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Atualmente, quando pensamos em plantas geneticamente modificadas, logo nos vem à mente multinacionais e produtos cheios de polêmica, certo? O PB já provou que não é bem assim e que esses vegetais podem trazer sim benefícios a nossa vida, mas… E se as plantas geneticamente modificadas fossem utilizadas não só para aumentar a produtividade e estimular a agricultura, mas também para produzir substâncias que nos ajudassem no diagnóstico, tratamento, e até mesmo na cura de doenças?
PLANTAS COMO FÁBRICAS BIOLÓGICAS
O uso de plantas como fábricas biológicas (ou biofábricas) tem despertado bastante a atenção de cientistas ao redor do globo. Basicamente, as biofábricas incluem o uso da biotecnologia para a produção de moléculas importantes para diversos setores, como agricultura, saúde e energia. A possibilidade de produção em larga escala aliada à viabilidade econômica do cultivo de plantas as tornam umas das mais promissoras biofábricas atualmente.
Por meio da modificação genética de plantas é possível fazer com que essas sejam programadas para produzir diferentes substâncias, como por exemplo moléculas capazes de inativar e combater vírus causadores de doenças, tais como o vírus da imunodeficiência humana – HIV.
HIV EM NÚMEROS
A AIDS é, atualmente, talvez a doença que mais tem sido estudada por instituições de pesquisa, devido a fatores como o elevado potencial mutagênico do HIV e a grande preocupação gerada pelos seus dados epidemiológicos. Só no Brasil, no período entre 2010 e 2017 foi registrado um aumento de 3% no diagnóstico de casos de infecção por HIV. Embora a nível mundial a infecção pelo vírus tenha registrado queda nos últimos anos, os números ainda causam preocupação: cerca de 36 milhões de pessoas foram diagnosticadas como soro-positivo em 2016, das quais pouco mais que a metade tem acesso ao tratamento.
Embora eficaz e, caso seguido corretamente, eficiente o suficiente para levar as taxas de vírus a níveis indetectáveis em pessoas infectadas, o tratamento para a AIDS ainda é considerado extremamente caro em muitas partes do mundo, além de ser de difícil acesso, principalmente para populações carentes. Isso levanta a questão de que outras alternativas de tratamento devem ser procuradas a fim de tornar o tratamento mais barato, trazendo, assim, o uso de plantas para a produção de moléculas capazes de inativar o vírus do HIV.
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Os medicamentos já comercializados apresentam diversos benefícios para pacientes soro-positivo, porém existem algumas questões que ainda precisam de solução, tais como a falta de disponibilidade deles em áreas mais carentes. O uso de formulações obtidos por meio de plantas como biofábricas pode ser uma alternativa. Fonte: UNAIDS (2017).
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Nesse âmbito, diversos estudos têm sido realizados. De forma geral, eles buscam localizar substâncias efetivas contra o HIV, identificar o gene responsável pela sua produção e introduzi-lo em plantas como soja, arroz e tabaco que, após cultivadas em estufas, passarão por processos de extração e purificação dessas moléculas, que poderão ser utilizadas no tratamento da doença de diversas formas.
ESTUDOS QUE UTILIZAM PLANTAS COMO ALTERNATIVA NA LUTA CONTRA O HIV
No fim de 2017, ganhou relevância nas mídias nacionais a soja capaz de produzir cianovirina, substância eficiente no combate a doenças virais. Descoberta na década de 90, a cianovirina é uma enzima extraída de uma alga azul de águas doces e salgadas e possui o potencial de impedir a invasão do HIV às células humanas.
Junto a instituições dos EUA, Inglaterra e África do Sul, a Embrapa tornou possível a inserção do gene responsável pela produção da cianovirina em algas azuis em sementes de soja, possibilitando assim a produção em larga escala da substância nessa última espécie. A empresa acredita que com a produção da molécula na soja seja possível a extração e purificação da enzima, que poderá ser utilizada na formulação de géis e pomadas possíveis de ser aplicados em lubrificantes íntimos, impedindo a transmissão do vírus em relações sexuais.
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Esquema de como é feita a produção da cianovirina a partir de sementes transgênicas de soja. Fonte: CIB (2015).
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Assim como para a soja, a Embrapa também tem trabalhado na produção de um arroz geneticamente modificado capaz de produzir anticorpos que tornam o vírus do HIV mais vulnerável ao nosso sistema imune. Segundo os pesquisadores, o método tornaria possível a redução de 96% dos custos na produção do anticorpo, o qual poderia também ser incorporado em géis e lubrificantes íntimos.
