Recentemente muito se falou sobre a utilização de anticorpos, obtidos de convalescentes da COVID-19, para tratamento de pacientes enfermos. Diversas pesquisas estão sendo conduzidas ao redor do globo para obter um método capaz de auxiliar no tratamento e até mesmo para impedir que mais pessoas sejam infectadas.
No Brasil, um grupo de pesquisa do Instituto Butantan estuda desenvolver um produto que possua anticorpos capazes de neutralizar o vírus, no qual os anticorpos monoclonais neutralizantes, originados das células B (células de defesa de nosso organismo), sejam obtidos do sangue de pacientes curados. Somado a isto, o estudo examinará a possibilidade de escalonar e replicar este processo em biorreatores na produção desses anticorpos em grande quantidade para o tratamento da COVID-19. Outras farmacêuticas também estão buscando produzir anticorpos em larga escala contra o COVID-19, veja neste link.
Convalescentes possuem imunidade ao vírus?
Em entrevista dada para O Globo, o professor de virologia da Faculdade de Medicina da USP, Eurico Arruda diz que aqueles que foram infectados e curados, mesmo possuindo anticorpos produzidos pelo próprio organismo, não têm a garantia de possuírem defesa e estarem imunes. Isso ocorre devido à complexidade da resposta imune que envolve fatores além de anticorpos. Ademais, o vírus pode permanecer no organismo, a fim de que no momento em que o sistema imunológico enfraquecer, o mesmo pode voltar a se replicar, causando os sintomas como dificuldade para respirar, febre e tosse. O pesquisador ainda diz:
O anticorpo é uma cicatriz sorológica, não é um atestado de imunidade. Ele é uma marca da exposição ao vírus presente no soro sanguíneo. A presença de anticorpos diz que uma pessoa foi exposta ao vírus e produziu uma resposta a isso. Mas isso não significa que ficou imune, pois a resposta pode não ser forte ou duradoura o suficiente, e tampouco que ela deixou de ser portadora do vírus. Claro, algumas pessoas com anticorpos de fato terão desenvolvido defesas, anticorpos capazes de bloquear a infecção”.
Eurico Arruda, 2020
Anticorpo humano capaz de bloquear a infecção da COVID-19
Em um artigo publicado pela revista Nature, pesquisadores descobriram um anticorpo monoclonal humano (denominado 47D11) capaz de bloquear a infecção do vírus SARS-CoV-2, o causador da COVID-19. O estudo em questão foi feito em cultura de células e utilizou como base anticorpos já utilizados contra o vírus da doença SARS, o Sars-CoV. A utilização de anticorpos monoclonais direcionadas à proteínas vulneráveis da superfície viral se constituem como um rumo promissor na produção de medicamentos no combate a esta infecção.
Ainda de acordo com este estudo, o alvo principal destes anticorpos são as glicoproteínas triméricas denominadas spike, presentes na superfície viral e que intercedem na ligação do vírus à célula, permitindo sua penetração, além de conferir a forma de coroa ao vírus. Basicamente, os anticorpos neutralizantes possuem como alvo a região de interação do receptor encontrado em uma subunidade desta proteína viral, inativando as interações deste receptor. A interação do receptor ocasiona alterações conformacionais nas proteínas spike do vírus de forma irreversível, levando à fusão da membrana.
Como os vírus SARS-CoV-2 e SARS-CoV são semelhantes, suas proteínas spike também o são (77,5% idênticas através de sua sequência de aminoácidos primários), o que permitiu o sucesso da pesquisa pela escolha e ação do anticorpo.
Este é o primeiro relato de um anticorpo monoclonal de origem humana que neutraliza o vírus causador da COVID-19, podendo alterar o curso da infecção no hospedeiro (auxiliando na eliminação do vírus), bem como proteger algum possível hospedeiro não infectado. Segundo os pesquisadores, este anticorpo deverá ser utilizado no desenvolvimento de testes de detecção de antígenos e em ensaios sorológicos direcionados ao vírus. Somado a isto, apresenta um potencial de prevenção ou tratamento do coronavírus, e com probabilidades de atuar também em doenças emergentes futuras causadas por qualquer vírus do subgênero Sarbecovirus.
Mesmo que essas notícias sejam animadoras, cabe ressaltar que ainda há muito a ser estudado, que novos testes ainda devem ser feitos e nenhuma etapa deve ser omitida, uma vez que estas análises foram realizadas em laboratórios, sem a utilização de pacientes reais. Os testes em laboratórios (in vitro) diferem em muitos casos de testes em pacientes (in vivo) em uma série de fatores, como a metodologia, reprodutibilidade e diversos efeitos que podem causar ao paciente.
Anticorpo de lhama apto a neutralizar o vírus
Pesquisadores belgas, na realização de uma série de estudos acerca dos vírus SARS (causador da Síndrome respiratória aguda grave) e MERS (causador da Síndrome respiratória do Oriente Médio), encontraram em uma lhama de quatro anos a esperança no combate ao novo coronavírus. A descoberta é de que estes anticorpos além de impedir a infecção, também possuem a capacidade de neutralizar o vírus.
Enquanto os seres humanos possuam um tipo de anticorpo, composto por duas cadeias leves e duas pesadas, formando uma espécie de Y, as lhamas possuem dois tipos de anticorpos. Uma destas imunoglobulinas é semelhante a dos humanos, já o outro tipo é bem menor (em torno de um quarto do tamanho). E são estes anticorpos menores que podem acessar e neutralizar as proteínas spike,, as proteínas que auxiliam o vírus adentrar nas células hospedeiras e causar a infecção. Você pode se aprofundar mais sobre este tipo de anticorpos lendo esse texto do Profissão Biotec.
Com isso, podemos notar os avanços dos estudos acerca da COVID-19, seja para tratamento ou até mesmo para evitar o acontecimento de novas infecções. Isso nos evidencia a importância do incentivo às pesquisas científicas neste período tão conturbado e difícil. Quer estudar e aprender mais sobre o novo coronavírus? Nós do Profissão Biotec temos uma seção com diversos textos para nos aprofundarmos nesse tema, clique aqui para ler mais.