A citometria de fluxo permite a análise não só da composição de células de uma amostra, mas também a avaliação de moléculas específicas.
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Em algum momento você já deve ter se perguntado, como e quais equipamentos permitem que os cientistas analisem amostras de células em suspensão, não é mesmo? Amostras biológicas em suspensão, como, por exemplo, o sangue, contém muitos tipos diferentes de células, as quais diferem em relação ao tamanho, granulosidade/complexidade e também em relação aos receptores de superfície. 

Essa variabilidade ocorre para que cada célula tenha as propriedades necessárias  que as capacitem para cumprir suas funções específicas no organismo. A caracterização dessas suspensões celulares em laboratórios de biotecnologia pode ser feita através da citometria de fluxo e é essencial para diversos estudos.

Com a citometria de fluxo é possível analisar e agrupar as diferentes células em gráficos de acordo com o tamanho, granulosidade e até mesmo em relação aos receptores de superfície (quando marcados com fluoróforos). Além disso, existem protocolos para avaliar a viabilidade das células (marcação que distingue entre as células vivas e mortas), indicar o número de células na amostra, avaliar o perfil de citocinas (“proteínas sinalizadoras”) expressas e até mesmo caracterizar vesículas extracelulares (pequenas vesículas formadas a partir de membranas celulares). 

Como funciona o citômetro de fluxo? 

O citômetro de fluxo é o equipamento utilizado nas análises de citometria de fluxo. Como é possível imaginar, a análise das amostras em suspensão é feita em fluxo, ou seja, o citômetro possui um sistema microfluídico pelo qual as amostras percorrem. Resumidamente, após serem injetadas no equipamento, as células presentes na amostra são induzidas a se alinharem, em um processo chamado foco hidrodinâmico. Essa etapa é fundamental e automatizada pelo equipamento. 

Agora, as células “enfileiradas” passam uma-a-uma através de um ou mais lasers monocromáticos (laser com feixe eletromagnético de um único comprimento de onda) garantindo assim uma interceptação individual de cada célula. Após a interação da célula com a luz, a luz dispersada e/ou fluorescência emitida são capturadas pelos detectores. Daí, os sinais luminosos são convertidos em sinais eletrônicos, que por sua vez, são transmitidos para o computador e interpretados como valores numéricos. 

Assim, cada célula analisada é representada por um ponto nos gráficos de dispersão (dot plot), indicando “um evento”. A análise de citometria é considerada multi-paramétrica, pois diferentes informações são coletadas simultaneamente, como veremos adiante.

Imagem ilustrativa simplificada da citometria de fluxo. A) A amostra é preparada de forma a deixar as células em suspensão. B) Após ser injetada no equipamento, as células são alinhadas e  interceptadas individualmente pelo laser. A luz espalhada é recebida pelos detectores. C) Por fim são gerados gráficos para análise, sendo o mais tradicional o de dispersão, também conhecido como dot plot, onde cada ponto representa as medidas de uma célula em relação aos eixos indicados.  Fonte: imagem criada pela autora utilizando BioRender.com

#ParaTodosVerem: o título da imagem “Citometria de fluxo” está centralizado na parte superior. Abaixo, a imagem é dividida em três partes. A parte “A” mostra três células de morfologia e tamanhos diferentes, que para facilitar o entendimento foram representadas em três cores (alaranjado, roxo e verde). A parte “B” indica a amostra com várias células das cores laranja, roxo e verde dentro do citômetro, elas são alinhadas, interceptadas pelo laser cuja luz dispersada é capturada pelos detectores. Abaixo com uma indicação de zoom está  uma representação da célula alaranjada e dos feixes de luz, indicados por setas vermelhas. Duas setas passam nas beiradas da célula sem muito desvio (luz dispersada frontal) e duas interagem com grânulos das células e são dispersadas lateralmente (luz dispersada lateral). A parte “C” é uma representação de gráfico de dispersão com os eixos “luz dispersada frontal x luz dispersada lateral”. Neste gráfico é possível ver três populações distintas que estão representadas pelas mesmas cores das células à que se referem (alaranjado, roxo e verde). 

Que informações podem ser extraídas dos gráficos gerados no citômetro?

