Igualdade, inclusão e corporativismo de gênero na ciência. Um assunto que foi muito velado no mundo da ciência. Descubra os movimentos em prol d’Elas na Ciência.

O documentário Elas na ciência, da Netflix, aborda assuntos que foram velados durante muitos anos na ciência: desigualdade de gênero, assédio e inclusão.

Três cientistas americanas contam sobre suas trajetórias marcadas por tais situações, onde aprenderam a lutar pela causa para mudar o cenário atual de uma América corporativa e corporativista.

Apesar dos crescentes movimentos sobre as causas que geram a lacuna de gênero na ciência e dos esforços para adoção de políticas públicas de apoio que equalizam essas diferenças (causadas também pela maternidade), as mulheres ainda estão sub-representadas na academia, especialmente nos campos STEM (ciência – do inglês “science”-, tecnologia, engenharia e matemática).

foto de capa do documentário Elas na ciência da Netflix
Foto de capa do documentário Elas na ciência da Netflix #Paratodosverem: Cientista mulher, negra, de jaleco branco, luvas azuis, óculos de segurança, trabalhando no laboratório. Fonte: Netflix.

No Brasil: movimento Parent in Science

O movimento Parent in Science foi fundado em 2016 por Fernanda Staniscuaski, pesquisadora da Universidade Federal do Rio Grande do Sul (UFRGS). 

O movimento tem como missão: 

“mudar a forma como a parentalidade, mais especificamente, a maternidade é percebida na academia, e lutar por um ambiente científico mais igualitário, diverso e justo. Promovemos a discussão sobre os impactos da maternidade na carreira acadêmica das cientistas no Brasil e incentivamos o desenvolvimento de políticas de apoio às mães cientistas, levando em consideração a intersecção com raça e todos os demais aspectos que impactam a maternidade

Além disso, as ações do movimento são apoiadas em evidências construídas pela geração de dados baseadas em um referencial teórico consistente. 

Confira a entrevista com a líder do movimento parent in Science no nosso canal do You Tube 

Efeitos da pandemia

Durante a pandemia da COVID-19 muitas mães cientistas têm experimentado dificuldades em conciliar o trabalho remoto e as demandas domésticas com sua produtividade acadêmica. Em 2020 foi publicada uma carta na Revista Science relatando que acadêmicas negras e mães têm encontrado dificuldades em enviar trabalhos e cumprir com os prazos de submissão durante este período. 

Um estudo recente revelou que os acadêmicos do sexo masculino – especialmente aqueles sem filhos – são o grupo menos afetado. E a proporção de mulheres sem filhos que enviaram manuscritos foi maior do que a de mulheres com filhos. Houve uma associação negativa entre mulheres cuja idade dos filhos variava de 1 a 6 anos e a submissão de manuscritos.

Segundo esse estudo, essa disparidade exacerbada durante a pandemia reflete a desigualdade histórica entre as carreiras de homens e mulheres. Além de criar um referencial teórico importante para orientar políticas públicas de auxílio às mães na área acadêmica.

Desta forma, agências de fomento devem instituir políticas mais flexíveis para proporcionar uma ciência mais justa para todos afetados pela pandemia.

Programa Amanhã 

Baseado nas evidências científicas, o movimento Parent in Science se uniu para criar o Programa Amanhã: uma campanha de financiamento coletivo de apoio financeiro às mães. O programa tem por objetivo diminuir as chances da pandemia contribuir para a evasão de alunas dos cursos de pós-graduação, na sua maioria mães, mulheres negras ou indígenas e mães solo.

Iniciativas para incentivar a redução da lacuna de gênero

A seguir, vamos conhecer algumas iniciativas para reduzir a lacuna de gênero e reconhecer o papel das mulheres na ciência

1- Maternidade no Lattes

Atualmente, o CNPq incluiu oficialmente na plataforma Lattes o campo “Licenças”, onde é possível adicionar o período de licença-maternidade. Após quase três anos de negociações pelo Parent in Science, este marco na história oferece a possibilidade de um fator de correção para equalizar uma avaliação mais justa da produtividade das mães.

