O Profissão Biotec entrevista duas importantes pesquisadoras brasileiras para discutirmos o papel da mulher na ciência.

Para celebrar o Dia Internacional da Mulher, o Profissão Biotec traz entrevistas exclusivas com duas cientistas brasileiras de destaque: Mellanie Dutra e Marcia Cristina Bernardes Barbosa.

Mellanie Dutra é biomédica, neurocientista, divulgadora científica e Embaixadora Para Mulheres na Ciência L’Óreal. Já a Dra Márcia Cristina Bernardes Barbosa é professora titular de Física na Universidade Federal do Rio Grande do Sul (UFRGS), membro titular da Academia Brasileira de Ciências e da Academia Mundial de Ciências (TWAS).

Nas entrevistas a seguir, conhecemos um pouco mais sobre essas cientistas, suas opiniões e referências, além de conselhos para futuras cientistas! 

Entrevista com Mellanie Dutra

Cientista Mellanie Dutra.
Cientista Mellanie Dutra. #ParaTodosVerem: Mellanie, de cabelos soltos, usando óculos e sorrindo, está vestindo um jaleco branco e com braços cruzados. Créditos da foto: Arthur Woltmann

A Dra Mellanie Dutra é formada em Biomedicina (2013), Mestre e Doutora em Neurociências, e Pós-Doutora em Bioquímica. Atualmente, é professora da Escola de Saúde da Universidade do Vale dos Sinos (Unisinos), idealizadora e coordenadora da Rede Análise, membro da União Pró-Vacina e da rede #TodosPelasVacinas, e também atua como Embaixadora Para Mulheres na Ciência L’Óreal. 

Durante a pandemia, a Dra Mellanie ganhou destaque pela sua atuação na divulgação científica, tornando-se uma referência na produção de conteúdo e disseminação de informações seguras, todas baseadas em evidências científicas. Muito atuante nas redes sociais, a Dra Mellanie mantém um canal no YouTube (ExplicadaMente), além de outras redes sociais, que somados, possuem mais de 100 mil seguidores.

Confira a seguir, a opinião da Dra Mellanie sobre as mulheres na ciência.

Profissão Biotec:Por que você escolheu ser cientista? Alguma outra cientista te inspirou?

Mellanie Dutra: Eu sempre fui muito curiosa sobre como as coisas funcionam, quais processos estão envolvidos e acredito que minha família também teve parte importante nisso, pois os estudos sempre foram nosso principal investimento. Comecei a me interessar pelo corpo humano, pela área da saúde, e acabei tangenciando minhas escolhas no vestibular para cursos que pudessem me propiciar uma possibilidade para me tornar cientista e/ou fazer pesquisas, como a biomedicina. Na época, foi uma escolha difícil, pois não conhecia outras cientistas para além da Marie Curie, por exemplo. Sempre ouvia nomes e via rostos, nas aulas e em outros espaços, de cientistas homens, então eu me sentia super insegura se eu conseguiria encontrar espaços para crescer, desenvolver e contribuir. Felizmente, tive muito suporte dos meus pais e, depois de ingressar na biomedicina, de professoras, da minha orientadora e outras referências femininas. 

Profissão Biotec: Qual a maior dificuldade para uma mulher fazer ciência no Brasil? 

Mellanie Dutra: Acredito que, infelizmente, lidamos com muitas, mas o machismo ainda é muito enraizado e estrutural na nossa sociedade, e isso também afeta o meio acadêmico e a ciência. Quantas mulheres foram esquecidas pela ciência, tiveram seus feitos creditados a colegas homens ou simplesmente roubados? Não faltam exemplos de situações assim, e infelizmente, vemos que nas posições de chefias, as mulheres ainda seguem como minoria em muitos segmentos. A maternidade também é algo que precisa ganhar mais espaço nas discussões, pois ela de forma alguma deveria ser vista como algo que atrapalha a carreira acadêmica da cientista. São cenários complexos, e ainda temos a questão da falta de incentivos específicos e de estratégias mais assertivas para reduzir essas disparidades de gênero. Se fizermos um recorte para cientistas mulheres negras, cientistas mulheres trans, essas disparidades pode ser ainda maiores.

Profissão Biotec: O que podemos fazer para mudar o cenário de desigualdade de gênero na ciência?

Mellanie Dutra: As estratégias precisam ser multifacetadas e partir de mais de um ponto de ação porque, como vimos, o problema é complexo e envolve muitos níveis. É preciso criar políticas de visibilidade para as contribuições científicas de mulheres, investimento na ciência com bolsas e editais que possam também ser pensados para as cientistas (um exemplo que temos é o programa Para Mulheres na Ciência, de L’Óreal, UNESCO Brasil e Academia Brasileira de Ciências), investir em pesquisas que buscam analisar esse cenário de disparidade de gênero, para poder entender e delinear estratégias que visem melhorias a partir do diagnóstico desses dados. Isso são exemplos de ações que podem ser criadas/fortificadas, mas precisamos de ainda mais estratégias.

