Saiba mais sobre a técnica que vem se tornando uma das alternativas para o desenvolvimento de um mundo mais sustentável - a produção de carne cultivada em laboratório.

Evidências científicas indicam que os ancestrais humanos começaram a incorporar carne em suas dietas há mais de 2,6 milhões de anos. Isso nos mostra que o consumo de carne, principalmente a vermelha, está enraizado em nossa cultura desde os primórdios da sociedade.

Após a primeira revolução agrícola, há aproximadamente 11 mil anos atrás, a domesticação de animais como galinhas, ovelhas, porcos e bois permitiu a transição de muitas culturas humanas para o assentamento, ao invés de um estilo de vida de caça e coleta. Isso tornou possível que as comunidades sustentassem populações cada vez maiores e permitiu seu desenvolvimento. Atualmente, o cultivo de carne em laboratório vem mais uma vez revolucionando esta área.

Pasto de uma fazenda
Atualmente, o Brasil produz 10,32 milhões de toneladas de carne bovina, sendo, assim, um dos maiores exportadores do mundo. #Paratodosverem: A fotografia mostra o pasto de uma fazenda que possui diversas vacas. Há uma árvore na esquerda da fotografia e um galpão contendo feno em seu interior. Fonte: Wikimedia.

Segundo a Organização das Nações Unidas para a Alimentação e Agricultura (FAO), a demanda por proteína animal irá aumentar exponencialmente nos próximos 40 anos. A estimativa exata é que a produção de carne global se expandirá em 40 milhões de toneladas em 2029, chegando à incrível marca de 366 milhões de toneladas neste mesmo ano. No entanto, atualmente, esse crescimento não é nada sustentável.

Sustentabilidade x Pecuária

Muitos estudos comprovam que a pecuária tradicional vem promovendo o desgaste ambiental tanto diretamente quanto indiretamente. 

Em primeira instância, a produção de gado de corte contribui para o agravamento das alterações climáticas, pois, geralmente, promove a liberação descontrolada de metano na atmosfera. Esse gás é um dos principais agravadores do efeito estufa e é gerado a partir do  esterco e liberações gastroentéricas provindas desses animais.

Além disso, quando o problema é observado de uma forma mais ampla, consegue-se identificar que a pecuária é uma das atividades que promove um alto consumo de água. Segundo um estudo publicado na BioScience, o consumo de água na pecuária se encontra em uma faixa de 34-76 trilhões de litros por ano, quando é somado o cultivo de grãos destinado à produção de ração e a demanda direta dos bichos.

Processo de Produção da Carne cultivada

Devido a todos esses problemas, cientistas de todo o mundo vêm trabalhando para desenvolver uma alternativa à carne convencional. Conhecido como cultivo de carne, este processo ganhou bastante foco nos últimos anos, principalmente devido a ONGs e iniciativas protetoras do meio ambiente, que atuam fomentando campanhas com o objetivo de alertar sobre os perigos da pecuária extensiva.

Garrafas de cultivo em uma estufa
Os frascos de cultura são amplamente utilizados para cultivar células em um meio necessário para que elas cresçam. #Paratodosverem: A fotografia possui diversas garrafas de cultivo em uma estufa. Elas apresentam um meio líquido de cor vermelha. Há também placas de 6 poços contendo a mesma substância. Fonte: Prolab.

A primeira aparição comercial deste tipo de alimento ocorreu em 2013, quando o cientista holandês Mark Post desenvolveu um hambúrguer produzido a partir de proteínas feitas em laboratório. Apenas dois anos depois, as primeiras indústrias voltadas para esse ramo foram fundadas e hoje esse mercado já recebeu mais de 450 milhões de dólares em investimento. No Brasil, a BRF é uma das principais companhias do ramo.

A carne cultivada ou carne artificial é produzida totalmente em laboratório. Utilizando técnicas de bioengenharia, o alimento é produzido a partir de células animais que são retiradas do tecido muscular de um animal vivo de forma indolor. Com isso, pode-se reduzir o número de abates para alimentação, criando, assim, um ambiente mais ético e sustentável.

