A inflamação crônica do tecido adiposo é um efeito colateral gerado pela obesidade. Descubra nesse texto como ela acontece.

Quanto você pesa? Está acima do peso? Você já deve ter ouvido falar que a obesidade é um fator de risco para várias doenças, mas você sabe a razão disso? A inflamação crônica está diretamente relacionada a esses problemas. Para compreender esse fenômeno precisamos entender o funcionamento do tecido adiposo. 

Tipos de tecido adiposo

O nosso organismo é composto por diversos tecidos diferentes, cada um especializado em uma determinada tarefa (ou várias). O tecido adiposo (TA) também é assim e, dentre suas funções, serve como um órgão endócrino, produzindo alguns hormônios importantes como leptina e estrógeno e possuem células do sistema imune.

Ele é formado principalmente pelos adipócitos, células que têm a função principal de armazenar gordura. Existem dois tipos de TA,  classificados de acordo com o tipo de adipócito presente: o primeiro pode ser chamado de tecido adiposo branco, amarelo ou unilocular e o segundo é o tecido adiposo marrom ou multilocular.

Tecido adiposo branco

O tecido adiposo branco (TAB) possui adipócitos com apenas uma grande gota de gordura que ocupa quase todo o espaço do citoplasma da célula. Ele pode ser branco ou amarelo, dependendo dos carotenóides presentes na dieta da pessoa. A função do TAB é basicamente armazenar a energia em excesso na forma de triglicerídeos, os quais são a principal reserva no corpo de um humano adulto.

Tecido adiposo multilocular

Já o tecido adiposo marrom (TAM), como você pode imaginar, possui adipócitos com muitas pequenas gotículas de gordura em seu interior, e também possuem a cor marrom pela quantidade de mitocôndrias presentes no citoplasma. A função do TAM é usar a reserva de gordura para produzir calor (termogênese). Além disso, ele está presente principalmente em bebês recém-nascidos e em animais que hibernam.

Uma criança sentada ao lado de um urso de pelúcia
Bebês recém-nascidos e animais que hibernam, como ursos, possuem quantidades significativas de tecidos adiposo marrom. #ParaTodosVerem: A imagem mostra uma criança sentada ao lado de um urso de pelúcia de tamanho similar. Ambos estão sentados em um chão de madeira em um ambiente externo. Fonte: Pixabay.

Tecido adiposo bege

Além desses dois tipos, existe também o tecido adiposo bege (TABe). Ele está entranhado no interior do TAB, mas possui a mesma função do TAM de produzir calor a partir da gordura. Estes adipócitos beges são recrutados por estímulos, como exposição ao frio ou estimulação β-adrenérgica. Este último,  ocorre pela liberação de adrenalina e que irá estimular a quebra dos triglicerídeos armazenados na gota de gordura em ácidos graxos que servirão como fonte de energia para produzir calor dentro das mitocôndrias da célula. Ademais, a atividade dos adipócitos beges está relacionada ao controle da obesidade e ao bom funcionamento do metabolismo

Localização dos tipos de tecido adiposo subcutâneo e visceral
1. Localização dos tipos de tecido adiposo subcutâneo e visceral. (B) Morfologia dos tecidos adiposos Branco, Bege e Marrom com respeito à estrutura celular e tecidual. Fonte: Adaptado de Kwok, Lam e Xu, 2016.

Subdivisões do tecido adiposo branco

Além do tipo de adipócito, o TA pode ser dividido de acordo com a sua localização no corpo. Temos o tecido adiposo subcutâneo (TAS), que se localiza logo abaixo da pele, e o tecido adiposo visceral (TAV), que se localiza entre os órgãos internos. 

O TAS possui algumas funções como isolamento térmico, proteção contra choques mecânicos e molde da superfície do corpo, além de ser responsável por grande parte da produção de leptina. Já o tecido TAV possui função de sustentar os órgãos internos em seu devido lugar e produção de adiponectina, mas este também é o tecido que confere maior perigo à saúde, caso aumente em excesso. O acúmulo de TAV pode gerar resistência à insulina, hipertensão, hipertrigliceridemia, e inflamação crônica. E é sobre esta última condição que vamos falar mais detalhadamente neste texto.

Um abdômen sendo medida por uma fita métrica
O tecido adiposo visceral se acumula na região abdominal e aumenta grandemente o risco de desenvolvimento da síndrome metabólica. Homens possuem maior probabilidade de estocar gordura nessa região. #ParaTodosVerem: A imagem foca em um abdômen sendo medido por uma fita métrica. Fonte: Pixabay.

O que acontece na obesidade

Como já foi dito, a função principal do TA é armazenar a energia extra que consumimos. Quando ingerimos mais fontes energéticas (lipídios e glicose) do que gastamos, por um longo período, ganhamos peso por estocar mais gordura dentro de nossos adipócitos. Esses adipócitos possuem duas maneiras de se expandirem para estocar mais gordura: hipertrofia e hiperplasia.

