzir a estrutura de um cristal. Durante esse tempo, ela produziu trabalhos sobre o carvão que são relevantes até hoje! Em 1951, devido à sua expertise na técnica de cristalografia, ela foi convidada por Maurice Wilkins, diretor-assistente do laboratório de Biofísica da King’s College (na Inglaterra), a ingressar como pesquisadora parceira. Anos mais tarde, nessa mesma universidade, a estrutura do DNA foi revelada sob os estudos em que Rosalind estava envolvida.
Em 1953, já na Birkbeck College (também na Inglaterra), ela esteve envolvida com estudos estruturais do carvão, dos vírus da poliomielite e do mosaico do tabaco. É bem claro que Rosalind teve várias contribuições científicas além da estrutura do DNA.
Em 1956, Rosalind descobriu um câncer no ovário. Porém, o diagnóstico foi tardio, permitindo que ela vivesse por cerca de mais dois anos apenas. Seu último trabalho científico foi publicado em 1958, mesmo ano de seu falecimento. Apesar disso, foram mantidos os recursos para continuar suas pesquisas sobre o vírus da poliomielite.
A polêmica do DNA
Em 1953, Watson e Crick publicaram o artigo propondo a estrutura do DNA. Para chegar na conclusão da dupla hélice de DNA, eles se basearam nas informações da famosa “fotografia 51”, imagem adquirida por Rosalind e proveniente da técnica cristalográfica, bem como os cálculos e anotações da química que acompanhavam essa imagem e a traduziam.
Em 1962, os mesmos dois cientistas ganharam o Prêmio Nobel de Fisiologia/Medicina por esse trabalho publicado. Rosalind não foi incluída no artigo e muito menos lembrada na premiação; entretanto, ela não poderia receber parte do prêmio de qualquer forma, pois o Nobel não é concedido post mortem. Ainda assim, Watson e Crick, assim como Maurice Wilkins, tinham plena consciência de que não teriam atingido seu objetivo sem a contribuição de Rosalind. O próprio Watson esclarece um pouco sobre isso em sua autobiografia (“The double helix”, de 1968). (Se quiser recomendações de livros para biotecnologistas, é só clicar aqui)
Em entrevista à revista Forbes, a sobrinha de Rosalind Franklin diz achar irônico que o reconhecimento atual de sua tia não seria tão intenso se ela o tivesse recebido devidamente à época de suas descobertas. Ela também reforça, em tom de conselho, que estar rodeada de outras mulheres fortes foi crucial para que sua tia não se sentisse limitada em nenhum momento de sua trajetória.
Uma história simplesmente inspiradora para dar mais força àqueles com coração cientista. O Profissão Biotec também aflorou essa inspiração nesses textos aqui e aqui. Que tal compartilhar esse texto com as mulheres fortes da sua convivência, para que elas conheçam mais uma mulher inspiradora?!