Fungos Filamentosos: Biofábricas em Biotecnologia

Os fungos filamentosos, também denominados mofos ou bolores, são conhecidos pela maioria das pessoas como deteriorantes de alimentos. Você já deve ter encontrado aquela última fatia de pão com alguns pontinhos pretos, ou até mesmo a laranja com uma coloração esverdeada. Também observamos fungos nas paredes da nossa casa, principalmente quando ela está muito úmida e pouco arejada, não é mesmo? Então, você deve estar pensando, qual seria a aplicação destes fungos em Biotecnologia?

Fungos Filamentosos na Indústria Farmacêutica

Os fungos filamentosos são extremamente importantes em Biotecnologia. São micro-organismos produtores de diversas enzimas e metabólitos.

Um composto bastante conhecido é a penicilina, produzida por um fungo filamentoso (Penicillium notatum, atualmente conhecido como Penicillium chrysogenum), sendo este o primeiro antibiótico natural a ser produzido em grande escala. A penicilina foi fundamental durante a II Guerra Mundial, pois foi usada no tratamento de soldados feridos, evitando, assim, diversas mortes por infecção.

Outro antibiótico produzido por fungos é a cefalosporina, pelo Acremonium chrysogenum. Além dos antibióticos, os fungos podem ser usados para produzir outros medicamentos, como o imunossupressor ciclosporina (medicamento que diminui a ação do nosso sistema imunológico – utilizado em casos de transplantes para evitar a rejeição ao órgão), produzido por Tolypocladium nivenum – e a lovastatina (fármaco utilizado para a diminuição do colesterol), sintetizada pelos fungos Monascus ruber e Aspergillus terreus.

Fungos Filamentosos na Indústria Alimentícia

Uma aplicação bastante conhecida destes micro-organismos é a na maturação de queijos. Alguns exemplos são os queijos Camembert (Penicillium caseicolum) e Roquefort (Penicillium roqueforti). O papel dos fungos na maturação destes queijos é a produção de enzimas como lipases e proteases, as quais irão atuar sobre as proteínas e as gorduras do queijo, respectivamente, garantindo aromas e sabores diferenciados. Essa maturação também é importante na conservação destes alimentos.

Como mencionado anteriormente, a produção de enzimas pelos fungos filamentosos é de grande importância industrial. Enzimas como as proteases, dentre elas a renina, produzida pelo fungo Mucor miehei, são utilizadas na fabricação de queijos (coagulação da proteína caseína do leite). As amilases (que hidrolisam o amido) são utilizadas pela indústria cervejeira para disponibilizar o açúcar para a fermentação e são produzidas pelos bolores Aspergillus niger e  Aspergillus oryzae.

Alimentos fermentados são bastante comuns na culinária oriental e vêm se popularizando também em outros países, dentre eles o Brasil. O molho shoyu, aquele molho escuro consumido como acompanhamento de comidas japonesas, tem, na sua primeira etapa de preparação, a fermentação da soja e do trigo pelos fungos Aspergillus soyae e Aspergillus oryzae. O sake, uma bebida alcoólica produzida a partir de arroz, também utiliza o fungo Aspergillus oryzae na fermentação deste cereal, como primeira etapa na produção desta bebida.

Fungos Filamentosos em Outras Indústrias

Os fungos também são importantes em indústrias como as de detergentes, papeleira e têxtil. Tal fato é devido (novamente!) à produção de enzimas, que atuam sobre determinados substratos de forma mais branda e mais ecologicamente amigável. Os detergentes enzimáticos vêm sendo cada vez mais utilizados em substituição a substâncias corrosivas, como a soda cáustica, bastante importante na limpeza de gorduras. As lipases (que hidrolisam gorduras) são produzidas por fungos como Aspergillus niger e Aspergillus oryzae e são interessantes substitutos às substâncias cáusticas.

Na indústria papeleira e têxtil, as celulases são importantes no processamento da celulose, na modificação da fibra, na produção de papel reciclado, na remoção de tinturas de peças de roupas (estonagem) e no melhoramento de tecidos de algodão. Alguns fungos produtores de celulases são Trichoderma viride e Trichoderma reesei.

Estes são apenas alguns exemplos da importância dos bolores em nossa vida. Deixamos algumas referências abaixo, caso queira conhecer um pouco mais sobre essas biofábricas tão interessantes. E pode ter certeza, ainda temos muito a descobrir a respeito destes micro-organismos tão fabulosos.

E de agora em diante, aqueles pontinhos pretos no pão serão encarados de forma um pouco mais curiosa, não é mesmo? Mas calma aí, pessoal, não é para comer esse pão mofado, hein? Já ouviram falar das micotoxinas? Pois então, esse é um assunto para um próximo texto.

Referências

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Figura de capa: http://forces.si.edu/soils/04_00_20.html