De fácil obtenção, a polpa do dente de leite possui uma grande concentração de células-tronco jovens e proliferativas, que possuem a capacidade de se transformarem em várias outras células. Essa biotecnologia é mais uma esperança no tratamento de diversos tipos de doenças.
Mas o que são células-tronco?
Células-tronco são células capazes de autorrenovação e diferenciação em muitas categorias de células. Elas podem se dividir e se transformar em outros tipos de células, além de serem programadas para desenvolver funções específicas, tendo em vista que ainda não possuem uma especialização celular.
São três os principais tipos de células-tronco: as embrionárias e as adultas são advindas de fontes naturais. Já as células induzidas, são obtidas por cientistas em laboratório.
As células embrionárias, ou pluripotentes, possuem a capacidade de se transformar em qualquer tipo de célula adulta. Elas são encontradas no embrião, apenas quando este se encontra no estágio de blastocisto (4 a 5 dias após a fecundação).
Na fase adulta, as células-tronco encontram-se, principalmente, na medula óssea e no sangue do cordão umbilical, mas cada órgão do nosso corpo possui um pouco delas para renovarem as suas células ao longo da nossa vida. Elas podem se dividir para gerar uma célula nova ou outra diferenciada e são chamadas de multipotentes, por serem menos versáteis que as embrionárias.
As primeiras células-tronco humanas induzidas foram produzidas em 2007. O processo se dá através da inserção de 4 genes associados à desdiferenciação dessas células (os fatores de transcrição OCT4, SOX2, NANOG e LIN28). Estes genes se inserem no DNA da célula adulta e reprogramam o código genético. Com este novo programa, as células voltam ao estágio de uma célula-tronco embrionária e possuem características de autorrenovação e capacidade de se diferenciarem em qualquer tecido. Estas células são chamadas de células-tronco de pluripotência induzida (iPS).
As pesquisas com células-tronco buscam, essencialmente, encontrar maneiras de reverter doenças e/ou desenvolver terapias que retardem alguns processos. Em razão da capacidade de diferenciação dessas células, espera-se conseguir, por exemplo, recuperar pessoas paralisadas, criar tecidos para transplantes, deter o avanço de doenças degenerativas e, mais ainda, encontrar a sua cura.
Como funciona a terapia com essas células?
A terapia celular é caracterizada pela troca de células doentes por células novas e saudáveis, e este é um dos possíveis usos para as células-tronco no combate a doenças. Em teoria, qualquer doença em que houver degeneração de tecidos do nosso corpo poderia ser tratada através da terapia celular.
As células-tronco do cordão umbilical são retiradas logo no início da vida da criança, e são conhecidas como células-tronco hematopoiéticas. São capazes de se diferenciar em hemáticas, leucócitos e plaquetas. Estas células já são utilizadas no transplante de medula óssea, por exemplo, no tratamento de anemias, linfomas e leucemias.
Dentre as fontes de células-tronco adultas, a polpa do dente de leite tem se destacado mais recentemente pelo fato de fornecer células-tronco mesenquimais multipotentes e imuno compatíveis, isto é: elas podem servir não só ao doador, mas também a toda sua família.
A polpa do dente é uma pequena massa de tecido vivo, composta de vasos sanguíneos, nervos e células-tronco. Essas células são denominadas células-tronco mesenquimais multipotentes, o que significa que elas têm a capacidade de se transformar em uma variedade de tipos de células, como miócitos (tecido muscular); neurônios (tecido nervoso); osteócitos (reparação de ossos); condroblastos (cartilagem); células epiteliais (pele e da superfície ocular) e entre outros.
Como obter células-tronco do dente de leite?
A obtenção da polpa do dente de leite é um processo não invasivo e que pode ser feita durante o período de troca dos dentes da criança, entre os 5 e 12 anos. Essas células-tronco são células jovens e de excelente qualidade e quantidade, portanto, ótimas para um futuro tratamento de doenças degenerativas.
No entanto, não é indicado aproveitar as células-tronco de um dente de leite que já caiu. Quando o dentinho cai, ele entra em contato com bactérias e deixa de receber sangue, o que pode causar a morte das células. Por determinação do Conselho Federal de Odontologia e da Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa), o dente deve ser extraído por um dentista credenciado a um Centro de Tecnologia Celular.
Para coleta das células-tronco, os pais devem procurar o dentista assim que o dente começar a amolecer. O profissional irá fazer a consulta para identificar qual o melhor dentinho a ser extraído, que deve conter ainda um terço da raiz. Um único dente de leite, já é suficiente para armazenar a quantidade necessária de células-tronco, com qualidade.
No laboratório, as células-tronco serão extraídas da polpa e multiplicadas, além de passarem por diversos testes que comprovem sua aplicabilidade, quando e se necessário. O material, então, será armazenado em tanques de nitrogênio líquido a -196 ºC.
Outras utilidades para os dentes perdidos
“É difícil ter a compreensão de que o dente é um órgão. E assim como o rim, o coração ou os olhos, não deve ser descartado no lixo. As faculdades recebem essas doações, usadas para pesquisa e estudo. A Faculdade de Odontologia da Universidade de São Paulo (FOUSP) foi pioneira no Banco de Dentes Humanos e recebe doações de diferentes locais do Brasil. Hoje a coleção é de, aproximadamente, 10 mil peças.” diz a especialista Márcia Marques, responsável pelo Laboratório de Pesquisa Básica do Departamento de Dentística da FOUSP em entrevista ao Portal Terra.
A Faculdade iniciou uma arrecadação de dentes de todos os tipos para serem utilizados em pesquisas científicas. A divulgação está sendo feita através da campanha “O Endereço da Fada do Dente”, em que a fadinha revela que mora na FOUSP e espera receber os dentes via correios.
No site da campanha há um campo para o doador se cadastrar e receber em sua casa um envelope já selado para o envio dos dentes, de qualquer parte do Brasil. É necessário também assinar uma autorização de utilização dos dentes para fins de pesquisa.
As ações da campanha buscam mostrar que, ao invés de deixar o dente de leite embaixo do travesseiro para a Fada trocar por dinheiro, guardá-los como recordação, jogar em cima do telhado ou ir para o lixo, pais e filhos podem ajudar a ciência com suas doações.
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Cite este artigo:
MELLO, L.P.S. Para além da fada do dente: Células-tronco obtidas a partir da polpa do dente de leite. Blog do Profissão Biotec, v.8, março/2021.