A soja é hoje nosso principal produto agrícola, mas não foi sempre assim. Descubra como a Embrapa nos fez o segundo maior produtor de soja do mundo.

A soja é originária da Ásia, principalmente na China. Ela é uma planta de dias curtos, ou seja, o tempo de exposição à luz (fotoperíodo) é curto e este é um dos fatores mais importantes para seu desenvolvimento, pois irá determinar o florescimento da soja. Por esse motivo ela era cultivada apenas em regiões com latitudes maiores que 30º, em locais com clima temperado. 

Devido a essa restrição a soja passou inicialmente a ser cultivada no sul do Brasil. No entanto, alguns fatores estimularam o aumento da sua produção, o que demandou aumento das terras que poderiam ser utilizadas. Percebeu-se que a soja era um bom produto para ser cultivado em sucessão ao trigo, e o aumento da produção de suínos e aves fez aumentar também a necessidade do uso do farelo de soja. Em somatória, o valor das terras na região Sul dificultava que os agricultores expandissem sua plantação.

Além disso, na década de 1970 o valor da soja no mercado internacional cresceu bastante e o Brasil possuía uma grande vantagem, uma vez que nossa produção ocorria na entressafra dos Estados Unidos que era e é até hoje o maior produtor de soja do mundo. Dessa maneira estava claro que o Brasil precisava aumentar a sua produção, não apenas para suprir sua demanda interna de soja, mas também para aproveitar a oportunidade de exportação.

As primeiras tentativas de cultivar a soja fora do Rio Grande do Sul foram no Paraná, onde a terra era mais barata. No entanto, essa iniciativa foi frustrada, pois as variedades de soja existentes na época não estavam adaptadas às condições do Cerrado. E então veio a necessidade de desenvolver uma soja brasileira que pudesse ser cultivada em latitudes menores. E a Embrapa Soja teve um papel imprescindível nesta pesquisa.

A Embrapa

A Empresa Brasileira de Pesquisa Agropecuária (Embrapa) foi criada em 7 de dezembro de 1972 e se destacou por implantar um programa de pós-graduação que visava capacitar os pesquisadores nas melhores universidades do mundo, sendo a maioria nos EUA. Três anos depois, em 16 de abril de 1975, a cidade de Londrina foi escolhida para sediar a Embrapa Soja, um centro de pesquisa da Embrapa, destinado a estimular o avanço da pesquisa para desenvolver cultivares de soja adaptados ao clima brasileiro.

Londrina foi escolhida por algumas razões: era próximo ao Instituto Agronômico do Paraná (Iapar) e poderia contar com seu apoio; sua localização em uma zona transitória próximo ao trópico de Capricórnio era estratégica, pois poderia favorecer a seleção de material genético da soja, para ser produzida tanto no sul quanto nas regiões mais acima do trópico.

Foto da fachada do Centro Nacional de Pesquisa de Soja, junto ao Iapar - Londrina, PR. 
Antigas instalações do Centro Nacional de Pesquisa de Soja, junto ao Iapar – Londrina, PR. 

Em 1989 foi estabelecida uma rede nacional de pesquisa de soja regida pelo Programa Nacional de Pesquisa de Soja (PNP – Soja). Esse foi o ponto chave para que a soja se tornasse um dos maiores produtos agrícolas e colocasse o Brasil em segundo lugar na produção mundial de soja.

A tropicalização da soja

Um dos desafios em cultivar a soja fora do sul do Brasil era que ela tendia a florescer precocemente em ambientes com dias mais longos e sua produtividade caía muito. Para superá-lo foi necessário desenvolver uma soja com características genéticas que inibissem esse florescimento, feito realizado na década de 1970.

Essa nova variedade de soja desenvolvida pela Embrapa era menos responsiva ao fotoperíodo das baixas latitudes e é conhecida como tendo período juvenil longo (PJL). Com ela o Brasil foi capaz de expandir a produção de soja para fora do Rio Grande do Sul. Além disso, as variedades resistentes às principais doenças, resistentes a insetos e pragas, com melhor qualidade da semente e tolerância à acidez do solo brasileiro garantiram maior estabilidade na produção e o retorno econômico. Isso ajudou a desenvolver a região centro-oeste que hoje produz mais de 50% da soja brasileira além de alavancar a economia do país. 

A soja é nosso principal produto de exportação, responsável pela movimentação de mais de 100 bilhões de dólares ao ano no Brasil e 7,5 milhões de empregos. Cerca de 44% da soja produzida é exportada e 49% é destinada ao processamento, para produção de óleo, farelo, entre outros produtos.

