“Cooked” é uma série documental produzida pela Netflix, dirigida por Alex Gibney, dividindo-se em 4 episódios temáticos: ar, fogo, terra e água. A série é apresentada pelo jornalista, escritor e ativista da boa alimentação Michael Collin. Inspirada pelo livro “Cozinhar, Uma História Natural da Transformação” escrito pelo apresentador, a obra é vista como uma nova opção de conhecer a base da boa alimentação e sua importância, através da desconstrução de tabus empregados em diferentes lugares do mundo.
No Profissão Biotec já falamos sobre “Cooked” no texto 4 documentários aos quais todo biotecnologista deveria assistir, vale a pena conferir!
Em “Terra”, quarto episódio da série, Pollan traz alguns tipos de fermentação e explica o papel dos microrganismos nesse processo. Como por exemplo, a fermentação das bebidas alcoólicas, apresentando a preparação de uma das bebidas mais antigas e rústicas em um vilarejo no Peru: o masato. Essa bebida é feita através da mastigação de uma raiz conhecida como aipim ou mandioca. Um pouco nojento, pode-se dizer, mas a série explica que em nossa saliva há certas enzimas, as amilases, que transformam o amido em açúcar que as leveduras precisam, tornando-se essencial ao processo.
Uma das opiniões trazidas pelo apresentador durante a série, é o fato da humanidade ter cultivado um legado de germofobia: a ideia que todos os germes podem te levar a morte ou causar uma doença no corpo humano. Claro que Louis Pasteur já identificou os micróbios (bactérias, leveduras e fungos) e relacionou vermes e doenças, causa e consequência, porém não são todos que nos fazem mal.
No decorrer desse episódio é perceptível o quanto os microrganismos se fazem presentes em nossas vidas. As bebidas alcoólicas, por exemplo, tão apreciadas e consumidas no mundo inteiro, são resultado da ação de leveduras que convertem o açúcar em álcool, na chamada fermentação alcoólica. Também é mencionado o chocolate, que só existe por causa da fermentação anaeróbica da goma do cacau, onde as bactérias liberam energia em forma de calor (evitando a germinação das sementes) e dias depois forma o ácido acético, responsável pela cor característica do produto.
As idas e vindas que o autor faz na linha do tempo, nos traz uma comparação com o momento de descoberta até os dias de hoje, e isso faz com que percebamos com facilidade que a técnica é a mesma, porém hoje nós sabemos o porquê desses fenômenos acontecerem e como fazer para que eles atuem a nosso favor. Além dos processos naturais que ajudaram na descoberta da fermentação, podemos também fazer isso de maneira induzida. É o que a parte alimentícia da Biotecnologia faz, como por exemplo a produção proteínas unicelulares e a ensilagem.
No decorrer da obra foram perceptíveis os milagres da fermentação no processo de fabricação dos alimentos, passando por diversos campos da gastronomia e indo para o estudo da biotecnologia, apresentando a ecologia do queijo, pelo fato de que os micróbios presentes no nosso intestino são difíceis de serem estudados.
A microbiologista e freira, Noelia Marcellina, de Connecticut utiliza o processo elementar para produzir seu queijo – leite cru, bactérias, fungos e leveduras naturais, tanques de madeira e sem adição de ácido lático. Essa maneira foi criticada após casos de Listeria se agravarem na região, pois o recipiente usado por ela, tanques de madeira, podem possuir bactérias escondidas nas frestas e, como a freira não pasteuriza o leite que usa, as chances daquele laticínio fabricado não ser seguro para consumo eram muito grandes. No entanto, Noelia provou através de uma comparação entre o seu tanque de madeira e um tanque de aço (recomendado pela vigilância sanitária) que os lactobacilos já presentes no seu recipiente matavam o causador da Listeria e fora isso, os queijos eram armazenados por longos períodos, cultivando os fungos que davam mais sabor, tornavam eles mais nutritivos e seguros para consumo.
Ademais, a obra também transmite a ligação entre os microbiomas dos alimentos e os microbiomas humanos. Uma das curiosidades interessantes é que a bactéria B. linens (Brevibacterium linens), responsável pelo forte odor dos queijos é a mesma que está presente entre nossos dedos dos pés e axilas. É incrível pensar que 9 em cada 10 células do corpo humano pertencem aos micróbios.
O avanço da ciência permitiu novas descobertas no mundo da microbiologia, revelaram uma imensidão desconhecida de micróbios que vivem em nós e ao nosso redor, e é impressionante como eles estão em todos os lugares sempre interagindo, sejam entre si ou com outros seres. A intenção da obra é fazer o telespectador entender e refletir a importância dos microrganismos na culinária, que é arte e ao mesmo tempo é ciência. Isso ocorreu de maneira bem transparente exibindo estudos, pesquisas, resultados e explicando processos. Esse tipo de documentário acaba abrindo um leque de conhecimentos antes ignorado, até mesmo quebrando paradigmas anteriormente criados. Recomendamos com a certeza a apreciação desta série que irá acrescentar alguma destreza a quem assiste independente da faixa etária e/ou nível de ensino.
Sobre as escritoras:
Alunas da segundo semestre do Ensino Médio técnico em Biotecnologia pelo SENAI – CIMATEC de Salvador, Bahia. Texto produzido na disciplina de Microbiologia aplicada a biotecnologia da professora Larissa Fonseca (ex-colaboradora do Profissão Biotec) :