A medicina personalizada, de precisão ou genômica possui diversos nomes, mas que significam basicamente a mesma coisa: o desenvolvimento de um tratamento no qual se observa o efeito que este provoca no organismo, monitora a resposta do corpo e garante o melhor tratamento para cada caso específico. Nada mais do que um tratamento sob medida! Por exemplo, ao invés de um remédio ser prescrito igualmente para todos os pacientes, estes seriam manipulados ou dosados para cada um dos casos, levando em consideração as informações genéticas do paciente. Caso queira entender melhor o conceito temos outros textos do Profissão Biotec explicando mais detalhadamente para você aqui e aqui.
Apesar da medicina de precisão e suas outras vertentes, como a aplicada à Nutrição, serem temas bastante atuais, ela ainda está um pouco longe do nosso dia-a-dia. Entretanto, há diversos cientistas que estão trabalhando em soluções interessantes de como torná-la rapidamente aplicável.
O que os cientistas estão fazendo para tornar a medicina personalizada uma realidade?
Desenvolvimento de tumores crescidos em laboratório para testes de medicamentos
Pesquisadores da UCLA (Universidade da Califórnia) desenvolveram um método rápido para crescer células tumorais de pacientes e realizar o teste para diferentes tratamentos, ou combinação de tratamentos, de maneira personalizada, auxiliando na adoção da melhor terapia a ser ministrada ao paciente. As células são crescidas na forma de organóides, órgão pequenos e ainda em desenvolvimento, mas que já são capazes de responder ao tratamento, em placa multipoços, conforme o esquema abaixo.
Por serem miniaturas capazes de crescer nos poços dessa placa, é possível realizar o teste de centenas de tratamentos ao mesmo tempo e de forma automatizada. Leva apenas cerca de três a cinco dias até se obter o resultado de qual deles é o mais efetivo. Todo o processo, desde a cirurgia para coleta do tumor até os resultados finais tem a duração estimada de uma a duas semanas.
Para testar a técnica, foram coletadas células de quatro pacientes, três com câncer de ovário e um com câncer peritoneal. Segundo a pesquisadora responsável, uma das mulheres foi diagnosticada com um subtipo raro de câncer de ovário, o qual respondeu a uma classe de medicamentos denominada inibidores de ciclina-kinase (CDK).
Para essa classe não há biomarcadores conhecidos para medir o efeito do medicamento. Dessa forma, não haveria como descobrir a que tipo de medicação o câncer responderia caso não fossem feitos os testes automatizados. A adoção da medicina personalizada não é uma oposição ao tratamento convencional, mas uma alternativa àqueles que não encontram tratamento algum.
Sequenciamento do Exoma
A medicina personalizada se baseia nas informações genéticas de cada indivíduo, portanto, são necessárias técnicas para determinar a sequência de pares de bases. A mais aplicada é o sequenciamento de nova geração (NGS), que pode ser realizado utilizando todo o genoma, ou seja, toda a informação genética de um organismo, ou somente o exoma. O exoma é formado apenas pelas regiões codificadoras do DNA, chamadas de éxons, que são genes capazes de serem traduzidos em uma proteína.
Atualmente, a utilização do exoma vêm sendo mais empregada por ser uma técnica mais barata e mais rápida, já que o exoma corresponde a menos de 2% do DNA humano. Ainda assim, são nas regiões codificadoras dos exons que normalmente estão as mutações responsáveis pelas doenças genéticas mais comuns, como o câncer ou autismo. Estima-se que cerca de 85% das mutações patológicas estão presentes nos exons. Realizar análises do exoma significa ter uma maior facilidade no processamento, armazenamento e análise dos dados, mesmo que as sequências devam ser reanalisadas de 50 a 100 vezes, para evitar chamar de mutações o que na verdade podem ser erros de sequenciamento.
No Brasil, em Março de 2019 foi aprovado o uso do sequenciamento de exoma no SUS para investigação de deficiência intelectual desconhecida. Para saber mais sobre a técnica e sua implementação na investigação de doenças genéticas leia esse texto do PB
Modelagem computacional
Para possibilitar que o tratamento personalizado seja testado antes de ser aplicado ao paciente, cientistas da Universidade de Linkoping, na Suécia, têm uma proposta inovadora. Eles apostaram na construção de um modelo computacional das diferentes alterações genéticas que ocorrem entre os tipos celulares em uma certa doença. Seria uma espécie de “gêmeo digital”, como o próprio autor chama, da doença do paciente.
Os pesquisadores criaram modelos utilizando ratos acometidos por artrite reumatóide humana. O sequenciamento de RNA de uma única célula foi utilizado para determinar a atividade gênica das milhares de células individuais presentes nas juntas do rato doente. Então, foi construída uma rede da interação das células, onde a célula que possui maior correlação com as demais provavelmente é a mais importante para a manutenção da doença. Pelo tipo celular, foram identificados os tratamentos mais responsivos e foi possível curar o rato doente. O mesmo tipo de rede é capaz de identificar não só as células mais responsáveis pela doença, mas também qual o gene, metabólito ou proteínas relacionadas à doença, de acordo com o tipo de dado ômico utilizado.
Além disso, o estudo também demonstra que é possível utilizar modelos computacionais para diagnosticar doenças humanas. Isso foi realizado através do uso de células importantes do sistema imune humano, as células T. Essas células serviram como marcador do modelo. Não só foi possível distinguir quem possuía a doença de quem não a possuía, como diferenciar 13 tipos diferentes de doenças testadas, abrindo uma possibilidade tanto para o diagnóstico quanto para a aplicação da medicina personalizada.
A aplicação e difusão da medicina personalizada é um esforço global entre os cientistas. Além das pesquisas divulgadas neste texto, há outros pesquisadores trabalhando no assunto com diferentes soluções e melhorias para promover uma maior e mais efetiva aplicação da medicina de precisão. Você conhece outras pesquisas a respeito? O que pensa sobre a medicina de precisão? Comente e compartilhe com a gente!
Referências:
BENSON, M. Digital twins – an aid to tailor medication to individual patients. Disponível em: <https://liu.se/en/news-item/digital-tvillingar-hjalpmedel-for-skraddarsydd-medicinering->. Acesso em: 7 de janeiro de 2020.
GAWEL, D. R. et al. A validated single-cell-based strategy to identify diagnostic and therapeutic targets in complex diseases. Genome Medicine, v. 11, n. 1, 30 jul. 2019
PHAN, N. et al. A simple high-throughput approach identifies actionable drug sensitivities in patient-derived tumor organoids. Communications Biology, v. 2, n. 1, 1 dez. 2019.