A evolução da biotecnologia na região Nordeste pelo número de publicações e pela avaliação das notas de corte no SISU

Como temos visto ao longo dos anos, a Biotecnologia encontra-se presente diariamente no nosso cotidiano, como nos cosméticos, alimentos, vacinas, fármacos, melhoramento genético, e vem ganhando cada vez mais destaque dentro da pesquisa. É uma área de atuação que já está presente nos cursos de graduação ao redor do mundo, em diversos campos diferentes.

Neste artigo, iremos avaliar a evolução da biotecnologia na região Nordeste como área de pesquisa, através do número de publicações, e como curso de graduação, através da avaliação das notas de corte no Sistema de Seleção Unificada (SISU).

A Produção Científica na Região Nordeste

No Brasil, a maior parte das produções científicas e tecnológicas são feitas por instituições públicas, como Universidades, Institutos, Fundações e Empresas. Tais atividades são de extrema importância, pois promovem desenvolvimento científico e tecnológico do país e das regiões em que estão acontecendo. As IES (Instituições de Ensino Superior) do Nordeste contribuem com 13% de pesquisas feitas no país, ficando atrás apenas das regiões Sudeste e Sul.

Dentre as 20 universidades públicas da região Nordeste, as que mais se destacam em números de publicações são: Universidade Federal de Pernambuco (UFPE), Universidade Federal do Ceará (UFC), Universidade Federal do Rio Grande do Norte (UFRN) e a Universidade Federal da Bahia (UFBA). Segundo dados da Leiden Ranking, no período entre 2015-2018, elas ocuparam as 10ª, 15ª, 17ª e 20ª posições, respectivamente, no ranking nacional de publicações de artigos científicos que englobam todas as áreas de conhecimento.

Em 2004, foi criada a Rede Nordeste de Biotecnologia (RENORBIO) com o intuito de incentivar a pesquisa, produção e aplicação da biotecnologia para atender a demanda de questões referentes à realidade econômica e cultural da região. Para isso, ela conta com um excelente programa de pós-graduação ofertado nas instituições que aderem a esse programa. Essas instituições podem ser tanto universidades quanto centros de pesquisa, como a Empresa Brasileira de Pesquisa Agropecuária (EMBRAPA) e a Fundação Oswaldo Cruz (FIOCRUZ). O programa conta com quatro linhas de pesquisas que são: biotecnologia em saúde, agropecuária, recursos naturais e biotecnologia industrial.

Há outras instituições públicas que também colaboram com a produção científica do Nordeste. Dentre elas, as mais conhecidas são a EMBRAPA, que realiza pesquisas na área agrícola e pecuária, com oito unidades, e a FIOCRUZ, que realiza pesquisas na área da saúde e possui quatro centros distribuídos na região (Tabela 1). 

Tabela 1 – Centros de pesquisa da EMBRAPA e FIOCRUZ no Nordeste. Fonte: Divulga Biotec

A Biotecnologia presente nas publicações

Avaliando os gráficos referentes ao número de publicações no Nordeste, podemos observar que cerca de 40% das publicações em todos os anos possuem alguma relação com biotecnologia, seguindo os termos descritos na Tabela 2. Também podemos observar um crescimento durante o período de 2009-2013, seguido de uma queda em 2014-2017, e uma estabilidade em 2018-2019 (Figura 1).

Figura 1 – Número de publicações científicas produzidas nas instituições de pesquisa do Nordeste Brasileiro entre os anos de 2009-2019 pelo portal SCOPUS. As barras mais escuras representam as publicações relacionadas à biotecnologia e as barras mais claras representam publicações de outras áreas. Fonte: Divulga Biotec.

Tabela 2 – Termos relacionados às publicações científicas, e seus respectivos números de publicações entre 2009 e 2019, na plataforma SCOPUS. Fonte: Divulga Biotec

Essa variação no número de publicações acompanha o orçamento dos principais fundos de pesquisa do país, que apresentou forte queda a partir do ano de 2015 (Figura 2). Como as principais instituições de pesquisa no Nordeste são as universidades públicas federais, o corte na verba de pesquisa afetou diretamente a capacidade de produção dos grupos de pesquisa e, portanto, o número de publicações.

Apesar disto, a estabilidade do número de publicações nos últimos dois anos mostra uma adaptação às novas condições; porém, para manter a tendência de crescimento, é importante que haja aumento na destinação da verba pública para a pesquisa.

Figura 2 – Valores totais previstos no Projeto de Lei Orçamentária Anual (PLOA) no período compreendido entre os anos 2000 – 2020, excluídas as reservas de contingência. CNPQ: Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico; FNDCT: Fundo Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico; CAPES: Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior; IPCA: Índice Nacional de Preços ao Consumidor Amplo.  Fonte: SIOP. Elaboração: Fernanda de Negri / Ipea

Os destaques dentro da pesquisa em biotecnologia

No Nordeste, há pesquisadores em diversos campos dentro da biotecnologia atuando nas instituições públicas. Como exemplo, podemos citar o Dr. Gúbio Soares, professor de virologia da UFBA, que foi o responsável por identificar o Zika no Brasil e atualmente vem combatendo a atual pandemia de COVID-19; e também o Dr. Demetrius Araújo, professor de bioquímica da UFPB que desenvolveu uma patente para a produção da enzima endoglucanase, que possui aplicações industriais na produção têxtil e alimentícia, a partir do bagaço da cana-de-açúcar, um resíduo da indústria sucroalcooleira.

