O que é um banco de germoplasma?
Quando ouvimos a palavra “banco”, nos vem a ideia de algum ambiente físico ou virtual que serve para guardar pertences, dinheiro, coisas valiosas ou informações úteis que possam ser acessadas no futuro. Dentre tantas coisas que podem ser guardadas ou se fazer um backup, é possível também guardar o material genético de seres vivos, nos chamados bancos de germoplasma.
O germoplasma é todo material genético de um indivíduo ou espécie que pode ser transmitido ou utilizado para gerar descendentes capazes de se desenvolverem. Sendo assim, um banco de germoplasma é uma unidade onde é preservado o material genético de diferentes espécies ou indivíduos da mesma espécie. E todo material genético que constitui um germoplasma é considerado um recurso genético, ou seja, apresenta um valor científico, econômico, social, ambiental ou potencial.
A importância de se guardar o material genético de seres vivos é diversa. Bancos de germoplasma são alternativas valiosas que ajudam a conservar a biodiversidade animal e vegetal e até a salvar espécies em risco de extinção. Além disso, o material genético dá a identidade de um indivíduo e nos permite obter informações a respeito da variabilidade genética dentro de uma mesma espécie. Isso cria a possibilidade de usar essas informações no melhoramento genético de plantas e animais, ferramenta da Biotecnologia, selecionando indivíduos com características que podem potencializar a produção de alimentos e derivados.
Bancos de germoplasma animal
Os bancos de germoplasma animal começaram a se ampliar um tempo depois que os bancos de germoplasma de plantas já estavam bem consolidados em diversos países. Eles surgiram principalmente devido a duas preocupações: conservar recursos genéticos de animais domésticos com valor econômico e a necessidade de preservar espécies ameaçadas ou em perigo de extinção.
No Brasil, um fato interessante foi o gatilho para a criação do primeiro banco de germoplasma animal. Com a descoberta do país, os colonizadores trouxeram diversas raças de animais domésticos que se adaptaram ao nosso ambiente e contribuíram para a produção de alimentos. Infelizmente, essas raças de alto valor econômico começaram a cruzar com raças exóticas que foram introduzidas posteriormente nos séculos XIX e XX, o que levou às primeiras a estarem ameaçadas de extinção. A preocupação em preservar essa biodiversidade importante levou a Embrapa a incluir um banco de germoplasma animal no Programa de Recursos Genéticos em 1983.
Atualmente, diversas unidades da Embrapa mantém bancos de germoplasma animal, com o intuito de preservar o material genético de espécies que têm um valor para a pesquisa, economia e meio ambiente. E vale ressaltar que, nos últimos 15 anos, um olhar para a preservação do material genético da fauna nativa também está em pauta. Em destaque podemos citar os bancos do Laboratório de Conservação de Germoplasma Animal (UFERSA) e o Banco de Germoplasma de Animais Selvagens do Jardim Zoológico de Brasília, ambos focados em preservar espécies selvagens nativas que podem ou não estar ameaçadas de extinção.
O Instituto Tamanduá (ONG com sede no Piauí) também está com um trabalho incrível, o Projeto Arca Xenarthra, que visa conservar germoplasma de espécies de tamanduá, bicho-preguiça e tatus, que são animais que sofrem com as queimadas constantes no Pantanal.
Como se conserva um germoplasma animal?
A conservação de um germoplasma animal pode ser feita de dois modos:
- in situ: quando animais vivos que têm características genéticas desejáveis e valiosas são mantidos em segurança no seu habitat natural.
- ex situ: quando os animais vivos ou parte deles são mantidos fora do habitat natural, podendo ser usados os seguintes métodos:
- in vivo: animais mantidos em locais como fazendas
- in vitro: através da cultura de tecidos do animal em laboratório
- criopreservação: preservação de células embrionárias, gametas, sêmen, sangue, tecidos ou DNA do animal em baixas temperaturas utilizando nitrogênio líquido.
Ambos os modos são importantes e complementares, pois há a possibilidade de acessar tanto os animais mantidos vivos quanto o seu germoplasma presente em células e tecidos. Esse intercâmbio garante que sejam realizadas pesquisas em laboratório e em campo para investigar a variabilidade genética, além de garantir que se utilizem técnicas de Biotecnologia para estudar o genoma das espécies, realizar inseminações artificiais, fertilização in vitro, clonagem, melhoramento animal e recuperação de raças e populações ameaçadas de extinção.
As diferentes modalidades de bancos de germoplasma animal são como um backup onde se pode acessar o organismo inteiro e também partes importantes dele. Se um acidente ocorre em um banco de germoplasma que contém partes do animal, é possível resgatá-las nos bancos onde eles são mantidos vivos. E se a espécie viva está em risco de extinção ou foi extinta, é possível tentar resgatar sua população acessando o material genético em células ou tecidos que estão preservados principalmente pela criopreservação.
É possível reviver um animal extinto, como fizeram em Jurassic Park?
No clássico filme de ficção científica Jurassic Park, um grupo de cientistas encontrou DNA de dinossauros dentro de mosquitos que se alimentavam do seu sangue, os quais estavam conservados dentro de uma resina fóssil, o âmbar. Como esse material genético não estava íntegro, eles utilizaram a engenharia genética para adicionar trechos de DNA de anfíbios, répteis e aves, e conseguiram criar embriões em laboratório que trouxeram os dinossauros de volta à vida.
Do ponto de vista científico, sabemos que as técnicas retratadas no filme são muito complicadas de serem realizadas no mundo real devido a vários fatores. Mas saindo da ficção, será que as tecnologias modernas combinadas com os bancos de germoplasma poderiam trazer espécies extintas à vida?
O processo de trazer animais extintos à vida se chama desextinção e até já ocorreu uma tentativa. Em 2000, uma espécie de cabra selvagem foi extinta e um ano antes cientistas conseguiram coletar e criopreservar células da sua pele. Oito anos depois, cientistas europeus conseguiram reprogramar essas células e usar a Biotecnologia para gerar embriões que foram gerados por uma mãe de aluguel de uma espécie próxima. Apenas um desses embriões, um clone idêntico à mãe extinta, conseguiu se desenvolver, mas infelizmente morreu alguns minutos após nascer.
Também temos, atualmente, pesquisas voltadas para a clonagem do mamute, o que vem gerando bastante discussão na comunidade científica. Já foram encontrados sinais de atividade no material genético danificado que foi retirado do fóssil de um mamute que morreu há mais de 28.000 anos. O grande desafio é conseguir gerar um embrião que possa ser gestado em laboratório ou em uma barriga de aluguel, como por exemplo, em uma espécie de elefante asiático. Os problemas para isso são inúmeros e esbarram em questões éticas, além de se questionar se realmente valeria a pena clonar o mamute para os fins propostos pelos cientistas.
A reflexão que fica com a idéia de desextinção é que o mais importante é tentar preservar as espécies animais que estão vivas e pensar que os bancos de germoplasma animal podem ser uma ferramenta para evitar sua extinção utilizando métodos de recuperação das populações, já que é possível fazer esse backup do germoplasma de espécies importantes e ameaçadas. E junto a isso, é necessário preservar também o habitat dessas espécies para conseguirmos manter a biodiversidade do planeta.
Cite este artigo:
ABREU, F. C. P. Bancos de germoplasma animal: guardar para preservar. Revista Blog do Profissão Biotec, v.9, 2022. Disponível em: <https://profissaobiotec.com.br/bancos-de-germoplasma-animal-guardar-para-preservar/>. Acesso em: dd/mm/aaaa.
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