Não há dúvidas que as atividades humanas associadas à cultura do consumismo exacerbado em que vivemos, de forma geral, geram grandes impactos negativos ao meio ambiente.
Um dos grandes problemas é a elevada geração de resíduos sólidos urbanos (RSU). Só no Brasil em 2018, segundo o Panorama Abrelpe, foram geradas 79 milhões de toneladas de RSU.
Devido à magnitude do problema, busca-se, cada vez mais, formas para mitigá-lo, como veremos algumas a seguir. Mas antes precisamos entender alguns pontos básicos: o que é um resíduo? E um rejeito? Como definir reciclagem, afinal? Depois veremos como a biotecnologia pode ser uma grande aliada na minimização do descarte inadequado dos resíduos sólidos urbanos.
O que de fato é um resíduo?
Todo material que é descartado torna-se um resíduo, contudo, nem todo resíduo é um rejeito! Achou que os dois eram sinônimos, né? A sua diferença está relacionada à possibilidade ou não de aproveitamento dos materiais descartados.
Um produto descartado pode ser reutilizado, reciclado ou descartado definitivamente, os dois primeiros podem ser considerados resíduos e o último ser chamado de rejeito. Os rejeitos, por falta de educação ambiental, gestão pública, tecnologia ou interesse econômico não são inseridos novamente na cadeia de consumo.
Infelizmente, muitos resíduos são tratados como rejeitos, apesar de terem um grande potencial para reuso e/ou reciclagem. Em 2018 no Brasil, 29,5 milhões de toneladas de RSU tiveram destinação inadequada como lixões e aterros controlados – resultando em mais poluição ambiental.
Porém, tais destinações são irregulares segundo a Lei nº 12.305/10, conhecida como a Política Nacional de Resíduos Sólidos, devido ao seu grande potencial poluidor. Para entender melhor o que são lixões e aterros controlados confira este artigo: “Aterros sanitários, aterros controlados e lixões: entenda o destino do lixo no Paraná”.
E como podemos melhorar isso?
A melhor saída é o gerenciamento dos RSU bem feito! Para isso, é necessário que o setor público com o auxílio da população seja capaz de aplicar um plano que vá desde a geração consciente desses resíduos, até os melhores caminhos para destiná-lo.
Para entendermos melhor como isso é possível, vamos ver um pouco sobre os tipos de resíduos e como podemos reaproveitá-los ou reciclá-los.
O que é reciclagem?
Imagino que a maioria de nós saiba alguma coisa de reciclagem e/ou até separe em casa alguns resíduos para esse propósito. O objetivo da reciclagem é transformar o resíduo em um novo produto com a mesma finalidade ou até outra coisa bem diferente. Além de, claro, diminuir o impacto ambiental e gerar renda para os catadores de materiais recicláveis.
É normal associar a reciclagem a materiais como vidro, papel, metal e plástico, e sim, eles são altamente recicláveis! Mas, e quanto aos resíduos orgânicos? Aqueles restos de alimentos, folhagens, aparas de gramado, óleos e gorduras? Sabia que esses também são passíveis de reciclagem?!
A reciclagem dos resíduos orgânicos é basicamente um processo natural, no qual, os microrganismos degradam, ou seja, decompõem a matéria orgânica para um estado estável e humificado – rico em nutrientes para adubação.
Alguns métodos de reciclagem de resíduos sólidos orgânicos:
Compostagem
O resíduo orgânico é colonizado por alta carga e vários tipos de microrganismos. Na compostagem, esses grupos de microrganismos, em sua maioria aeróbios, possuem habilidade de, na presença do oxigênio e condições controladas (pelo homem), gerar a energia que necessitam a partir da decomposição da matéria orgânica.
O processo de digestão, resulta na liberação (quebra) dos elementos químicos da matéria orgânica, que até então era formada por grandes cadeias orgânicas, ou seja, compostos complexos. Depois da quebra, essa matéria orgânica torna-se disponível na forma de compostos menos complexos, os nutrientes mineralizados, de fácil absorção.
Ao final de todo esse processo , tem-se um composto humificado ou húmus; massa rica em nutrientes minerais que pode ser utilizada como adubo orgânico. Podemos chamar esse processo de ciclo virtuoso da cadeias de carbono.
Biodigestão
Apesar de ser uma opção muito mais difundida na zona rural, os biodigestores funcionam com o mesmo propósito da compostagem: estabilizar a matéria orgânica.
Contudo, aqui as grandes estrelas são os microrganismos anaeróbios, ou seja, aquelas que não utilizam o oxigênio no processo de decomposição da matéria orgânica para obtenção do húmus.