O estudo revelou que a produtividade científica é reduzida pela licença-maternidade, que no Brasil varia de quatro a seis meses, afetando a competitividade das mulheres por alguns anos após o nascimento de um filho. 

O movimento Parent in Science foi vencedor do prêmio NATURE PARA MULHERES INSPIRADORAS NA CIÊNCIA, 2021.

2- Para Mulheres na Ciência

O programa “Para Mulheres na Ciência” tem o objetivo de promover e reconhecer a participação da mulher na ciência, favorecendo a igualdade de gênero. Realizado pela L’Oréal, UNESCO no Brasil e pela Academia Brasileira de Ciências (ABC), o prêmio oferece uma bolsa-auxílio de 50 mil reais para cada uma das 7 vencedoras a fim de que elas possam dar prosseguimento aos seus estudos.

As áreas contempladas são as Ciências da Vida, Ciências Físicas, Ciências Químicas e Matemática.  

Para participar da edição de 2021, é preciso que a candidata tenha concluído o doutorado a partir de janeiro de 2014. Para mulheres com um filho, o prazo se estende por mais um ano e, para quem tem dois ou mais filhos, o prazo adicional será de dois anos. Além disso, a cientista deve ter residência no Brasil, desenvolver projetos de pesquisa em instituições nacionais, entre outros requisitos. 

3- Prêmio Mulheres na Ciência Amélia Império Hamburger

Amélia Império Hamburger (1932-2011), graduada em física, professora, pesquisadora e divulgadora científica brasileira, foi uma das cientistas pioneiras na área. 

A Câmara dos Deputados aprovou em julho de 2021 o Projeto de Resolução 9/21: o Prêmio Mulheres na Ciência Amélia Império Hamburger. A premiação será concedida pela Câmara dos Deputados a três cientistas brasileiras  que se destacarem por suas contribuições para a pesquisa científica nas áreas de ciências exatas, ciências naturais e ciências humanas. 

Amélia Império Hamburger
#Paratodosverem: Foto da cientista Amélia Império Hamburger. Uma idosa com cabelos grisalhos e óculos de grau com grande sorriso. Fonte: O explorador.

4- Incentivo ao Empreendedorismo feminino

Um outro campo onde a desigualdade de gênero permanece está ligado ao empreendedorismo. Baseado nisso, alguns programas surgiram com o objetivo de promover o aumento da representatividade feminina no cenário empreendedor nacional, através de capacitações e mentorias, impulsionando negócios com a presença de mulheres em sua fundação e/ou em cargos de liderança.

Podemos citar alguns desses programas:

programas de incentivo ao empreendedorismo feminino
#paratodosverem: programas de incentivo ao empreendedorismo feminino. Ela empodera escrito em laranja e roxo. Ao lado foto de mulher negra com terno laranja de braços cruzados representando o programa Mulheres Inovadoras 2021. Ao lado esquerdo da imagem duas mulheres, uma branca e uma negra sorrindo, ambas de camisa branca representando o programa DELAS, do Sebrae. À direita escrita do programa Ella’s Mulher Inovadora em azul e abaixo imagem de mulher branca, cabelos cacheados ruivos com sorriso no rosto e blusa estampada florida amarela e azul marinho, do programa da Google.

Outros programas de empreendedorismo inovador com apoio do Governo Federal para criar sua Startup, receber capacitação e se conectar com o mercado de trabalho podem ser encontrados no portal Startup Point.

Representatividade na Ciência

Recentemente a companhia de brinquedos Mattel prestou homenagem às cientistas que atuaram de forma decisiva e inovadora no combate à COVID-19. 

A empresa lançou uma nova coleção composta de 6 bonecas Barbies, cada uma delas fazendo referência a uma profissional, incluindo a biomédica brasileira Jaqueline Góes de Jesus, que fez parte da equipe responsável pelo sequenciamento genético do novo coronavírus logo após os primeiros casos da doença no Brasil.