O processo de cultivo envolve diversas etapas delicadas e necessita de extremo cuidado para que não haja nenhuma mudança brusca que possa afetar o crescimento das células. Após a aquisição, as células anteriormente citadas são inseridas em biorreatores para que possam experimentar um ambiente similar ao corpo do animal. Então, elas são alimentadas com um meio de cultura rico em oxigênio e composto de nutrientes básicos, como aminoácidos, açúcares, vitaminas e sais.

Com isso, as células diferenciadas são então preparadas e embaladas em produtos finais. Espera-se que esse processo leve de 2 a 8 semanas, dependendo do tipo de carne que está sendo cultivada. Algumas empresas estão adotando uma estratégia semelhante para criar leite e outros produtos lácteos.

O futuro desta tecnologia

O futuro desta técnica de produção de alimentos ainda precisa ser bastante discutido. Ela traz consigo diversas vantagens para os consumidores tais como: eliminação da presença de Escherichia Coli nas carnes e da contaminação por antibióticos utilizados no gado. Além disso, os níveis de gordura e colesterol nestes alimentos podem ser totalmente controlados, o que evita possíveis problemas de saúde causados pelo alto nível dessas substâncias no sangue.

Bacilos de cor azul aglutinados
Fotografia pode-se observar bacilos de cor azul aglutinados no centro. Fonte: Wikimedia.

Entretanto, apesar de parecer inicialmente uma ótima saída, o cultivo de alimentos em laboratório ainda precisa passar por diversos aperfeiçoamentos para que seja completamente implementado. Isso deve-se ao fato de que, atualmente, para manter as células livres de contaminações, é gerado uma grande quantidade de resíduos plásticos, já que estes geralmente garantem os níveis de esterilidade necessários nas salas de cultivo.

Outro impacto ambiental causado pelo uso desta técnica provém da esterilização de materiais feitos de vidro e de aço inoxidável. Para que sejam limpos corretamente, esses instrumentos precisam ser lavados com detergentes ou passar por câmaras de vapor, que utilizam grandes quantidades de energia para atingir altas temperaturas.

Além disso, o custo de implementação desta técnica ainda é bastante elevado. Isso porque, como exposto acima, a produção em laboratório exige a utilização de diversos equipamentos e materiais para que se possa cultivar as células da melhor forma possível. Esse tema é melhor abordado neste texto do PB (Carne de laboratório: realidade ou promessa?).

Alguns protótipos de carne cultivada saborosos e atraentes foram criados, incluindo bolinhos de camarão, salsichas de porco, nuggets de frango e tiras de bife. No entanto, essa técnica, apesar de possuir um futuro aparentemente muito promissor, ainda necessita ser bastante estudada e discutida para que possa chegar aos supermercados e centros de distribuição.

Texto revisado por Jennifer Medrades e Ísis V. Biembengut

Cite este artigo:
ENRICI, A. W. Carne Cultivada em Laboratório: Um possível caminho para um mundo mais sustentável. Revista Blog do Profissão Biotec, v.9, 2022. Disponível em: <https://profissaobiotec.com.br/carne-cultivada-laboratorio-possivel-mundo-mais-sustentavel/>. Acesso em: dd/mm/aaaa.

Referências:

BAKER, Aryn. Cultivated Meat Passes the Taste Test. Disponível: https://time.com/6140206/cultivated-meat-passes-the-taste-test/. Acesso em: 28/04/2022.
FERNÁNDEZ, Clara. Cultured Meat Is Coming Soon: Here’s What You Need to Know. Disponível em: https://www.labiotech.eu/in-depth/cultured-meat-industry/. Acesso em: 26/04/2022.
ROGERS, Kate. Lab-grown meat could make strides in 2022 as start-ups push for U.S. approval. Disponível: https://www.cnbc.com/2022/01/23/lab-grown-meat-start-ups-hope-to-make-strides-in-2022.html. Acesso em: 26/04/2022.
Fonte da imagem destacada: Wikimedia.

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