O domínio Archaea agrupa procariotos extraordinários que parecem bactérias, mas são muito diferentes. Vamos conhecer mais sobre as arqueas nesse texto!
Domínio das Archeas

Arqueas são microrganismos procariotos que se assemelham morfologicamente às bactérias, mas possuem tantas características diferentes que foram colocados em um grupo separado: o domínio das Archaea.

As arqueas foram descobertas na década de 1970 em ambientes onde se acreditava ser pouco provável encontrar alguma forma de vida. Desde então, várias espécies foram identificadas, vivendo em ambientes extremos, como por exemplo com alta temperatura ou acidez, assim como ambientes comuns (solo, água ou em simbiose com outros organismos).

Micrografia eletrônica de uma arquea. Fonte: Hiroyuki Imachi, Masaru K. Nobu e JAMSTEC/Nature.

Embora hoje existam várias espécies catalogadas desse domínio, o que sabemos sobre a diversidade das arqueas é ainda muito pouco. O fato de existirem representantes vivendo em ambientes extremos fazem desses organismos um grupo de muito interesse para os cientistas, mas ao mesmo tempo de difícil estudo e identificação.

Vamos conhecer um pouco mais sobre esse incrível universo das arqueas nesse texto!

Domínio das Arqueas – recente na árvore da vida

Todos os organismos são classificados em vários níveis no sistema de classificação biológica. A primeira grande divisão entre organismos é quanto ao tipo de célula: procariotos e eucariotos.

Eucariotos são seres que possuem núcleo celular, ou seja, todas as células possuem uma estrutura interna que abriga o DNA. Neste grupo temos os reinos dos fungos, protistas, plantas e animais.

Procariotos, por sua vez, são formas de vida que não possuem um núcleo celular. O material genético nessas células fica no citoplasma sem uma separação física. Durante muito tempo os procariotos representavam apenas um grupo de organismos, as bactérias, até a descoberta das arqueas, que foram primeiramente chamadas de arqueobactérias.

Eucariotos possuem núcleo celular, que abriga os cromossomos lineares. No caso dos procariotos, o cromossomo está disperso no citoplasma. Fonte: própria autoria.

A análise da sequência do RNA ribossômico (veja mais sobre os tipos de RNA aqui) mostrou que, na verdade, os novos tipos de procariotos descobertos na década de 1970 eram consideravelmente diferentes das bactérias. 

Baseado nessa informação, o microbiologista Carl R. Woese, em 1978, propôs o sistema dos três domínios, dividindo os procariotos em dois grupos distintos. Assim, nesse sistema amplamente aceito, os seres-vivos são agrupados em três diferentes domínios: Eukarya, Bacteria e Archaea.

Árvore filogenética considerando o sistema dos três domínios biológicos: Eukaria, Bacteria e Archaea. Fonte: Eric Gaba, Cherkash/Wikimedia.

Arqueas e suas semelhanças – ou não – com outros seres-vivos

Morfologicamente falando, arqueas são idênticas às bactérias. Arqueas podem se apresentar na forma de bacilos, cocos, entre outros, assim como as bactérias. Ambas possuem parede celular, citoplasma e, claro, ausência de núcleo.

Porém, além da análise que demonstrou as diferenças genéticas, existem algumas diferenças fisiológicas que sustentam a separação entre esses dois grupos de procariotos. Na verdade, em alguns aspectos as arqueas possuem mais semelhanças com os eucariotos, enquanto existem outras características exclusivas do domínio das Arqueas. 

A tabela abaixo resume as principais diferenças celulares entre os três domínios. Uma das principais diferenças entre bactérias e arqueas é a parede celular. Todas as bactérias possuem peptideoglicana na sua parede celular, enquanto que essa molécula não existe nas arqueas. 

Algumas características comparadas entre os três domínios. Braço curto do tRNA: sequência de 5 bases presente no tRNA de todas as bactérias e eucariontes. Fonte: própria autoria.

Baseado nessas características e também na análise genética das arqueas, acredita-se que, evolutivamente, as arqueas estão mais proximamente relacionadas aos eucariotos do que às bactérias!

Uma das hipóteses mais aceitas é que arqueas e bactérias se separaram de um ancestral comum a bilhões de anos atrás, e os eucariotos se ramificaram a partir das arqueas muito tempo depois. Isso contraria totalmente o que se pensava no começo da descoberta.

