Nos últimos anos a bioinformática e o bioinformata vêm sendo mais conhecidos. Mas o que faz e onde trabalha o bioinformata?

Aqui no Profissão Biotec já publicamos diversos materiais abordando a bioinformática e o bioinformata. Já mostramos algumas formas de você ter a formação de um bioinformata e, em diversos textos, mostramos aplicações práticas da bioinformática na pesquisa científica. Para ler esses textos, acesse  neste link a categoria Bioinformática do site do Profissão Biotec.

Porém, ainda não focamos especialmente nas características de um bioinformata e em quais nichos do mercado de trabalho ele pode se encaixar.  Por esse motivo, os próximos parágrafos se concentraram em contextualizar e descrever as características do profissional de bioinformática , além de elencar os locais de trabalho em que ele  se encaixa.

O que é bioinformática?

O termo bioinformática apareceu pela primeira vez em um artigo holandês de 1970, escrito por Ben Hesper e Paulien Hogeweg. Na época, o termo se referia ao “estudo dos processos informáticos em sistemas biológicos”. Com o passar dos anos e, principalmente, com o Projeto Genoma Humano (PGH) (leia mais aqui!), a bioinformática construiu e consolidou o seu próprio lugar na comunidade científica.

Porém, antes mesmo do termo ter sido utilizado, a bioinformática já estava florescendo nas pesquisas da Dra. Margaret O. Dayhoff (foto abaixo), nos EUA. A Dra. Dayhoff foi uma físico-química e é considerada mãe e pai da bioinformática. O seu trabalho originou, em 1966, a primeira matriz de substituição de dados para peptídeos, a PAM (mutação pontual aceita), além de criar o código de apenas uma letra para aminoácidos, reduzindo assim o tamanho dos arquivos utilizados. Ela e sua equipe, constituída majoritariamente por mulheres, também organizaram o Atlas de Estruturas e Sequências de Proteínas, que posteriormente, iria levar à criação do Protein Information Resource (PIR).

Fotografia em preto e branco de Margaret O. Dayhoff (segunda a partir da esquerda) na inauguração do novo computador (equipamento branco, sob uma mesa, no meio dos seis pesquisadores presentes) na Fundação Nacional de Pesquisa Biomédica (NBRF) dos Estados Unidos. Fonte: Strasser, B. J., 2011. 

Uma definição bem completa da bioinformática é fornecida pelo Glossário de Termos Genéticos do Instituto de Pesquisa do Genoma Humano (NIH) (EUA): “Bioinformática é uma subárea da biologia e da ciência da computação que se preocupa com a aquisição, armazenamento, análise e disseminação de dados biológicos, na maioria das vezes sequências de DNA e aminoácidos. A bioinformática usa programas de computador para uma variedade de aplicações, incluindo a determinação de funções de genes e proteínas, estabelecimento de relações evolutivas e previsão das formas tridimensionais das proteínas” (texto em tradução livre).

É importante ressaltar que além dos conhecimentos em biologia e ciência da computação, o bioinformata (profissional em bioinformática) também precisa possuir conhecimentos matemáticos, como estatística e probabilidade. Sendo assim, o bioinformata é o profissional da bioinformática, assim como o biotecnologista é da biotecnologia e o biólogo é da biologia. Mas diferentemente dos dois últimos, não há um curso de graduação específico em bioinformática. A seguir, serão apresentadas as formações necessárias para se tornar um bioinformata.

Existe graduação em bioinformática?

Até o momento, não existem cursos de graduação exclusivos em binformática. É possível começar na bioinformática e ser bioinformata desde a graduação, cursando disciplinas e realizando estágios que te capacitem para atuar nessa área. Dessa forma, independente do seu título, você pode atuar em bionformática. A Universidade Federal do Rio Grande do Sul (UFRGS) possui um curso de biotecnologia com habilitação em bioinformática.

 Outra possibilidade, é conquistar os títulos acadêmicos de mestre e doutor em Bioinformática por diversos programas de pós-graduação no Brasil, como o da Universidade de São Paulo (USP) e da Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG), entre outros. Para ingressar em um programa de pós-graduação em Bioinformática, o aluno pode ser oriundo tanto de cursos de ciências exatas quanto de ciências biológicas. Porém, o foco das disciplinas e dos estudos desses profissionais deve ser diferente, visando complementar os conteúdos.

Leia mais em: “Então você quer ser um bioinformata? Saiba onde estudar!”

Quais conteúdos estudar para atuar em bioinformática?

Para aqueles iniciantes na bioinformática que estão na graduação ou já são graduados em ciências exatas, como os alunos de cursos de ciências da computação, é fundamental estudar as ciências biológicas. O interessado deve passar a ler livros e materiais de biologia geral, biologia molecular, genética, ciências ômicas e evolução, dependendo da área de concentração do estudo, mas o foco principal é biologia molecular

Diferentemente do perfil anterior, os interessados em bioinformática com graduação em ciências biológicas ou biotecnologia (em andamento ou já concluída) já possuem toda a carga de conteúdos relacionados às áreas biológicas. (Mas também é muito importante que continuem se atualizando sobre os assuntos através da leitura de livros, revisões e artigos científicos!) Para aspirantes a bioinformatas da área biológicas é fundamental estudar as linguagens de programação.