Devido à falta de oxigênio, a decomposição é mais lenta. E durante o processo ocorre a geração do biogás, que é basicamente composto por gás metano (CH4), um pouco de dióxido de carbono (CO2), um pouquinho de vapor de água e quase nada de uma mistura de outros gases.
O biogás possui um conteúdo energético elevado e semelhante ao gás natural. Por isso, pode ser utilizado como combustível em fogões de cozinha, geradores de energia elétrica e geração de energia mecânica. Porém, ele é considerado um biocombustível, por ser de origem renovável (biomassa).
Quer saber mais sobre as vantagens dos biocombustíveis? Confira esse artigo do Profissão Biotec que fala somente sobre isso: “Biocombustíveis: uma saída para conter as mudanças climáticas?”
E como a biotecnologia pode ajudar a acelerar esse processo?
Você deve estar se perguntando “o que a biotecnologia tem a ver com tudo isso?”. Pois bem, algumas técnicas biotecnológicas podem ser ferramentas essenciais para potencializar o processo de reciclagem através de alguns métodos que veremos a seguir.
Mas vale lembrar que algumas técnicas podem ser utilizadas para resíduos orgânicas, outras para diferentes tipos de resíduos, não orgânicos, como os plásticos, sim, a “terrível” problemática do descarte irregular dos plásticos pode ser minimizada com ajuda da biotecnologia. Vamos conferir:
Biopolímeros
Os biopolímeros são plásticos produzidos a partir de matérias primas de origem vegetal, podendo ser a cana-de-açúcar, amido de batata ou celulose vinda de árvores e palha de vegetais.
Por serem de origem vegetal, muito deles são biodegradáveis, ou seja, passíveis de compostagem, trazendo a possibilidade de formação de um ciclo de vida fechado. Além de todos serem obtidos de matéria primas de fonte renovável, tem um potencial e se tornarem mais baratos no futuro e causam muito menos impacto ao meio ambiente.
Portanto, imagine aquelas sacolinhas de supermercados, embalagens de alimentos e utensílios de uso único, que na grande maioria não são reciclados, podendo ser compostados junto com restos de alimentos domésticos!
Eles não são fantásticos!? Por sinal, vale lembrar que aqui na PB temos artigos falando somente sobre eles! Confira: “Bioplásticos: o que eles realmente têm de BIO?” e “ Vamos repensar o plástico? E se ele fosse produzido por bactérias?”
Microrganismos decompositores de plástico
Sabe-se que o que o plástico muitas vezes é altamente reciclável, mas nem sempre é reciclado! Assim, propostas como a dos biopolímeros biodegradáveis, passíveis de compostagem, são importantes! Contudo, essas propostas nem sempre atenderão todas demandas do plástico convencional, logo a ciência nunca deve parar!
Alguns cientistas se dedicam a encontrar microrganismos capazes de degradar o plástico convencional – produzidos a partir de compostos petrolatos. O problema é que há uma alta diversidade de polímeros sintéticos, o que aumenta esse desafio.
Diversas pesquisas com esse intuito já foram realizadas. Um exemplo é a um grupo de cientistas japoneses que identificaram e isolaram a bactéria da espécie Ideonella sakaiensis, encontrada em uma fábrica de reciclagem de garrafas de politereftalato de etileno (PET) em 2016; eles caracterizaram e descreveram a estrutura de uma enzima capaz de degradar o plástico do tipo PET.
Uma das pesquisas mais recentes é a dos cientistas da Alemanha que publicaram em 2020 um artigo onde conseguiram identificar uma bactéria – comum em solo da espécie Pseudomonas sp. – capaz de metabolizar os poliuretanos, polímeros utilizados na fabricação de espumas e materiais de isolamento.
Apesar de algumas pesquisas promissoras, como as citadas, ainda não se tem um produto comercial efetivo. Na sua opinião, será que para a biotecnologia será mais fácil formular produtos a base de bactérias que degradam os mais diversos plásticos ou acabar com os plásticos sintéticos? Deixe seu comentário!
Microrganismos eficientes
O processo de compostagem natural pode ser demorado, levando vários meses para obter o tão desejado adubo orgânico, assim, os microrganismos eficientes podem potencializar essa tarefa. Eles são microrganismos exógenos (externos) que irão ajudar na degradação da matéria orgânica.
Há formas de obtê-los naturalmente, mas diversas empresas já facilitam esse trabalho e hoje vendem produtos que contém microrganismos eficientes e enzimas potencializadoras inertes (“adormecidos”) que só precisam ser ativados corretamente para auxiliar o processo de decomposição.