O aumento da demanda das grandes commodities como soja, milho e algodão favoreceu o plantio sucessivo das culturas e aumentou o número de pragas associados às lavouras, principalmente insetos, comprometendo a produtividade. Neste cenário, a biotecnologia verde usada em plantas transgênicas apresenta-se como uma alternativa promissora, pois as torna resistentes aos ataques dos herbívoros-alvo da tecnologia e reduzem a necessidade de aplicação de inseticidas.
As plantas são constantemente expostas a estresses bióticos (doenças, ataque de herbívoros) e abióticos (longos períodos de estiagem, falta de nutrientes, acidez do solo, concorrência de recursos com ervas daninhas). Ácaros e lagartas, por exemplo, utilizam tecidos vegetais como local de cópula e fonte de nutrientes. Você poderia pensar: “as plantas são seres sésseis, portanto não possuem capacidade para se defender”. Errado!
As plantas desenvolveram vários mecanismos de defesa. Um dos tipos é a defesa constitutiva, sendo caracterizada pela presença de estruturas nas plantas (pelos, tricomas e espinhos), as quais dificultam o acesso e a manipulação dos tecidos vegetais pelos herbívoros. Com a utilização de técnicas de biotecnologia foi possível incrementar as defesas constitutivas por meio do desenvolvimento das plantas transgênicas, com a inserção de genes que conferem toxicidade contra herbívoros-alvo.
Outro tipo de defesa é a induzida, que pode ser direta ou indireta. As defesas induzidas diretas somente são ativadas após o ataque do inseto na planta. Esta passa a produzir fitoalexinas (compostos repelentes de herbívoros) e inibidores de proteases (substâncias químicas que inibem a ação de enzimas que degradam as proteínas ingeridas pelos insetos), afetando diretamente a sobrevivência, a reprodução e o desenvolvimento dos mesmos. Na defesa induzida indireta, a planta produz compostos voláteis que servem de pistas químicas para atrair inimigos naturais dos insetos (Figura 1). Estes compostos são conhecidos como aleloquímicos, pois medeiam a interação entre espécies diferentes (planta e insetos).
Figura 1: Esquema de efeitos biológicos e interações de compostos orgânicos voláteis (COV) e néctar extrafloral (EFN). A alimentação pelo herbívoro induz a defesa indireta, com a síntese de ácido jasmônico (AJ) e de vários COV, como o acetato de Z-3-hexenil e o metilsalicilato (MeSA). Os COVs atraem, então, vespas parasitas, formigas e ácaros predadores, mediados por interações tritróficas. Fonte: Traduzida de Heil (2007).
Você pode estar se perguntando: “Mas como as plantas reconhecem qual inseto a está atacando? Como elas acionam essas rotas de defesa?” Bem, os insetos possuem elicitores em sua saliva, os quais variam de acordo com o tipo de aparelho bucal de cada herbívoro. Insetos desfolhadores, como lagartas, possuem aparelho bucal mastigador e acionam majoritariamente a rota do ácido jasmônico (composto desencadeador de defesa). Insetos como os pulgões, que possuem aparelho bucal picador-sugador, acionam preferencialmente a rota do ácido salicílico.
Conforme explicado anteriormente, plantas transgênicas possuem defesas constitutivas contra insetos alvo. Sabemos que elas são atacadas por vários insetos ao mesmo tempo. Mas e os que não são alvos? Eles são afetados pela tecnologia? Será que a transgenia interfere nas defesas induzidas? O que acontece com plantas que estão sendo atacadas por múltiplos herbívoros com aparelhos bucais distintos?
Estou colocando pulgas atrás da sua orelha. Este é o enigma: decifra-me ou devoro-te! O objetivo deste texto foi confrontá-lo, prezado leitor. Quer aprender mais sobre biotecnologia? Acompanhe as nossas publicações para saber mais.
REFERÊNCIAS
DICKE, M.; LOON, J.J.A. van; SOLER, R. Chemical complexity of volatiles from plants induced by multiple attack. Nature chemical biology, v. 5, n. 5, 2009.
HEIL M., SILVA BUENO J.C. Within-plant signaling by volatiles leads to induction and priming of an indirect plant defense in nature. Proceedings of the National Academy of Science, 104: 5467–5472, 2007.
KAPLAN, I. & DENNO, R.F. Interspecific interactions in phytophagous insects revisited: a quantitative assessment of competition theory. Ecol. Lett. 10, 977–994, 2007.
KESSLER, A.; BALDWIN, I.T. Plant–mediated tritrophic interactions and biological pest control. AgBiotechNet, 4: 1–7, 2002.
SCHALLER, A. (ed.) Induced Plant Resistance to Herbivory, Springer, Berlin, 2008.
SMITH, C. M. Plant resistance to arthropods: molecular and conventional approaches. Dordrecht: Springer, 423 p., 2005.
ZHU, J.; PARK, K.C. Methyl salicylate, a soybean aphid-induced Plant volatile attractive to the predator Coccinella septempunctata. Journal of Chemical Ecology, Vol. 31, No. 8, 2005.