A varíola dos macacos (ou do macaco) é a nova doença que está deixando em alerta cientistas e a população em geral. Até o momento da escrita desse texto (21 junho de 2022), a Organização Mundial da Saúde (OMS) já havia confirmado 780 casos da doença em 27 países. Os surtos se iniciaram na Europa, e até agora não se sabe exatamente como essa doença está chegando em locais nos quais antes não era comum. Por que a varíola dos macacos está chamando a atenção das autoridades? E o que já sabemos sobre ela?
O que é a varíola dos macacos
Para facilitar o entendimento, vamos comparar a varíola dos macacos com duas doenças já conhecidas, a varíola humana e, mais à frente no texto, a COVID-19.
Felizmente, a varíola humana foi erradicada há mais de 50 anos graças à vacinação em massa. Essa conquista foi possível principalmente porque o ser humano era o único hospedeiro do vírus e, portanto, quando a maioria das pessoas foi vacinada, não havia mais organismos nos quais o vírus poderia se alojar.
Já a varíola dos macacos, como o nome diz, também infecta esses animais, e é possível que os verdadeiros reservatórios desse vírus sejam pequenos roedores das florestas tropicais da África, como os esquilos. Esse fato torna praticamente impossível que essa doença seja completamente erradicada. É por isso que, desde que foi detectada pela primeira vez em 1958 na Dinamarca em macacos (daí o nome), de tempos em tempos são registrados surtos da doença. O primeiro caso em humanos foi registrado em 1970, na República Democrática do Congo.
No entanto, ela sempre foi endêmica da África Central e Ocidental, e países como a República Democrática do Congo, Camarões, Serra Leoa e Nigéria já enfrentam a doença há bastante tempo. Porém, atualmente ela vem se espalhando, e casos já foram detectados em quase toda a Europa, Estados Unidos, Canadá, Austrália, Argentina, Marrocos, Emirados Árabes eno Brasil, onde já existem 8 casos confirmados. Inclusive, o número total de casos de varíola dos macacos já supera todos os casos registrados fora do continente africano desde 1970.
Os sinais e sintomas
Os sinais e sintomas da doença são dor de cabeça, febre, dores musculares, linfonodos aumentados e erupções cutâneas na face, nas mãos e nos pés. A maioria das pessoas não precisa de tratamento e se recupera da varíola dos macacos em poucas semanas sem sequelas, ao contrário da variante humana da varíola, que matou mais de 60 milhões de pessoas durante o século XVIII. Mesmo as pessoas que se recuperavam da varíola humana frequentemente ficavam com cicatrizes das feridas e, às vezes, com cegueira e deformidades nos membros.
A transmissão
A transmissão entre humanos não é comum, mas pode ocorrer devido ao contato físico próximo com pessoas contaminadas. A variola dos macacos não é considerada sexualmente transmissível, mas acredita-se que a prática sexual esteja facilitando o processo de transmissão desse vírus. Essa suspeita veio de um fato intrigante: a maioria dos casos está surgindo entre homens de 20 a 50 anos que se relacionam com outros homens.
David Heymann, conselheiro da OMS, explicou que é possível que os surtos tenham se espalhado por conta de duas festas raves que aconteceram na Espanha e na Bélgica. A suspeita inclusive motivou a OMS a criar uma página com Conselhos de saúde pública para gays, bissexuais e outros homens que fazem sexo com homens.
O vírus
O vírus da varíola dos macacos (chamado de monkeypox e pertencente ao gênero Orthopoxvirus) é um vírus de DNA relativamente grande. Isso significa que podemos esperar menos variantes do que do SARS-CoV-2 por exemplo, que é um vírus pequeno de RNA. Isso acontece porque os vírus de DNA possuem um sistema de reparo de mutações no seu material genético mais eficiente e que os impede de se adaptar tão facilmente comparados aos vírus de RNA.
Os portugueses foram os primeiros a realizar o sequenciamento do genoma do vírus encontrado em seu país, em 19 de maio de 2022. Os cientistas responsáveis concluíram que, aparentemente, se tratava da mesma cepa encontrada na África Central e que causa sintomas leves e morte em apenas 1% da população rural pobre.
Estratégias de contenção
A varíola dos macacos não é uma doença nova. Como já comentado, vários países da África já convivem com essa doença há muito tempo e, por esse motivo, já temos algumas estratégias para combatê-lo.