Porém, o percurso até a bioinformática pode ser um pouco mais tortuoso para aqueles que não possuem facilidade com linguagens de programação. Isto porque é indispensável para esse profissional o aprendizado de lógica de programação, gerenciamento de dados, engenharia de software e linguagens de programação. Além disso, é importante que o conhecimento matemático em estatística e probabilidade seja bem sólido.

Além desses assuntos, ambos os perfis devem se dedicar a aprender o método científico e realizar a leitura de artigos científicos da área. Também é imprescindível que continue seu aperfeiçoamento em linguagens de programação, principalmente Python, Perl e R, bem como, aprofundar os conhecimentos em gerenciamento de processos e servidores.

Mais informações em relação a esses tópicos de aprendizados podem ser encontrados no blog Terabytes of Life de alunos da Unicamp que trabalham com bioinformática. Eles também dão várias indicações de cursos online que os alunos interessados podem começar a fazer! Além disso, o canal no YouTube da professora Raquel Minardi, da Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG), tem muitos vídeos interessantes sobre essa temática. 

Definição do bioinformata 

Devido à variedade de formações e de campos de trabalho que um bioinformata pode ter, as definições que envolvem a bioinformática não são muito precisas. Sendo assim, como podemos definir o bioinformata além de ser o “profissional em bioinformática”?
Essa definição ainda gera muitas polêmicas na área científica. Alguns autores defendem que o bioinformata é aquele cientista que desenvolve e conduz pesquisas baseadas em abordagens bioinformáticas, ou seja, ele não apenas usa as ferramentas, como também desenvolvem as mesmas, para compreender melhor um problema biológico.

Outros autores criaram denominações diferentes para determinar as funções do bioinformata. Por exemplo, o bioinformaticista (ou biólogo computacional) é o profissional especializado no desenvolvimento de softwares e interfaces homem-máquina que facilitam o uso eficaz dessas ferramentas. Por outro lado, o bioinformata (ou bioinformatician em inglês) é aquele com conhecimento e habilidades para a aplicação dessas ferramentas e softwares, sem necessariamente ter um conhecimento profundo sobre a sua construção lógica.

Ainda assim, a definição do que faz um bioinformata e onde o mesmo pode ser empregado não é muito conclusiva. Por esse motivo, a partir de agora abordaremos os “tipos de bioinformata”, que são os distintos perfis de bioinformata. 

Um homem bioinformata, de pele branca, cabelo raspado e barba escura rala, vestido com camisa xadrez, analisando dados de integração de DNA do papiloma vírus humano (HPV) no seu computador sob uma mesa amarela. O mesmo está localizado no Laboratório de Pesquisa Genômica do Câncer, que faz parte da Divisão de Epidemiologia e Genética do Câncer do Instituto do Câncer (DCEG), nos Estados Unidos. Fonte: Daniel Sone para o Instituto Nacional do Câncer (NCI).

Tipos de bioinformata

De acordo com este estudo da Universidade de Ohio (EUA) de 2014, que abordou as habilidades e competências exigidas para o profissional de bioinformática tanto na academia, quanto nas empresas, existem três categorias de bioinformatas: o usuário de bioinformática, o cientista de bioinformática e o engenheiro de bioinformática. Cada um possui um núcleo central de competências, mas todos compartilham habilidades e competências comuns.

Começando pelas habilidades comuns, assim como para qualquer outro profissional, é importante que o bioinformata possua uma boa administração do tempo e de projetos, que consiga trabalhar em múltiplos projetos, que apresente independência, curiosidade, criatividade, automotivação e instinto de liderança. Também é muito importante que possua pensamento crítico, dedicação e boa comunicação.

O usuário de bioinformática é o profissional especializado em utilizar as ferramentas e técnicas computacionais mais atuais. Possui um amplo conhecimento científico tanto dessas ferramentas e técnicas, quanto da função que a bioinformática desempenha, porém ele não é responsável pelo desenvolvimento dos softwares e ferramentas. Esse profissional tem o tempo bem dividido entre trabalhos na bancada e trabalhos computacionais, e utiliza muito mais softwares através de sua interface gráfica do que pelas linhas de comando.

O cientista de bioinformática é aquele que possui um amplo conhecimento de engenharia de software e é capaz de criar suas próprias pipelines em busca das respostas que precisa. Esse profissional possui apenas trabalho computacional e também utiliza muito mais a linha de comando do que as interfaces gráficas para atingir seus objetivos. Apesar do grande conhecimento em ciências da computação, o cientista da bioinformática também possui vasto conhecimento em biologia e utiliza ambos para responder às questões de pesquisa.

O engenheiro de bioinformática possui uma sólida base matemática, teoria da computação, modelos computacionais, desenvolvimento de algoritmos e linguagem de programação. O conhecimento das ciências biológicas para esse profissional não é essencial, visto que suas principais funções estão relacionadas com a escrita e desenvolvimento de algoritmos que podem ser encaixados em diversas áreas.

