O primeiro relato da síndrome da imunodeficiência adquirida (AIDS) ocorreu há 41 anos atrás, em 1981. Nessa época, a doença não tinha essa denominação e nem se sabia qual era seu agente causador. Ela foi primeiramente descrita como “pneumonia observada em homens gays”, pois neles foram observados os primeiros casos. Essa descrição foi falha em vários aspectos e contribui até hoje para o estigma que associa a homossexualidade a casos de AIDS.
Ao longo desses mais de 40 anos, muita coisa mudou, mas ainda não temos uma cura para a AIDS. Hoje, o cenário é bem diferente da década de 1980: são conhecidos os mecanismos de ação dos vírus da imunodeficiência humana (HIV); temos tratamentos que aumentam a expectativa de vida de pacientes soropositivos; e formas medicamentosas capazes de evitar a contaminação pelo vírus. No entanto, até hoje, o uso de preservativos é um dos maiores aliados na luta contra a disseminação do vírus.
Pandemia de HIV/AIDS
A pandemia de HIV/AIDS se iniciou no começo da década de 1980. É considerada uma pandemia, pois, ainda hoje, há uma disseminação mundial do vírus e da doença, mesmo sendo mais incidente em determinadas localidades. O último relatório publicado em 2021 estima que, no mundo, existem cerca de 38,4 milhões de pessoas vivendo com HIV e 1,5 milhões de novas infecções por ano.
Um dos grandes problemas do HIV/AIDS é a capacidade do vírus se manter em estado latente, período em que não há sintomas de doença, por um longo período até ser capaz de causar a AIDS. Isso contribuiu para que, logo no início, o vírus fosse se espalhando de forma silenciosa e se alastrando pelo mundo. Sem saber que estavam sendo infectadas, as pessoas seguiam tendo relações sexuais sem preservativo e doando sangue, o que contribuiu para esta rápida disseminação.
Atualmente, a alta adesão à terapia antirretroviral (ART) vem contribuindo para a redução na transmissão do HIV, pois com ela pode-se suprimir a carga viral no sangue, impossibilitando a transmissão sexual. O aumento da testagem de indivíduos, campanhas informativas e uso de profilaxias pré-exposição (PrEP) e pós-exposição (PEP) são outros fatores que contribuem para que a disseminação do HIV seja menor do que a de anos atrás.
Em 2014, foi lançada a iniciativa 90:90:90 a qual tem como objetivo alcançar os números de: 90% das pessoas com HIV sejam diagnosticadas, dessas pessoas, 90% soropositivas recebam ART e, 90% de quem recebe tratamento, demonstrem supressão viral. Acredita-se que quando esse cenário for alcançado e superado, haverá melhor monitoramento de pessoas com HIV e, consequentemente, redução em sua transmissão.
A cura para a AIDS
A cura para a AIDS vem sendo um grande desafio nesses últimos 40 anos. Existem estudos que buscam encontrar uma vacina para prevenir novas infecções, bem como, a busca por tratamento capaz de eliminar o vírus HIV de pessoas infectadas. Há dois tipos de cura que podem ser alcançadas: esterilizante ou funcional.
A cura esterilizante está ligada ao estéril, ou seja, nesse tipo há a eliminação completa do vírus do HIV de pacientes infectados. Já a cura funcional é aquela em que não há eliminação do vírus do corpo do indivíduo, mas são utilizados mecanismos moleculares e imunológicos do hospedeiro para impedir que o vírus latente volte a se replicar. Um exemplo de mecanismo molecular que pode ser usado no tratamento do HIV é o CRISPR.
Até o momento, há o registro de três pacientes que tiveram cura esterilizante de HIV/AIDS. Essas pessoas tinham, além do HIV, leucemia e necessitaram de transplante de medula óssea. Já sabendo que algumas pessoas são “geneticamente imunes” ao HIV, pois suas células não possuem uma proteína essencial para que o vírus penetre, foram selecionadas medula óssea de indivíduos com essa mutação.
HIV/AIDS no Brasil
O Brasil, mesmo sendo um país em desenvolvimento, por muito tempo foi referência no tratamento e na prevenção contra HIV/AIDS. Isso porque, políticas públicas adotadas possibilitaram grande disseminação de conhecimento sobre o tema e acesso de tratamento a todos através do Sistema Único de Saúde (SUS).
O acesso de todos ao tratamento e a prevenção bancados pelo Estado é uma medida positiva para a população, porém, é financeiramente preocupante para o Estado. A quantidade de pessoas vivendo com HIV cresce a cada ano, mesmo que de forma mais lenta, e, com isso, os gastos para bancar o tratamento também. Em 2019, investimentos em medidas para conter a propagação do HIV foram reduzidos, contribuindo para que, nos últimos anos, o crescimento de novas infecções anuais por HIV tenha sido maior que em anos anteriores.
A luta contra o HIV/AIDS é global e o Brasil foi um dos países destaque, principalmente quando comparado com os de mesmo nível econômico. Hoje, é importante que voltemos a trazer esse tema com o seu devido valor, pois mesmo que em menores níveis, o HIV/AIDS continua matando pessoas em todo o mundo. Ainda não temos uma forma de evitar a contaminação sem ser pelo uso de preservativos (a não ser que seja uma medida de emergência, como o PEP) e nem um tratamento capaz de curar as pessoas portadoras do HIV. Independente da situação atual, projetos que levem informação à população seja nas escolas, centros de saúde e na mídia devem ser desenvolvidos e são importantes para auxiliar no controle da disseminação do HIV.
Cite este artigo:
LOPES, N. R. O cenário brasileiro no enfrentamento da pandemia de HIV/AIDS. Revista Blog do Profissão Biotec, v.9, 2022. Disponível em: <https://profissaobiotec.com.br/o-cenario-brasileiro-no-enfrentamento-da-pandemia-de-hiv-aids/>. Acesso em: dd/mm/aaaa.
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