Profissão Biotec: Deixe um recado/conselho para as meninas que querem seguir a carreira científica.

Mellanie Dutra: Meu conselho é que tem muito mais mulheres do que imaginamos trilhando carreiras brilhantes, descobrindo coisas fantásticas e que, por mais que ainda não cheguem na gente esses nomes e rostos, há muitas mulheres batalhando para que isso mude. E você pode ser uma delas. Você pode ser a porta-voz dos avanços científicos. Você pode ser a grande mentora de uma legião de futuras mulheres cientistas. Você pode descobrir coisas que podem levar ao primeiro nobel brasileiro em medicina e fisiologia ou outras áreas. Você pode revolucionar o uso de algum material mais amigável para o ambiente, descobrir uma forma efetiva de viagem espacial de longas distâncias ou um tratamento divisor de águas para uma doença sem cura. Parece surpreendente e grandioso, mas mulheres cientistas fazem coisas surpreendentes e grandiosas e você pode fazer parte disso, não importa o que outras pessoas achem ou digam. Há muitas mulheres, hoje, batalhando para que mais caminhos sejam abertos para você. Você merece acreditar, e mais ainda, conseguir. Era o que eu gostaria de ter ouvido há 15 anos atrás e é o que eu quero dizer para cada menina que sonha em ser uma cientista. 

Entrevista com Márcia Cristina Bernardes Barbosa

Cientista Márcia Barbosa
Cientista Márcia Barbosa. #ParaTodosVerem: Marcia, de cabelos soltos e sorrindo, está vestindo um colar preto, uma blusa e blazer rosa. Créditos da foto: Mateus Bruxel

A Dra Márcia possui graduação (1981), mestrado (1984) e doutorado (1988) em Física pela Universidade Federal do Rio Grande do Sul (UFRGS). Além de ser professora titular da UFRGS, também é membro titular da Academia Brasileira de Ciências e da Academia Mundial de Ciências (TWAS). Dra Márcia lidera pesquisas na área de Física, e investiga a água e suas anomalias em processos físicos e biológicos. Sua trajetória de sucesso rendeu importantes premiações como Medalha Nicholson da American Physical Society (2009),  Prêmio Loreal-Unesco de Mulheres nas Ciências Fĩsicas (2013), Prêmio Claudia em Ciência (2013), Prêmio Anísio Teixeira da Capes (2016) e Prêmio Mérito Científico (2018).

Confira a seguir o que a Dra Márcia tem a dizer sobre a participação feminina na ciência.

Profissão Biotec: Por que você escolheu ser cientista? Alguma outra cientista te inspirou?

Marcia Barbosa: Eu me apaixonei por ciência quando na escola pública onde estudava fui convidada para cuidar do laboratório à noite. Eu montava os experimentos, reagentes químicos … Um dia eu estava fazendo um forno elétrico com tijolos e uma  resistência. Fiz algo errado e caiu o disjuntor do colégio. Imediatamente fiquei desliguei o experimento, liguei o disjuntor, descobri o meu erro e entendi o que havia feito de errado. Era uma emoção que eu queria sentir no resto da minha vida.

Profissão Biotec: Qual a maior dificuldade para uma mulher fazer ciência no Brasil? 

Marcia Barbosa: Financiamento descontinuado, falta de uma política regular e ininterrupta e ausência de prioridades. Pesquisadores e pesquisadoras nunca sabem se haverá financiamento suficiente no próximo ano e não sabem se a sua área será prioritária.

Profissão Biotec: O que podemos fazer para mudar o cenário de desigualdade de gênero na ciência?

Marcia Barbosa: Há três elementos básicos. Primeiro, os estereótipos que as mulheres nas ciências exatas têm que enfrentar. Um estudo mostra que no imaginário social inteligência é um atributo masculino. O mesmo estudo indica que mulheres já aos 7 anos de idade se identificam mais com esforço do que com inteligência. Segundo, a sociedade precisa compatibilizar a carreira e a família. Diversidade é um instrumento de eficiência ( quem mostra isto é a consultoria Mckinsey em seu documento Diversity Matters). Terceiro é a mitologia de que para ser líder a pessoa tem que ser “grosseira”, assediando os que atuam com ela.

Temos que trabalhar desde a escola em mostrar que ciência é para qualquer pessoa, que homens e mulheres são potencialmente igualmente inteligentes e que há várias formas de liderança.

Profissão Biotec: Deixe um recado/conselho para as meninas que querem seguir a carreira científica.

Marcia Barbosa: A caminhada profissional é mais divertida se compartilhada . Sozinho vamos mais rápido, juntos e juntas vamos mais longe.

O Profissão Biotec agradece a participação das cientistas neste conteúdo especial e espera que as histórias de sucesso delas sejam inspirações para futuras cientistas!

Sobre Nós

O Profissão Biotec é um coletivo de pessoas com um só propósito: apresentar o profissional de biotecnologia ao mundo. Somos formados por profissionais e estudantes voluntários atuantes nos diferentes ramos da biotecnologia em todos os cantos do Brasil e até mesmo espalhados pelo mundo.

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