Por exemplo, em 2019, uma vacina contra a varíola, desenvolvida pela empresa dinamarquesa Bavarian Nordic, foi aprovada pelo Food and Drug Administration (FDA). Mais tarde, a aprovação incluiu a vacina contra a varíola dos macacos. A Bavarian Nordic atualmente está trabalhando em uma forma liofilizada do imunizante, que vai facilitar o seu armazenamento e transporte para que chegue às regiões mais remotas.
Talvez não seja necessária a vacinação em massa para frear o avanço da doença. É possível que as autoridades realizem apenas a vacinação em anel, semelhante ao que foi feito durante os surtos de Ebola em 2020. Essa estratégia consiste em vacinar apenas as pessoas próximas dos casos confirmados da doença. Já que a transmissão de pessoa para pessoa é mais difícil do que a da COVID-19, por exemplo, essa estratégia deve ser suficiente para conter o avanço da varíola dos macacos
Ainda não há tratamentos específicos para a varíola dos macacos, mas já existem algumas estratégias que vêm sendo estudadas.
Rastreabilidade
Em geral, a varíola não passa despercebida, já que a maioria das pessoas infectadas apresenta sintomas, mesmo que leves, tornando fácil rastrear o seu caminho. No entanto, como muitos casos estão aparecendo sem explicação aparente, é possível que o vírus esteja se espalhando de maneira silenciosa.
A variola dos macacos não é uma doença nova, e já conhecemos o vírus e muitas de suas características. Inclusive, já possuímos vacinas que são eficazes e há evidências de que a cepa que está se espalhando seja responsável por uma forma leve da doença. Além disso, o vírus da varíola dos macacos apresenta menor taxa de mutação e menor capacidade de transmissão de pessoa para pessoa do que o vírus da COVID-19, por exemplo.
No entanto, é importante ficar alerta, já que algumas perguntas ainda não foram respondidas: por que a doença está aparecendo em populações separadas ao redor do mundo sem explicação aparente? Os casos de diferentes países estão conectados de alguma maneira? Como os surtos na Europa e no restante do mundo diferem daqueles já conhecidos na África? Por que a maioria dos casos está ocorrendo entre homens que se relacionam com homens?
A varíola dos macacos é o mais novo desafio que as autoridades de saúde têm de enfrentar. Porém, não estamos entrando nessa guerra sem armas e sem conhecimento do inimigo. Por isso, podemos esperar que todas essas perguntas sejam respondidas em breve pela ciência e que esse vírus cause o mínimo possível de vítimas até que seja devidamente controlado.
Cite este artigo:
MEDRADES, J. P. Varíola dos macacos: o que já sabemos sobre os novos casos. Revista Blog do Profissão Biotec, v.9, 2022. Disponível em: <https://profissaobiotec.com.br/variola-dos-macacos-o-que-ja-sabemos/>. Acesso em: dd/mm/aaaa.
Referências:
AFP. OMS reporta 780 casos de varíola do macaco em 27 países. Exame. Disponível em:<https://exame.com/ciencia/oms-reporta-780-casos-de-variola-do-macaco-em-27-paises/>. Acesso em: 05 Jun 22.
CATRACA LIVRE. Raves na Europa podem explicar início do surto da varíola dos macacos. Disponível em: <https://catracalivre.com.br/saude-bem-estar/raves-inicio-do-surto-variola-dos-macacos/>. Acesso em: 05 Jun 22.
KOZLOV, M. Monkeypox goes global: why scientists are on alert. Nature, v. 606, 2022. Disponível em: <https://www.nature.com/articles/d41586-022-01421-8>. Acesso em: 05 Jun 22.
TESINI, B. L. Varíola do macaco. Manual MDS. Disponível em: <https://www.msdmanuals.com/pt-br/profissional/doen%C3%A7as-infecciosas/v%C3%ADrus-pox/var%C3%ADola-do-macaco>. Acesso em: 05 Jun 22.
SMITH, J. Vaccines mobilized to control monkeypox outbreak. Labiotech. Disponível em: <https://www.labiotech.eu/trends-news/monkeypox-vaccine-smallpox/>. Acesso em: 05 Jun 22.
Fonte da imagem destacada: Pixabay.