  Amostras que não são fluorescentes e não foram coradas com fluoróforos podem ter seu tamanho e granulosidade avaliados (como indicado na imagem anterior). O tamanho das células é relacionado aos dados da luz dispersada frontal ou forward scatter (FSC), enquanto a granulosidade pode ser relacionada aos dados da luz dispersada lateralmente ou side scatter (SSC)

Como visto na figura, os 3 tipos diferentes de células representadas por 3 cores (roxo, verde e alaranjado) apresentam tamanho e granulosidade (presença de grânulos, “bolinhas”, dentro da célula) diferentes. As células laranja possuem número maior de grânulos e também tamanho maior, por isso, no gráfico de dispersão (a direita na figura), elas se localizam no canto direito superior, ou seja, com maiores valores de FSC (tamanho) e SSC (granulosidade). 

As células roxas são as menores e com menor granulosidade e, portanto, se localizam no canto esquerdo inferior, mais próximo da junção dos eixos com menores valores de FSC e SSC. Além disso, como cada ponto é referente a uma célula, pode-se obter o número de cada tipo de células (não é preciso contar, o programa calcula o número para o usuário).

Quando as células em suspensão são coradas com fluoróforos, é possível ainda avaliar uma infinidade de outros parâmetros. Aqui, o processo se assemelha ao que ocorre em análises de biologia espacial, mas neste caso, sem a informação espacial e interação entre as células. De modo similar, é preciso levar em consideração os canais de excitação e emissão de cada fluoróforo, a compatibilidade destes com o equipamento utilizado (ou seja, se os canais de excitação e emissão estão disponíveis no equipamento) e a interferência (sobreposição) entre os diferentes fluoróforos.   

  Um outro fator importante para se levar em consideração é que o equipamento deve ser calibrado e os controles adequados utilizados para que uma interpretação correta dos dados possa ser feita. Além disso, existe uma variabilidade intrínseca entre diferentes equipamentos.

Algumas áreas de pesquisa que utilizam citometria de fluxo.

A citometria de fluxo é utilizada em várias áreas de pesquisa além de diagnósticos clínicos, incluindo estudos de imunologia e biologia molecular, principalmente imunofenotipagem, resposta celular à certos antígenos (medida a partir da expressão de citocinas), proliferação celular – por exemplo, como o crescimento celular é afetado durante o teste de um medicamento, análise de morte celular por apoptose (“morte celular programada”), avaliação do ciclo celular, entre outras. 

Outro ponto interessante, é que micropartículas também podem ser analisadas nesses equipamentos em testes chamados multiplex que, como o nome sugere, são capazes de quantificar múltiplas moléculas, por exemplo diferentes citocinas, simultaneamente. Micropartículas também são usadas para a calibração do equipamento e para a quantificação comparativa da medida de fluorescência. Associado a isso, milhares de partículas ou células podem ser analisadas a cada segundo em equipamentos modernos, tornando essa técnica eficiente na avaliação de amostras! 

Em resumo, vimos que através da  técnica de citometria de fluxo é possível obter informações multi-paramétricas sobre uma amostra em suspensão de forma rápida e muitas vezes completamente automatizada. Além disso, tanto informações qualitativas quanto quantitativas são obtidas durante a análise com a citometria de fluxo, tornando-a uma técnica indispensável para responder diversas questões científicas. 

Perfil de Cristiane Casonato
Texto revisado por Bruna Cardias e Fabiano Abreu

Cite este artigo:
MELO, C. C. Por dentro do laboratório: conhecendo melhor a citometria de fluxo! Revista Blog do Profissão Biotec, v. 11, 2024. Disponível em: <https://profissaobiotec.com.br/por-dentro-do-laboratorio-conhecendo-melhor-a-citometria-de-fluxo>. Acesso em: dd/mm/aaaa.

Referências 

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COSTA, R. N. Introdução à Citometria de Fluxo: Um Manual Básico Para Iniciantes. (Publicação independente, ed.). Disponível em: https://www.arca.fiocruz.br/bitstream/handle/icict/48332/Introdução_Citometria_ Fluxo_RodrigoCosta_23-07-21.pdf?sequence=4&isAllowed=y. Acesso em: 28 Mai. 2024.
iBiology Techniques EMBL. Flow Cytometry Introduction – Malte Paulsen (EMBL). Disponível em: https://www.youtube.com/watch?v=W1BFeiDwqnk. Acesso em: 28 Mai. 2024.
MCKINNON,  K. M. Flow Cytometry: An Overview. Curr. Protoc. Immunol. v. 120, n. 1, 2018.
Renata. Introdução à citometria de fluxo. Disponível em: https://www.youtube.com/watch?v=LKSGpn0sVII. Acesso em: 30 Jun. 2024.

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