Ao analisar a tabela referente aos termos utilizados em publicações do Nordeste (Tabela 2), observa-se que os mais utilizados estão englobados na multidisciplinaridade da Biotecnologia. Por exemplo, os termos epidemiologia, parasitologia e genética presentes em várias publicações, estão relacionados principalmente ao estudo de doenças negligenciadas e as suas consequências para a população da região. Dentre estes termos, podemos exemplificar o Trypanosoma cruzi, causador da doença de chagas, e o Aedes aegypti, vetor de transmissão de doenças virais como dengue, zika e chikungunya.

Além desses, termos como bioquímica e biologia molecular têm destaque, pois a região apresenta um grande desenvolvimento na área de alimentos,como por exemplo, pesquisas realizadas sobre as propriedades do mel extraído no Nordeste, valorizando e contribuindo para a produção regional. Simultaneamente, tem-se um constante crescimento na área de fármacos, onde o Nordeste ocupa a posição de segundo maior consumidor

Interesse em graduação em biotecnologia

Quatro faculdades públicas ofertam o curso de biotecnologia na região nordeste: Universidade Federal da Bahia, campus Salvador e campus Vitória da Conquista (UFBA), Universidade Federal do Ceará (UFC), Universidade Federal da Paraíba (UFPB) e Universidade Federal Rural do Semi-Árido (UFERSA). Não há cursos de graduação em biotecnologia na rede privada, apenas de cursos técnicos ou de áreas similares, como biomedicina. 

De acordo com os gráficos abaixo (Figura 3), percebe-se que as notas de corte primeiramente dispõem de um crescimento e depois demonstram uma certa estabilidade, com uma média geral entre 680 e 690 pontos no SISU. Esta tendência é uma consequência  propiciada pela realização de pesquisas voltadas às particularidades da região nordeste (condições socioeconômicas, clima, solo). Sendo assim, pode-se observar um crescente número nas produções científicas voltadas a estas questões, aumentando a disseminação, divulgando os profissionais do curso e gerando uma visibilidade em canais midiáticos. Graças a isso, observa-se um aumento na procura de profissões que abrangem a área da pesquisa.

Figura 3 – Notas de corte (SISU) dos cursos de graduação em biotecnologia das universidades públicas do nordeste entre os anos de 2014-2020. A = Cota racial com escola pública; B = Cota escola pública; E = Ampla concorrência; Xm = Cota até 1,5 salário mínimo. UFC = Universidade Federal do Ceará; UFPB = Universidade Federal da Paraíba; UFERSA = Universidade Federal Rural do Semi-Árido; UFBA = Universidade Federal da Bahia. Fonte: Divulga Biotec

A força da Biotecnologia no Nordeste

O nordeste brasileiro possui características únicas quando comparadas a outras regiões. Para o melhor cultivo e aproveitamento dos solos do semiárido é necessário a aplicação de tecnologias que devem ser desenvolvidas para a região, de forma a atender suas demandas. Já com relação às doenças endêmicas que acometem a população, são necessárias pesquisas para o tratamento, profilaxia e combate. Com isso, o investimento e incentivo à pesquisa voltada a solucionar os problemas inerentes a região, principalmente relacionada à biotecnologia, se tornam fundamentais para o seu desenvolvimento.

Os termos relacionados à biotecnologia estão bem presentes nas publicações regionais, sendo as universidades públicas os principais polos de pesquisa do Brasil. No entanto, a diminuição do aporte de verbas destinadas à pesquisa impacta diretamente a sua produção, e a consequente aplicação dessas pesquisas para solucionar os problemas da região.

Em geral, o aumento das notas de corte representa o aumento da visibilidade e procura dos cursos de graduação. Quanto mais profissionais qualificados, maior é o destaque dado à biotecnologia como ciência e como área de atuação.

Como pudemos demonstrar, a Biotecnologia tem-se mostrado uma área cada vez mais expressiva no Nordeste, seguindo a tendência nacional e mundial, abrangendo um mercado que movimenta bilhões de dólares anualmente. Apesar de ser uma ciência que deu origem a cursos de graduação muito recentemente no Brasil, o desenvolvimento desta área já se destaca e continua em plena expansão, em função da sua importância para o crescimento científico e econômico do país.

Texto revisado por Natália Videira e Bruna Lopes

Cite este artigo:
GARCIA, L.G.A., da COSTA, L.C.R.C, CARVALHO, S., LOUREIRO, M.B. O avanço da biotecnologia na região Nordeste. Revista Blog do Profissão Biotec, v.8, 2021. Disponível em: <profissaobiotec.com.br/o-avanco-da-biotecnologia-na-regiao-nordeste> . Acesso em: dd/mm/aaaa

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