Barbies em homenagem a mulheres cientistas
Da esquerda para direita: a médica americana Audrey Cruz, atuante da linha de frente em Las Vegas e conhecida por sua luta contra a discriminação; Jaqueline Goés de Jesus, biomédica brasileira resposável pelo sequenciamento genético do novo coronavírus; Kirby White, médica australiana que ajudou a criar um avental cirúrgico reutilizável para trabalhadores da linha de frente da pandemia;  Sarah Gilbert, britânica que liderou a criação da vacina Oxford-AstraZeneca; Chika Stacy Oriuwa, psiquiatria canadense que atua contra o racismo sistêmico na área da saúde e a enfermeira Amy O’Sullivan, que tratou do primeiro paciente com COVID-19 no Hospital Wycoff, no Brooklyn (Nova York). Fonte: Mattel/Divulgação

Como podemos perceber, apesar da grande contribuição científica, as mulheres  ainda pertencem ao grupo de minoria com bolsas de produtividade do CNPq e em posições de destaque nas carreiras. O Brasil possui algumas iniciativas bem recentes para reduzir a disparidade entre homens e mulheres, especialmente as negras, na ciência. Sabemos que esse movimento ainda é tímido. A falta de apoio institucional e de um ambiente receptivo para as jovens pesquisadoras, muitas delas divididas entre os encargos da maternidade e da carreira, são frequentemente apontadas como obstáculos significativos. Precisamos divulgar e apoiar o desenvolvimento de políticas públicas em prol da igualdade de gênero baseada em dados científicos de forma a criarmos ambientes propícios e receptivos para a progressão na carreira científica da mulher e de jovens pesquisadoras.

Conheça mais sobre o assunto em: Mulheres inspiradoras: conheça pesquisadoras brasileiras que contribuíram para o avanço da ciência no Brasil e no mundo.

Texto revisado por Darling Lourenço e Isis Venture

Cite este artigo:
LOPES, I. G. Elas na ciência. Revista Blog do Profissão Biotec, v.9, 2022. Disponível em:<https://profissaobiotec.com.br/elas-na-ciencia/>. Acesso em: dd/mm/aaaa.

Referências:

Areas, Roberta.; et al. Gender and the Scissors Graph of Brazilian Science: From Equality to Invisibility. OSF Preprints, 29 June 2020. Web.Disponível em: https://osf.io/m6eb4. Acesso em 09 de agosto de 2021.
Governo do Brasil. Startup Point — Português (Brasil). Gov.br, 2021. Disponível: <https://www.gov.br/startuppoint/pt-br> Acesso em 10 de agosto de 2021.
Kimberlee A. Shauman, 2017. Gender Differences in the Early Employment Outcomes of STEM Doctorates. Social Sciences, MDPI, Open Access Journal, vol. 6(1), pages 1-26, March. Disponível em: https://www.mdpi.com/2076-0760/6/1/24/pdf. Acesso em 09 de agosto de 2021.
Machado, L.S.; et al. 2019. Parent in science: The impact of parenthood on the scientific career in Brazil. Proceedings of the 2nd International Workshop on Gender Equality in Software Engineering: 37-40. Disponível em: https://dl.acm.org/doi/10.1109/GE.2019.00017. Acesso em 9 de agosto de 2021.
Staniscuaski, F. et al. 2020a. Impact of Covid-19 on academic mothers. Science 368: 724. Disponível em: http://pesquisa.uff.br/sites/default/files/science_parent_in_science.pdf. Acesso em 9 de agosto de 2021.
Staniscuaski, F.; et al. 2020b. Gender, race and parenthood impact academic productivity during the COVID-19 pandemic: from survey to action. Front. Psychol., 12 May 2021. Disponível em: https://www.frontiersin.org/articles/10.3389/fpsyg.2021.663252/full. Acesso em 9 de agosto de 2021.
Unesco. UNESCO, L’Oréal e Academia Brasileira de Ciências lançam 16ª edição do programa Para Mulheres na Ciência. Unesco.org, 2021. Disponível em: <https://pt.unesco.org/news/unesco-loreal-e-academia-brasileira-ciencias-lancam-16a-edicao-do-programa-mulheres-na-ciencia> Acesso em 9 de agosto de 2021.
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