O uso do arroz também tem sido empregado na produção de outras substâncias capazes de inativar o HIV, como a pesquisa realizada este ano por pesquisadores do Reino Unido, EUA e Espanha. O resultado desses estudos é uma linhagem de arroz capaz de produzir não só uma, como três proteínas que atuam na neutralização do vírus.
Nos três estudos mencionados, ressalta-se a importância de grãos e cereais como biofábricas para a produção de substâncias capazes de inativar o HIV, não só devido à possibilidade de produção em elevadas quantidades, mas também ao fato de que todas essas culturas já estão consolidadas ao redor do mundo, possuindo a infraestrutura adequada para seu uso como fábricas biológicas. O tabaco também é outra planta que vem sendo empregada para a produção de moléculas anti-HIV.
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Não, não será o arroz preparado em nossa casa que trará os anticorpos responsáveis por inativar os vírus da AIDS. Assim que colhidos, os grãos – ainda crus – deverão ser processados e purificados a fim de coletar tais substâncias, que posteriormente serão compostos de outras formulações. Fonte: Mikuratv/Pixabay
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DESAFIOS A SEREM ENFRENTADOS
Porém, alguns obstáculos ainda precisam ser enfrentados pelos pesquisadores, os quais vão muito além da descoberta dos genes e produção dessas estruturas. É necessário ainda provar à sociedade que essas plantas são seguras para cultivo, bem como seus subprodutos, já que, muitas vezes, o uso de transgênicos é cercado por polêmicas.
Além disso, é preciso regulamentar tais plantas, o que traz à tona não só um obstáculo científico, mas também jurídico, uma vez que toda espécie geneticamente modificada precisa passar por um rigoroso processo de regulamentação para que seja liberada comercialmente. Ainda, faltam investimentos na área, bem como empresas que possam financiar e patentear essas substâncias, viabilizando seu uso na população.
O FUTURO
Apesar de todas as limitações, são inegáveis os benefícios que as plantas podem trazer ao serem utilizadas como biofábricas, não só no tratamento do HIV, mas na produção de outras moléculas que nos auxiliem no tratamento, e até mesmo na cura, de diversas doenças. A facilidade de cultivo e a possibilidade de produção em larga escala mais barata que os processos convencionais de fabricação de fármacos são vantagens inegáveis que permitem que as plantas possam ser utilizadas como verdadeiras fábricas na produção de substâncias valiosas em diversos setores produtivos.
Embora ainda não tenhamos nenhum produto do tipo a nosso alcance, já é possível almejar um futuro onde as grandes lavouras poderão existir não só para nos alimentar, mas também para produzir medicamentos e tratar várias enfermidades que nos assolam.
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Referências
AIDS. Boletim Epidemiológico da AIDS no Brasil em 2017. http://www.aids.gov.br/pt-br/pub/2017/boletim-epidemiologico-hivaids-2017. Acessado em 30 de set. de 2018.
BAPTISTA, V.I.C.S.P., CASEIRO, M.M., SOUZA, C.S. Alternativas terapêuticas contra a aids desenvolvidas a partir da biotecnologia no Brasil. Caderno pedagógico, Lajeado, v. 14, n. 2, p. 28-44, 2017. ISSN 1983-0882.
CONSELHO DE INFORMAÇÕES SOBRE BIOTECNOLOGIA. Arroz transgênico é usado para produção de anticorpo contra a AIDS. https://cib.org.br/arroz-transgenico-e-usado-para-producao-de-anticorpo-contra-a-aids/.
Acessado em 29 de set. de 2018.
CONSELHO DE INFORMAÇÕES SOBRE BIOTECNOLOGIA. Soja transgênica. https://cib.org.br/soja-transgenica/. Acessado em 29 de set. de 2018.
EMBRAPA. Fábricas Biológicas https://www.embrapa.br/busca-de-noticias/-/noticia/3624041/fabricas-biologicas.
Acessado em 30 de set. de 2018.
ÉPOCA NEGÓCIOS. Casos de AIDS aumentam no Brasil. https://epocanegocios.globo.com/Brasil/noticia/2017/07/casos-de-aids-aumentam-3-no-brasil-alerta-onu.html. Acessado em 30 de set. de 2018.
IFL SCIENCE. Scientists develop a strain of genetically modified rice that neutralizes HIV. https://www.iflscience.com/health-and-medicine/scientists-develop-a-strain-of-genetically-modified-rice-that-neutralizes-hiv/. Acessado em 29 de set. de 2018.
UNAIDS. Infográficos.https://unaids.org.br/infograficos/. Acessado em 29 set. de 2018.
VAMVAKA, E. et al. Unexpected synergistic HIV neutralization by a triple microbicide produced in rice endosperm. PNAS. p. 1-9, 2018.
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Revisado por Luana Lobo
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