Sequenciamentos de 3ª e 4ª geração: ao infinito e mais além!

Um dos fatores notáveis que destacam a biotecnologia dentre as ciências é a velocidade com que avança, sempre a passos largos e sem parar. E com as tecnologias de sequenciamento de DNA não tem sido diferente, você pode conhecer o começo dessa história no excelente texto de Larissa Fonseca: A história do sequenciamento de DNA: ao infinito e além.

Em relação ao caminhar das tecnologias de sequenciamento, podemos dizer que passamos até então por quatro gerações, a começar nos anos 70, com o sequenciamento de Sanger em gel eletroforético.

1ª Geração: Sanger e Sanger automatizado

Apesar de ser uma das primeira técnicas de sequenciamento de DNA, o método de sequenciamento de Sanger é utilizado até hoje, de forma automatizada, como proposto pela primeira vez em 1986 pela empresa Applied Biosystems.

Resumidamente, o método de sequenciamento automatizado de Sanger consiste na incorporação de nucleotídeos modificados que interrompem a polimerização em uma reação de PCR. Esses nucleotídeos modificados, os ddNTP, também são fluorescentes, o que permite que a leitura das emissões dos fragmentos marcados, em diferentes cores, de modo que façam inferência para as posições das bases ao longo do sequenciamento.

Hoje em dia o Sanger é utilizado quando é necessária alta confiabilidade do sequenciamento, no entanto, é utilizado para fragmentos de poucos pares de base. Apesar de ser um método preciso, demanda bastante tempo.

2ª Geração: Técnicas de Shotgun

Os sequenciamentos de 2ª geração foram lançados com a proposta inovadora de decifrar longas sequências a partir do sequenciamento de frações menores, seguido da montagem, ao invés de seguir em frente com longas sequências integradas que demandam um maior tempo e custo.

A técnica de Shotgun consiste na utilização de métodos para fragmentar sequências longas de nucleotídeos, utilizando enzimas de restrição ou mesmo métodos físicos como sonicação (também chamada de construção de bibliotecas de nucleotídeos). Além de esta técnica ser muito mais ágil, o sequenciamento de pequenos fragmentos também é bastante preciso.

Após o sequenciamento, as pequenas leituras (short reads) são sobrepostas para que a sequência original seja remontada. Muitas vezes, o pedaço que falta em um pequeno segmento se complementa o pedaço que há em outro. Sendo assim, a grande quantidade de segmentos somada à profundidade de sobreposição possibilita maior confiabilidade da sequência remontada.

Esquema do sequenciamento de DNA
Fonte: Autoral

A técnica de shotgun foi utilizada pela primeira vez no sequenciamento do vírus do mosaico do couve-flor, em 1981. A partir daí, esta técnica passou a ser amplamente utilizada, sendo decisiva sobretudo para acelerar o andamento do projeto genoma humano, onde houve destaque aos trabalhos desenvolvidos pelo grupo do pesquisador Craig Venter. Por defender que a tecnologia de Shotgun seria decisiva na corrida de sequenciar o genoma humano, Venter investiu intensamente em tecnologias de montagens de reads, o que possibilitou ultrapassar os esforços de diversos grupos em cooperação internacional na época, publicando ao fim seu trabalho: The Human Genome – Science, 2001, que foi capa da revista.

3ª Geração: Preparo simplificado da amostra

Desde então, novos métodos de sequenciamento vêm sendo desenvolvidos, resultando em  sequenciadores cada vez mais sofisticados. A terceira geração, com destaque ao Pirosequenciamento (454 da Roche), baseado em semicondutor (Ion Torrent), e sequenciamento baseado em cores (Illumina), consiste em sequenciadores de método shotgun que pulam a etapa de PCR no preparo prévio da amostra, pois essa etapa está incluída na estratégia de sequenciamento automatizado.

454 – Roche:

No pirosequenciamento, utilizando o 454 da Roche, a construção da sequência ocorre pela emissão de fluorescência devido a liberação de pirofosfato, ao passo que são adicionados nucleotídeos (em uma PCR). Inicialmente a amostra de DNA fragmentado é ligada a sequências de nucleotídeos conhecidas como “adaptadores”. Esses adaptadores são ligados a microesferas (Beads), as quais são alocadas em pequenos sítios individuais (Clusters) no chip de sequenciamento, onde acontece a etapa de amplificação e emissão de fluorescência em tempo real. – Vídeo: Pirosequenciamento.