A expansão da produção de soja também alavancou a promoção da agricultura empresarial no Brasil, apoiou o desenvolvimento de maquinário agrícola, incentivou a melhora do sistema de transporte e armazenagem, profissionalizou o comércio internacional, contribuiu com a urbanização do país e a migração para a região centro-oeste. Todos esses avanços impactam diariamente outros setores da agricultura brasileira, a sociedade e a economia de maneira geral.

E todos esses avanços somente foram possíveis graças à pesquisa desenvolvida por uma rede de cientistas empenhados em desenvolver uma soja adaptada ao clima do Brasil. Até mesmo Olacyr de Moraes, conhecido como o maior produtor individual de soja do mundo reconheceu que “no fundo devemos quase tudo ao trabalho desses rapazes, técnicos e cientistas agrícolas”. 

Pesquisa atual

A Embrapa Soja atualmente possui uma coleção de germoplasma com cerca de 35 mil genótipos diferentes de soja convencional (não transgênica), a maioria oriunda do Japão, da China, e outros países onde ocorre a diversificação da variabilidade genética natural da soja. Essa mesma coleção também é armazenada no Banco Ativo de Germoplasma (BAG), em Brasília (DF), considerado patrimônio nacional.

Germoplasmas são coleções de genótipos com o intuito de preservar o material genético de uma determinada espécie. No caso de vegetais uma maneira simples de fazer isso é pelo armazenamento de sementes. Na Embrapa são usados equipamentos de última geração para conservar o germoplasma a -3ºC e com umidade controlada. Além disso, são usados sistemas eletrônicos para catalogar, caracterizar e dispor acesso às sementes.

Como a maioria dessas variedades de soja não está adaptada às condições de cultivo do Brasil, elas ainda são pouco usadas nas pesquisas de melhoramento. No entanto, elas são de vital importância já que as variedades cultivadas no país possuem pouca diversidade genética, o que confere risco à estabilidade da cultura.

Perspectivas

O Brasil produz hoje cerca de 135,4 milhões de toneladas de soja por ano, com uma área plantada de quase 39 milhões de hectares e a perspectiva é de que a soja continuará sendo um produto de grande interesse comercial, devido ao crescimento de sua demanda, por exemplo, em 2050 a população mundial deverá superar os 9 bilhões. Atualmente cerca de 828 milhões de pessoas sofrem de insegurança alimentar, além disso os novos hábitos de alimentação tendem a reduzir o consumo de carne, por isso há uma projeção de que a demanda por soja poderá crescer quase 5% ao ano nos próximos anos. 

Para suprir essa demanda o Brasil precisa continuar investindo em pesquisa de ponta que melhore a qualidade das sementes, dos cultivos, do solo e minimize os impactos ambientais promovidos pela soja. A biotecnologia irá continuar contribuindo com esse desenvolvimento.

Perfil de Jennifer
Texto revisado por Darling Lourenço e Fabiano Abreu

Cite este artigo:
MEDRADES, J. P. Biotecnologia brasileira: a importância da Embrapa para o cultivo de soja nacional. Revista Blog do Profissão Biotec. V. 10, 2023. Disponível em: <https://profissaobiotec.com.br/biotecnologia-brasileira-importancia-embrapa-cultivo-soja-nacional/>. Acesso em: dd/mm/aaaa.

Referências:

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EMBRAPA. História da soja. Disponível em: <https://www.embrapa.br/soja/cultivos/soja1/historia>. Acesso em: 12/10/2023.
DALL’AGNOL, A. A Embrapa soja no contexto do desenvolvimento da soja no Brasil. Disponível em: <https://ainfo.cnptia.embrapa.br/digital/bitstream/item/142568/1/Livro-EmbrapaSoja-desenvolvimento-BR-OL.pdf>. Acesso em: 12/10/2023.\
EQUIPE MAIS SOJA. Duração do ciclo de desenvolvimento de soja em cultivar com e sem Período Juvenil Longo. Disponível em: <https://maissoja.com.br/duracao-do-ciclo-de-desenvolvimento-de-soja-em-cultivar-com-e-sem-periodo-juvenil-longo/#:~:text=Durante%20a%20d%C3%A9cada%20de%2070,Per%C3%ADodo%20Juvenil%20Longo%20(PJL)>. Acesso em: 12/02/2023.
ALMEIDA, L. A. et al. Melhoramento da soja para regiões de baixas latitudes. Recursos Genéticos e Melhoramento de Plantas para o Nordeste Brasileiro. Disponível em: <http://www.cpatsa.embrapa.br/catalogo/livrorg/sojamelhoramento.pdf>. Acesso em: 12/02/23.
EMBRAPA. Tecnologias de Produção de Soja – Região Central do Brasil 2014. Sistemas de produção 16. out, 2013. Disponível em: <https://ainfo.cnptia.embrapa.br/digital/bitstream/item/95489/1/SP-16-online.pdf>. Acesso em: 12/02/23.
Fonte da imagem destacada: unsplash.

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