A hipertrofia ocorre quando as células aumentam o seu tamanho e está presente principalmente no tecido subcutâneo; e a hiperplasia ocorre quando as células passam a se dividir para criar novos adipócitos, e ocorre principalmente no tecido visceral. A hiperplasia pode ocorrer porque o TA possui células-tronco adiposas que apresentam a capacidade de se diferenciarem em novos adipócitos.

A inflamação crônica na obesidade

Com o agravamento da obesidade, pode ocorrer a hiperplasia dos adipócitos viscerais, que desencadeará uma inflamação no tecido pelo aumento da liberação de citocinas. Uma piora na inflamação também vai ocorrer devido à morte celular necrótica, pelo acúmulo de triglicerídeos nos adipócitos além de sua capacidade normal de armazenamento, e também por asfixia dos adipócitos, devido à compressão dos vasos sanguíneos que irrigam o tecido, levando à interrupção do fornecimento de oxigênio para as células.

Esse comportamento anormal do TA gera um recrutamento de células pró-inflamatórias que atuarão no processo de recuperação do tecido lesionado. Por este motivo, o TA de uma pessoa obesa possui 5 vezes a quantidade de macrófagos de uma pessoa não obesa. 

Existem 2 tipos de macrófagos: Macrófago  tipo 1 que é pró-inflamatório (M1) e Macrófago tipo 2 que é anti-inflamatório (M2). O do tipo 2 contribui para a homeostase do tecido, inclusive coordenando a ativação de adipócitos bege que irão contribuir com o gasto de energia no TA. 

Na obesidade, ocorre uma maior concentração de macrófagos do tipo 1 que aumentam a liberação de citocinas pró-inflamatórias (TNFalfa e IL-6) e contribuem para a inflamação do tecido, recrutando ainda mais macrófagos tipo 1, em um ciclo vicioso. Isso ocorre devido a conversão de macrófagos M2 em M1. Além disso, essa inflamação crônica impacta diretamente outros sistemas como o cardiovascular. 

Além disso, durante a obesidade, a expansão do TA pode não ser suficiente para armazenar a gordura excedente, e essa gordura acaba se alojando em outros órgãos como fígado, músculo esquelético e pâncreas, desencadeando uma piora progressiva na saúde (devido a lipotoxicidade)

Outras mudanças são encontradas no TA de pacientes obesos em comparação aos não obesos, como aumento da quantidade de vasos sanguíneos e comprometimento de muitas células-tronco com a linhagem adipogênica, ou seja, células-tronco que poderiam se diferenciar em outros tipos celulares acabam por se limitar a diferenciarem-se em novos adipócitos. Essas mudanças permanecem no TA de pacientes ex-obesos, o que compromete a manutenção do peso e favorece o retorno ao estado de obesidade.

Esses conhecimentos sobre o funcionamento do TA em pessoas obesas nos ajudam a compreender a gravidade da condição clínica e a pensar em estratégias para auxiliar na melhora da saúde desses pacientes. Fique ligado nos próximos textos do Profissão Biotec, pois virão novos conteúdos sobre os efeitos fisiológicos da obesidade na saúde humana.

Perfil de Jennifer
Texto revisado por Luisa Valério, Fabiano Abreu e Bruna Lopes

Cite este artigo:
MEDRADES, J. P. Obesidade e inflamação: o que acontece no tecido adiposo. Revista Blog do Profissão Biotec, v.9, 2022. Disponível em: <https://profissaobiotec.com.br/obesidade-inflamacao-acontece-no-tecido-adiposo/>. Acesso em: dd/mm/aaaa.

Referências:

BAPTISTA, L. S. O tecido adiposo de pacientes controle e ex-obesos exibem diferenças no conteúdo de vasos sanguíneos e na população de células-tronco mesenquimais residentes. Obes. Surg. v. 19, n. 9, 2009, pp. 1304-12. Disponível em: https://pubmed.ncbi.nlm.nih.gov/19562421/. Acesso em: 13/03/2022.
BJORNTORP, P. Metabolic Implications of Body Fat Distribution. Diabetes Care, v. 14, n.12, 1991. Disponível em:https://pubmed.ncbi.nlm.nih.gov/1773700/. Acesso em: 13/03/2022.
JUNQUEIRA, Luiz C.; CARNEIRO, José. Histologia Básica – Texto & Atlas. 13ª edição. Guanabara Koogan, 2017.
SHIN, S. et al. Adipose stem cells in obesity: challenges and opportunities. Biosci Rep. v. 40, n. 6, 2020. Disponível em: https://www.ncbi.nlm.nih.gov/pmc/articles/PMC7284323/#B32. Acesso em: 13/03/2022.
Fonte da imagem destacada: Jcomp – Freepik.

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