Pontos positivos e negativos:

Foi a primeira máquina de sequenciamento NGS lançada em 2005, e uma tecnologia facilitadora para muito disseminada até meados de 2007. Apesar da inovação que foi trazida ao mercado com o 454, o aparelho apresenta alta taxa de erros no sequenciamento e foi rapidamente substituída por outros tipos de sequenciadores.

Ion Torrent:

O modo como ocorre o sequenciamento com semicondutor, usando IonTorrent, lembra a metodologia aplicada com o 454 da Roche. Inicialmente a amostra de DNA é fragmentada e acoplada a adaptadores, os quais são ligados à beads e distribuído em clusters. No entanto, ao longo da amplificação são oferecidos e lavados dNTPs, um por vez, e é detectada ou não a variação de pH na base de cada cluster, reportando no caso, se houve ligação do dNTP naquela posição (por liberação de H+) ou não. Se for oferecido por exemplo dATP e não ligar, o dATP é lavado e é oferecido o dTTP, que relata uma mudança no pH equivalente a 1 ponto, então significa que naquela posição foi adicionado uma timidina. – Vídeo: Sequenciamento com semicondutor.

Pontos positivos e negativos:

Possui acurácia superior ao 454-Roche, no entanto o erro ainda é acentuado, sobretudo em sequências de longa repetição de nucleotídeos. Por exemplo, não há como ter tanta certeza se em um determinada região haviam 4, 5, 6 ou mais timidinas em sequência.

Illumina:

No sequenciamento baseado em cores, usando Illumina, os fragmentos ligados a adaptadores são distribuídos por chips de leitura onde ocorre a amplificação. A amplificação segue uma dinâmica de formação de “pontes” pela ligação dos adaptadores ao chip, formando assim os “sítios de leitura”. Cada dNTP adicionado emite uma luminosidade específica, que é utilizada na interpretação e construção da sequência das reads. Vale ressaltar que em todos os métodos de terceira geração, deve ser feita a remoção das sequências adaptadoras na montagem das contigs por sobreposição das reads. – Vídeo: Sequenciamento baseado em cores.

Pontos positivos e negativos:

Atualmente o illumina tem sido o método mais utilizado, devido à alta acurácia, tem possibilitado grandes sequenciamentos com alta precisão. Mesmo assim, não tem desmerecido outros métodos de sequenciamento, a exemplo do Sanger automatizado, que também é altamente preciso e é utilizado até hoje para pequenos segmentos.

4ª Geração: sequenciamento portátil

Mais recentemente, já se assume que entramos na quarta geração de sequenciamento, graças ao advento dos sequenciadores portáteis, que foram apresentados pela primeira vez com o MinION da Oxford Nanopore (sequenciador/pendrive). Essa tecnologia foi desenvolvida para o trabalho em campo e tem ganhado muito espaço não apenas pela portabilidade mas também pela robustez dos sequenciamentos. A tecnologia do MinION possibilita o sequenciamento de pequenos e longos fragmentos a partir da construção de bibliotecas de nucleotídeos. Os fragmentos são passados por proteínas canais em um chip, também chamado de Flow cell, por onde a amostra passa. Enquanto os fragmentos atravessam os canais, são emitidas variações na corrente elétrica da Flow cell que permitem o tipo de nucleotídeo que passou, formando assim as reads. – Vídeo: Sequenciamento portátil da Oxford Nanopore.

A partir do ano de 2016, a Fiocruz deu início ao Projeto ZIBRA, coordenado pelo professor Luiz Alcântara, que teve como intuito ampliar consideravelmente o banco de sequências de genoma completo do Zika vírus. O Projeto ZIBRA foi conduzido a campo em um laboratório/ônibus, o que possibilitou percorrer o território nacional coletando amostras de pessoas infectadas e as sequenciando com o MinION. A partir do projeto original, houve expansões para o sequenciamentos de outras arboviroses emergentes, como o vírus Chikungunya e o vírus da Febre amarela, o que tem gerado trabalhos muito relevantes para a vigilância desses agente patológicos.

Então, fazendo um apanhado, nós acompanhamos a evolução das técnicas de sequenciamento, vimos como surgiu o primeiro sequenciador e como os sequenciadores de nova geração (Next Generation Sequencing – NGS) trouxeram inovações para reduzir do tempo de processamento e aumentar a capacidade de sequenciamento. Importante lembrar que essas inovações trazem também uma considerável redução no valor do sequenciamento, tornando a técnica mais acessível. Pensando agora um pouco além dessas características, além de considerar a portabilidade trazida com o sequenciador de 4º geração, o que mais podemos esperar dos sequenciadores de geração futura?! Compartilhe com amigos ;).

Perfil de Rafael
Texto revisado por Carolina Bettker Thais Semprebom

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