Habitats extremos das arqueas

No texto do Profissão Biotec sobre microrganismos extremófilos, temos alguns exemplos de arqueas e seus habitats únicos. Em geral, o domínio das Archaea é dividido em 3 principais grupos de acordo com as características dos seus integrantes:

  1. Hipertermófilos – habitam ambientes com altas temperaturas ou temperaturas muito baixas. Algumas arqueas são termoacidófilas, tolerando ambientes que possuem tanto alta temperatura como extrema acidez. Exemplo: hipertermófilo Ignisphaera aggregans.
  2. Metanógenos – produzem metano como subproduto do metabolismo energético. Vivem apenas em ambientes livres de oxigênio (anaeróbios). Exemplo: Methanobrevibacter smithii.
  3. Halófilos extremos – habitam ambientes hipersalinos. Podem ser encontrados em lagos com altíssima concentração de sal, como o Mar Morto. Exemplo: Halobacterium salinarum.
Micrografia eletrônica de varredura de L. aggregans. Fonte: Johannes Sikorski/Researchgate.

As arqueas possuem processos metabólicos exclusivos e muito interessantes. A metanogênese (produção de metano), por exemplo, é algo que ocorre apenas no domínio das Archaeas.

Existem arqueas que conseguem tolerar tanto altos quanto baixos níveis de pH (em torno de 0 por exemplo), ou ainda viver sob uma salinidade inviável para qualquer outra forma de vida – tudo porque carregam um conjunto de genes que conferem rotas metabólicas de adaptação aos ambientes.

Devido ao fato de que muitas arqueas habitam esses ambientes extremos, especula-se que elas seriam formas de vida primitivas, que evoluíram a partir das condições muito diferentes do planeta há bilhões de anos atrás.

Arqueas e sua diversidade no ambiente

Apesar de serem muitas vezes os únicos habitantes de ambientes extremos, é errado pensar que arqueas só ocorrem nesses lugares. Na verdade, a diversidade de arqueas é muito maior do que se conhece até agora, e as espécies vivendo nesses ambientes representam apenas uma pequena parte do total.

Arqueas igualmente habitam outros ambientes como solo, água, e até mesmo o trato gastrointestinal de animais, incluindo seres humanos – sim, você carrega algumas arqueas dentro de você! Elas também participam de processos ambientais bem conhecidos como a fixação de nitrogênio no solo. 

O problema para estimar a diversidade de arqueas é que elas são difíceis de se cultivar. Embora muito abundantes, a maioria desses microrganismos não crescem em culturas nas condições laboratoriais. Atualmente, análises de material genético extraído do meio ambiente permitem estimar e até mesmo descobrir novas espécies de arqueas, sem que nunca sejam sequer cultivadas.

Aplicações biotecnológicas

No texto sobre microrganismos extremófilos destacamos vários usos biotecnológicos oriundos desses microrganismos, mas o interessante é que muitos extremófilos pertencem ao domínio das Archaeas, indicando como a biotecnologia com certeza tem um interesse particular sobre esse grupo.

Uma das principais aplicações biotecnológicas das arqueas é para obtenção de extremoenzimas (enzimas provenientes de extremófilos). A estabilidade molecular dessas enzimas em ambientes extremos (muito comum nos processos industriais) ampliou a variedade de enzimas usadas na indústria. A tolerância a extremos de temperatura e pH e a resistência à solventes e metais pesados são características dessas enzimas muito utilizadas.

Um outro potencial uso das arqueas que vem sendo estudado são os arqueossomos. Arqueossomos são preparos obtidos dos lipídios de membrana das arqueas. Esses preparos são utilizados como coadjuvantes em formulações de vacinas, e apresentam melhores resultados do que lipossomos convencionais.

Gostou de conhecer mais sobre esse domínio fascinante das arqueas? Então não esquece de compartilhar e comentar!

Revisado por Bianca Chaves e Bruna Lopes

Referências

BAILEY, R. Archaea Domain: Extreme Microscopic Organisms. Thoughtco, março de 2019. Disponível em: <https://www.thoughtco.com/archaea-373417>. Acesso em 31 de outubro de 2020.

CARDOSO, Alexander Machado et al. Archaea: potencial biotecnológico. Revista Biotecnologia, Ciência e Desenvolvimento. Ed. 30, 2003.

Cowan, D.A. Biotechnology of the Archaea. Trends in biotechnology, v. 10, p. 315-323, 1992.

Enzmann, Franziska et al. Methanogens: biochemical background and biotechnological applications. AMB Express, v. 8, n. 1, p. 1-22, 2018.

GÖKER, Markus et al. Complete genome sequence of Ignisphaera aggregans type strain (AQ1. S1 T). Standards in genomic sciences, v. 3, n. 1, p. 66-75, 2010.

NIEDERBERGER, T. Archaea. Encyclopædia Britannica, outubro de 2020. Disponível em: <www.britannica.com/science/archaea>. Acesso em 31 de outubro de 2020.

The life of archaea: Cultivation of Asgard archaea brings us closer to understanding how complex life evolved. Nature, Janeiro de 2020. disponível em: <https://www.nature.com/articles/d41586-020-00087-4>. Acesso em 31 de outubro de 2020.

TORTORA, G.J.; FUNKE, B.R.; CASE, CL. Microbiologia. 10. ed., Porto Alegre: Artmed, 2010.

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