Aquecimento global, guerras mundiais, pragas, catástrofes que podem destruir países inteiros. Em meio a tudo isso, o risco da extinção de alimentos básicos, como arroz, feijão, milho e diversos outros. O filme “Interestelar” (2014) traz uma reflexão sobre o assunto, onde a Terra consome a maior parte de suas reservas naturais, além de ser afetada por pragas, e um grupo de astronautas recebe a missão de verificar possíveis planetas que possam ser povoados.
Preocupados que essa situação não fique apenas na ficção científica e se torne realidade em um futuro não tão distante, a Noruega criou um Banco Global de Sementes, guardando amostras do mundo todo em um cofre subterrâneo no extremo Ártico.
Como surgiu o Banco Global de Sementes de Svalbard?
Na década de 80, preocupados com a possível devastação causada pelo aquecimento global e guerras mundiais, o Nordic Gene Bank (agora NordGren), uma organização de conservação de plantas, animais e florestas, estabeleceu uma instalação de armazenamento de sementes em uma mina de carvão abandonada fora da cidade de Longyearbyen, na Noruega. Desde então, a organização armazena o germoplasma – estrutura onde se encontra o material genético de uma espécie – de plantas nórdicas por meio de sementes congeladas.
Em 2001, negociações na 31ª sessão de conferência da Organização das Nações Unidas para a Alimentação e a Agricultura (FAO) entre os 164 países membros, levaram ao Tratado Internacional de Recursos Genéticos Vegetais para Alimentação e Agricultura (ITPGRFA), que exigia a criação de um sistema multilateral de recursos genéticos vegetais, incluindo regras globais de acesso e compartilhamento de benefícios desses recursos.
A partir daí, o Governo da Noruega foi abordado pela Bioversity International (então IPGRI), uma organização global de pesquisas relacionadas à biodiversidade agrícola, e encorajado a considerar a criação de uma instalação global no arquipélago de Svalbard para armazenar essas sementes. Com base nos resultados de um estudo de viabilidade de 2004 e no endosso e acolhimento da iniciativa da Comissão de Recursos Genéticos para Alimentação e Agricultura da FAO, o Governo norueguês comprometeu-se a financiar e estabelecer o Svalbard Global Seed Vault.
Por fim, em 2008 o Banco Global de Sementes de Svalbard (Svalbard Global Seed Vault) foi criado na Noruega em um ponto estratégico no extremo Ártico, localização considerada ideal devido às baixas temperaturas e isolamento social. Esse banco, conhecido também como “O Cofre de Sementes”, é operado em uma parceria única entre o Ministério norueguês de Alimentos e Agricultura, o NordGen e a Crop Trust, uma organização internacional independente que recebe financiamentos da Fundação Bill & Melinda Gates e de vários governos em todo o mundo.
O Cofre de Sementes foi construído bem acima do pior cenário para o aumento do nível do mar. As três câmaras de sementes são esculpidas em montanhas de rocha sólida, e o túnel que leva às câmaras é feito de concreto impermeável.
Qual é o propósito do Banco Global de Sementes de Svalbard e como funciona?
O Banco oferece armazenamento seguro, gratuito e a longo prazo de amostras de sementes armazenadas nos demais bancos genéticos do mundo. Ele funciona como uma apólice de seguro para esses bancos de genes caso percam seu material por qualquer motivo. Ao fornecer um backup de segurança, o Cofre de Sementes contribui para garantir a diversidade de culturas importantes para a produção mundial de alimentos.
As sementes são armazenadas em “condições de caixa preta”, o que significa que os depositantes são os únicos que podem retirar suas próprias sementes. Quando as sementes são depositadas no Svalbard Global Seed Vault, sua propriedade legal não é transferida. Isso significa que um depositante que opta por armazenar suas sementes no Banco, ainda é o proprietário das sementes e o único que pode retirá-las do Cofre de Sementes, e o pessoal da NordGen pode apenas manuseá-las.
As sementes no Svalbard Global Seed Vault são mantidas resfriadas em condições de temperatura à -18°C e, quando enviadas bem secas e embaladas a vácuo, podem permanecer viáveis por séculos. Mas, à medida que os bancos nacionais de sementes realizem testes de germinação em suas coleções, eles podem reenviar ou enviar novas sementes para o Cofre.
Em setembro de 2015, houve a primeira retirada de sementes do Cofre para repor um banco genético da cidade de Aleppo, na Síria, que foi parcialmente danificado por causa da guerra civil no país.
O Banco da Noruega conta hoje com mais de um milhão de amostras de sementes, vindas de 66 países diferentes.
O Brasil tem uma conta no banco de sementes?
No ano de 2012 foi realizado o primeiro depósito de germoplasma de bancos brasileiros para o cofre das sementes na Noruega: foram enviados pela Empresa Brasileira de Pesquisa Agropecuária (Embrapa) 264 acessos de milho e 541 de arroz. Acessos são amostras de sementes representativas de diferentes populações de uma mesma espécie.
Em 2014, foram enviados mais 514 acessos de feijão. Ano passado, em 2020, a Embrapa, vinculada ao Ministério da Agricultura, Pecuária e Abastecimento, enviou para a Noruega 3.438 materiais genéticos que fazem parte do seu acervo, para compor o Banco Global de Sementes de Svalbard. Foram 3.037 acessos de arroz, 87 de milho, 119 de cebola, 132 de pimentas Capsicum e de 68 Cucurbitáceas (abóboras, morangas, melão, pepino, maxixe e melancia).
O material enviado foi recolhido em bancos de germoplasma mantidos pela Embrapa Recursos Genéticos e Biotecnologia (Brasília-DF), Embrapa Arroz e Feijão (Santo Antônio de Goiás-GO), Embrapa Milho e Sorgo (Sete Lagoas-MG), Embrapa Clima Temperado (Pelotas-RS) e Embrapa Hortaliças (Brasília-DF).
Depósito ou obra de arte?
Ao longo da cobertura da estrutura e de sua fachada exposta, existe uma instalação luminosa chamada Perpetual Repercussion, realizada pela artista norueguesa Dyveke Sanne, indicando a localização do cofre à distância. Na Noruega, projetos financiados pelo governo que excedem certo orçamento – de aproximadamente 8,8 milhões de dólares nesse caso – devem conter uma obra de arte.
Uma agência governamental norueguesa, que é responsável por administrar arte em lugares públicos, entrou em contato com a artista para instalar uma obra luminosa que ressaltasse a importância e a beleza da aurora boreal. A cobertura e a entrada do cofre são cobertas por placas de aço inoxidável de alta reflexibilidade. No verão, a instalação reflete as luzes polares enquanto que, no inverno, uma rede de cerca de 200 cabos de fibra óptica dá à instalação uma cor esverdeada.
O Banco Global de Sementes de Svalbard foi classificado em 6º lugar nas Melhores Invenções de 2008 da Revista Time e recebeu o Norwegian Lighting Prize em 2009.
Iniciativas como o Banco Mundial de sementes são necessárias para preservar a diversidade natural no planeta Terra, garantindo que a vida que conhecemos hoje não suma em alguns anos.
Cite este artigo:
MELLO, L.P.S. Banco Global de Sementes da Noruega e o futuro da produção mundial de alimentos. Revista Blog do Profissão Biotec, v.8, 2021. Disponível em: <https://profissaobiotec.com.br/banco-global-de-sementes-noruega-producao-alimentos/ > Acesso em: dd/mm/aaaa.
