O queijo (juntamente com o pão e a cerveja) é um dos produtos mais utilizados para exemplificar o significado de biotecnologia. Afinal de contas, há mais de 6000 anos os seres humanos começaram a produzi-lo, mas sem conhecer a ciência por trás da técnica.

O uso de microrganismos para a fermentação do leite, com a consequente maturação do queijo, é um exemplo de biotecnologia clássica. A biotecnologia moderna se envolveu somente na década de 90, quando cientistas utilizaram bactérias transgênicas para obter o coalho, um dos gargalos da produção (que será explicado mais adiante no texto). Mas qual a diferença entre esses dois tipos de biotecnologia?

Biotecnologia Clássica

Quando falamos de biotecnologia clássica, nos referimos ao uso de microrganismos para a obtenção de um produto. Logo nos vem à cabeça o uso de microorganismos como agentes fermentadores para a produção de pão, vinho, cerveja e queijo. Veja aqui outros alimentos produzidos através da biotecnologia clássica que você nem imaginava!

No caso do queijo, bactérias naturalmente presentes no leite realizam o processo de fermentação lática.

Nesse tipo de fermentação, as bactérias utilizam o açúcar lactose presente no leite como ponto de partida para a obtenção de galactose e glicose, sendo que a última é utilizada pelas bactérias para a produção de energia necessária para a sua sobrevivência. Nesse processo de geração de energia, as bactérias transformam a glicose em ácido lático, que aumenta a acidez do leite – destruindo os microorganismos – e ajuda na sua coagulação.

Produção de queijo.

Quando o leite utilizado é pasteurizado, as bactérias naturais são destruídas e por isso precisamos adicionar novos microrganismos ao processo. Essa reposição pode ser realizada utilizando fermentos lácteos (bactérias fermentadoras) ou soro de um queijo feito anteriormente (que contém bactérias utilizadas no processo anterior). As bactérias mais comuns na indústria láctea são as do gênero Lactococci, Lactobacilli ou Streptococci. Além destas, na Suíça é utilizada a Propionibacter shermanii, que produz bolhas de dióxido de carbono durante a maturação do queijo, resultando no queijo suíço ou Emmental cheio de furinhos.

Ficou curioso sobre os microrganismos presentes no queijo? Leia esse texto sobre o estranho mundo vivo do interior de um queijo.

Queijo Emmental e, em destaque, a bactéria Propionibacter shermanii, responsável pela produção dos furinhos no queijo.

Outros microrganismos, como os fungos, podem ser utilizados na maturação dos queijos para dar um gostinho ou característica especial. Por exemplo, os fungos Penicilium rocheforti e Penicillium camamberti, dão origem, respectivamente, aos queijos tipo Roquefort, Camembert e Brie.

Saiba mais sobre o processo de maturação dos queijos em nosso conteúdo: Maturação de queijos: um processo microbiano dinâmico e milenar

O queijo Camembert e o Roquefort possuem fungos adicionados no processo de maturação. Em destaque você pode ver imagens de como os fungos crescem em placas de ágar e dentro da lupa imagens dos fungos vistas por microscópio.
Biotecnologia Moderna: enzimas recombinantes

A biotecnologia moderna faz uso de informações genéticas e de tecnologias de DNA recombinante. Mas onde o queijo entra nessa história de biotecnologia moderna? Para entendermos, vamos precisar nos aprofundar um pouco mais no seu processo de produção.

Depois da fermentação pelas bactérias, os produtores de queijo adicionam “coalho” no processo, que nada mais é que uma enzima (quimosina) que “corta” as pontas das proteínas do leite. Sem as extremidades, as proteínas se juntam formando aglomerados (ou coágulos), que são espremidos e separados do soro do leite, seguindo para o processo de maturação do queijo.

Separação do soro do leite dos coágulos no processo de fabricação de queijo.

Estas enzimas utilizadas no processo de coagulação do leite normalmente são obtidas do estômago de bezerros lactentes (que ainda dependem do leite materno para a sua sobrevivência) ou de outros ruminantes jovens. O uso de quimosina é um gargalo no processo de produção de leite, pois a demanda da enzima é muito  maior que a quantidade obtida. Para diminuir o uso de enzimas de origem animal e aumentar a produção da mesma, cientistas decidiram produzir a enzima em laboratório!

Através de ferramentas de engenharia genética, nos anos 90, os cientistas conseguiram “ensinar” bactérias e fungos a produzir a mesma enzima que é encontrada nos estômagos dos animais. Para isso, os pesquisadores adicionaram nas bactérias o DNA animal que codifica para a enzima quimosina, produzindo bactérias transgênicas. É um processo similar ao da produção de insulina para pacientes diabéticos. Para a produção industrial de quimosina, os microorganismos são cultivados em fermentadores e, depois, a enzima quimosina é purificada e adicionada no leite para a produção de queijo.

Esquema ilustrativo do processo de inserção de DNA de interesse (gene quimosina) em um plasmídeo que é inserido dentro de bactérias para a produção da enzima de interesse (quimosina).

Esse coalho produzido em laboratório é conhecido por diversos nomes: coalho genético, coalho industrial e coalho microbiano. Mas todos esses nomes são utilizados para se referir ao mesmo produto: a enzima quimosina produzida por microorganismos com modificações genéticas.

A enzima do coalho genético é considerada idêntica à extraída de forma tradicional. E os lacto-vegetarianos agradecem: além de desenvolver um método mais prático para a obtenção da enzima, os cientistas substituíram o uso de animais no processo.

(Mas não são todas as marcas que utilizam o coalho genético. Como às vezes não vem escrito na embalagem, é necessário perguntar no SAC das empresas se eles empregam o coalho microbiano ou o tradicional.)  

Utilizamos neste texto o exemplo tradicional do queijo para mostrar que a biotecnologia pode ser encontrada no dia-a-dia de maneira bem simples (biotecnologia clássica e o queijo roquefort) ou sofisticada (biotecnologia moderna e o coalho genético). Gostou de saber onde a biotecnologia e a engenharia genética são aplicadas? Siga nossa página no facebook e fique de olho no Profissão Biotec para mais exemplos biotecnológicos!

Sugestão de leitura sobre coalhos: https://digitalis-dsp.uc.pt/bitstream/10316.2/33613/1/Agrotec8_artigo33.pdf?ln=pt-pt

Sobre Nós

O Profissão Biotec é um coletivo de pessoas com um só propósito: apresentar o profissional de biotecnologia ao mundo. Somos formados por profissionais e estudantes voluntários atuantes nos diferentes ramos da biotecnologia em todos os cantos do Brasil e até mesmo espalhados pelo mundo.

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