Mercado de trabalho para o bioinformata

E quanto ao mercado de trabalho para esses profissionais? O bioinformata é um profissional multidisciplinar e é necessário em muitos setores. Assim como os biotecnologistas e outros profissionais, o bioinformata pode seguir carreira acadêmica ou atuar no mercado de trabalho.

Na carreira acadêmica, o bioinformata pode ser mestrando, doutorando e pós-doutorando! Após a pós-graduação, também pode atuar como funcionário de uma universidade, seja pública ou privada, ministrando disciplinas e realizando pesquisa, com a responsabilidade de orientar alunos de graduação e pós-graduação em seus projetos de pesquisa. Nesse nicho, o salário varia de acordo com a formação, tempo de experiência, entre outros fatores, mas valores iniciais variam de R$3.000,00 a R$8.000,00.

Tendo em vista que o bioinformata trabalha com a análise de dados biológicos e com banco de dados, independente de ser um usuário ou um engenheiro, este profissional pode ser empregado na maioria dos setores que trabalham com esse tipo de dado. Nesse nicho, o salário médio de um bioinformata é de R$6.353,00, todos os valores foram retirados do portal Glassdoor.

O bioinformata pode trabalhar em hospitais, tais como o A. C. Camargo (SP), Hospital Israelita Albert Einstein (SP) e o Hospital de Clínicas de Porto Alegre (RS). Os hospitais citados são apenas exemplos, visto que a maioria dos hospitais que possuem algum grupo de pesquisa, necessitam de analistas para bioinformática. Além disso, instituições públicas de pesquisa, como a Fundação Oswaldo Cruz (Fiocruz) e o Centro Nacional de Pesquisa em Energia e Materiais (CNPEM), também contratam especialistas em bioinformática para atuar nas análises dos dados gerados.

Os bioinformatas também são essenciais em empresas que trabalham com medicina diagnóstica, como a Dasa e o Grupo Fleury; com análise microbiológica, como a Neoprospecta e na indústria farmacêutica, como na Bayer. Além dessas áreas, o bioinformata se encaixa também em empresas do setor industrial, do meio ambiente, de bioprocessos e muitas outras. É importante ressaltar que nem sempre o título da vaga será para “bioinformática”, por isso é essencial ler a descrição dos requisitos necessários!

Se você tem interesse em encontrar empresas de diversos setores que trabalham com biotecnologia, acesse o Mapa Biotec. A maioria das empresas de biotecnologia possuem a necessidade de um bioinformata na sua equipe.

Uma outra opção no mercado de trabalho é a criação de startups. Esse nicho é para aqueles bioinformatas que também possuem um perfil empreendedor. Cada vez mais as startups vêm recebendo o reconhecimento que merecem e abrindo o seu espaço no mercado, gerando lucros consideráveis. Um exemplo de startup em bioinformática é a APTAH Biosciences, que é especializada no desenvolvimento customizado de novas moléculas, como peptídeos, RNA interferência, entre outros. Outro exemplo é a GenMate, uma startup que oferece soluções e ferramentas para o melhoramento genético de rebanhos, através de uma plataforma de acasalamento que possui algoritmos inteligentes que projetam a progênie para cada opção de touro reprodutor.

Assim como a biotecnologia, a bioinformática é uma área multidisciplinar. Nesse sentido, muitas definições ainda são complexas e divergentes. A intenção deste texto foi contextualizar os perfis dos bioinformatas e exemplificar alguns setores de emprego, mas o vasto conhecimento do bioinformata permite que ele seja empregado em diversos ramos e não seria possível abordar todos aqui. Além disso, essa profissão cresceu muito nos últimos anos e a perspectiva é que continue crescendo ainda mais.

Darling
Texto revisado por Jennifer Medrades, Ísis Biembengut e Natália Videira

Cite este artigo:
LOURENÇO, D. A. As multifacetas do bioinformata: o perfil de um profissional interdisciplinar. Blog do Profissão Biotec, v.8, maio/2021. Disponível em: < >. Acesso em: dd/mm/aaaa

Referências:
PEREIRA, M. A. Então você quer ser um bioinformata? Saiba onde estudar! Blog do Profissão Biotec, v. 2, 2017. Disponível em <https://profissaobiotec.com.br/entao-voce-quer-ser-um-bioinformata-saiba-onde-estudar/>. 

VINCENT, A. T.; CHARETTE, S. J. Who qualifies to be a bioinformatician?. Frontiers in Genetics, v. 6, n. 164, 2015. 

VIEIRA, D. S. Bioinformata: o que é isso?. Blog do Profissão Biotec, v. 2, 2017. Disponível em <https://profissaobiotec.com.br/bioinformata-o-que-e-isso/>. 

WELCH, L. et al. Bioinformatics Curriculum Guidelines: Toward a Definition of Core Competencies. PLOS Computational Biology, v. 10, n.3, 2014, e1003496.

Fonte primeira imagem: Imagem de Jefferson Santos em Unsplash.

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