Nos últimos tempos, a preocupação em relação ao uso de BPA em embalagens de alimentos tem crescido significativamente, mas nem tudo está tão esclarecido para o consumidor, que muitas vezes desconhece as problemáticas do que está consumindo.
O bisfenol A (ou BPA), é um composto orgânico sintético, formado por dois grupos de fenóis e uma molécula de acetona. O BPA é utilizado na produção de muitos produtos plásticos, por ser um composto transparente, forte, leve e duradouro, que confere maior resistência aos materiais. É aplicado principalmente na produção de resinas e plásticos policarbonatos, que, por sua vez, são utilizados de mamadeiras até materiais ortodônticos, lentes de óculos, CDs e cimento. O BPA também é empregado como revestimento (epóxi) interno em latas de alimentos e bebidas, para proteger esses produtos do contato direto com o metal.
Absorção do BPA pelo organismo
Há décadas estudos têm apontado diversas problemáticas do uso de BPA em embalagens alimentícias. Quando aquecido, ocorre a lixiviação (separação das moléculas a partir de uma solução aquosa) do BPA, e seus monômeros migram para o alimento, resultando em contaminação a partir dos recipientes feitos com esse plástico. Isso é preocupante, pois muitas vezes os recipientes são fervidos antes do uso, como mamadeiras, por exemplo.
O BPA é uma substância hidrossolúvel e, quando ingerido, é parcialmente eliminado pela urina. No entanto, ainda pode permanecer em circulação no sangue por algum tempo e ser acumulado pelo organismo. Vale ressaltar que o BPA já foi identificado no tecido adiposo, leite materno e líquido amniótico. Essa substância é quase onipresente em nossos corpos: um estudo realizado em 2005 indicou que mais de 95% das amostras de urina coletadas de 394 adultos de diferentes idades, locais de residência ou sexo apresentavam BPA.
Doenças associadas à ingestão de BPA
Inicialmente, foi percebida a relação entre a ingestão de BPA oriundo das embalagens alimentícias e a regulação hormonal em mamíferos. Atualmente, já está estabelecido que o BPA faz parte do grupo de compostos desreguladores endócrinos, que são compostos que mimetizam, bloqueiam ou interferem no sistema endócrino do indivíduo.
Curiosamente, essa relação foi descoberta ao acaso. O grupo de Krishnan e colaboradores (1993) percebeu, acidentalmente, que o BPA oriundo de lixiviado de frascos de policarbonato autoclavados (fervidos sob alta pressão atmosférica) era transferido para o meio de cultivo de Saccharomyces cerevisiae. Efeitos nocivos como diminuição da qualidade do esperma, diminuição das atividades sexuais e anomalias físicas nos órgãos sexuais também foram observados nos camundongos do estudo.
Atualmente, pesquisas apontam que o consumo de BPA pode gerar maior propensão para obesidade, diabetes, doenças cardíacas e problemas hepáticos. Outra grande preocupação relaciona-se ao potencial tóxico para gestantes e lactantes expostas ao BPA. Em grávidas, o BPA pode causar pré-eclâmpsia e hipertensão, que é um fator de risco para a interrupção prematura da gravidez, além de alterações hormonais que podem afetar o desenvolvimento fetal e/ou neonatal e resultar em partos prematuros.
Legislação do uso de BPA
Devido às questões apresentadas, países como China, Dinamarca, França e Canadá proibiram o uso de BPA em embalagens de alimentos. Porém, no Brasil, esse composto ainda está liberado para comercialização. Em 2011, a Procuradoria da República do Estado de São Paulo determinou que o BPA é potencialmente nocivo à vida e à saúde humana. A partir dessa determinação, a ANVISA passou a regulamentar a obrigatoriedade de que “os fabricantes informem, ostensiva e adequadamente, a presença de Bisfenol A (BPA) nas embalagens e rótulos de produtos que contenham essa substância em sua composição”.
Apesar da regulamentação, a ANVISA não considera que haja necessidade de identificação e gerenciamento sanitário de possíveis riscos relacionados à exposição ao BPA. Cabe assinalar que a produção e importação de mamadeiras que contenham BPA é proibida no Brasil, considerando a maior exposição e susceptibilidade dos bebês e crianças pequenas. A Resolução RDC n. 41/2011, vigente desde janeiro de 2012 determina a proibição do uso de materiais passíveis de liberação de BPA em mamadeiras.
Como identificar o BPA nas embalagens?
Atualmente, para que o consumidor possa identificar que a embalagem plástica possui em sua composição BPA, deve se atentar à classificação para reciclagem dessa substância. A presença do nº 7 ou nº 3 no rótulo da a embalagem pode indicar que ela contém BPA. Plásticos com classificação nº 3 são compostos de PVC (Policloreto de Vinila), que pode liberar BPA quando aquecidos. No caso de plásticos classificados como nº 7 que agrupa todos os polímeros que não se adequaram às outras 6 classificações, dentre estes os policarbonato (PC) e o polilactídeo (PLA), que podem liberar BPA. Vale ressaltar que a classificação número 6 (poliestireno), não libera BPA, porém este composto químico é considerado altamente tóxico para ingestão, devendo ser evitado.
Apesar da falta de obrigatoriedade, atualmente diversas embalagens que são livres de BPA sinalizam essa ausência. Felizmente devido à disseminação de informação, muitos consumidores tendem a evitar esses compostos, o que cria esta demanda para o mercado.
Atualmente, o mercado tem investido na utilização do bisfenol S e F (BPS e BPF). No entanto, estudos já apontam que, apesar de serem considerados menos tóxicos que BPA, seu uso em longo prazo também pode gerar efeitos nocivos. Dessa forma, é imprescindível que as corretas avaliações de toxicidade sejam realizadas, e longos estudos devem ser conduzidos para a determinação da embalagem mais segura para alimentos. Isto posto, evidenciamos a importância da informação para que o consumidor possa realizar escolhas mais conscientes, sobretudo quanto ao consumo de substâncias potencialmente tóxicas como o BPA.
Cite este artigo:
LEAL, G. C. O que é BPA e quais os perigos à saúde humana? Revista Blog do Profissão Biotec, v.9, 2022. Disponível em: <https://profissaobiotec.com.br/o-que-e-bpa-e-quais-perigos-a-saude-humana/>. Acesso em: dd/mm/aaaa.
Referências
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