Imagine que uma máquina do tempo permitisse que voltássemos para o ano 1700.
Caso isso fosse possível, perceberíamos um mundo bem diferente do que temos hoje. Não veríamos diversos carros andando pelas ruas e expelindo os gases resultantes da queima dos combustíveis. Não veríamos as pessoas carregando suas mercadorias em embalagens plásticas – os alimentos costumavam ser embalados em papéis ou tecidos. Se quiséssemos comprar remédios, iríamos à pequena farmácia local, onde o boticário os produziria manualmente, a partir de extratos de plantas e animais.
A revolução industrial transformou o mundo. A produção dos bens de consumo, que antes era feita de forma manual, para a população local, em pequena escala e sem a utilização de maquinário pesado, transformou-se em uma produção globalizada, automatizada e em larga escala; o desenvolvimento industrial passou a ter grande influência no desenvolvimento econômico-social de um país.
O mundo certamente mudou.
Entrando novamente na máquina do tempo e voltando para 2019, nos deparamos com vários desafios da sociedade moderna, decorrentes dessa mudança – e não podemos varrê-los para debaixo do tapete: ao mesmo tempo em que precisamos produzir mais alimentos para atender à população que cresce e envelhece cada vez mais, precisamos reduzir o desperdício de alimentos e a geração de resíduos, como os plásticos de origem petroquímica, ou em pouco tempo haverá mais plásticos nos oceanos do que peixes.
Os automóveis deverão continuar circulando pelas vias urbanas, mas não poderão expelir gases que sejam tóxicos a ponto de tornar a vida em grandes centros insustentável. Novos fármacos deverão ser desenvolvidos para tratar as doenças emergentes. Temos que produzir mais e mais, sem deixar de pensar no destino de toda esta produção ao final do seu ciclo de vida.
O grande desafio da nossa geração é continuar crescendo, mas de maneira a não comprometer a existência das gerações futuras.
E é aqui que a Biotecnologia entra em campo!
Uma ciência milenar mais atual do que nunca
A biotecnologia é uma ferramenta utilizada pelo homem há milhares de anos – antes mesmo de se chamar assim. Como o seu nome já indica, trata-se da utilização da vida para gerar produtos e processos de interesse para o homem. Por meio dessa arte, mais especificamente da chamada “Biotecnologia Branca”, utiliza-se a natureza, principalmente os organismos vivos e as enzimas, para produzir insumos para diversos setores industriais, como alimentício, farmacêutico, têxtil, energético, materiais e polímeros, entre outros.
A beleza dessa ciência no jogo do desenvolvimento sustentável está no fato de que, ao contrário dos processos químicos, tradicionalmente utilizados nas indústrias, a utilização de enzimas e micro-organismos permite, de maneira geral, a formação de produtos que geram menos resíduos, utilizam menores quantidades de água em sua produção e sejam mais facilmente degradados (processos ambientalmente amigáveis), e também aumenta o rendimento dos processos e diminui o requerimento de energia. A gente já falou aqui sobre o papel da Biotecnologia para alcançar os Objetivos do Desenvolvimento Sustentável na Agenda 2030, um plano de ação lançado pela ONU em 2015 para para erradicar a pobreza e proteger o planeta.
A biotecnologia do dia-a-dia
É por meio da fermentação, um dos principais processos biotecnológicos industriais, que podemos degustar o queijo e o iogurte do café da manhã, o vinho do almoço e a cerveja do happy hour. O melhoramento das espécies de leveduras utilizadas nesses processos permite, por exemplo, o desenvolvimento de novos produtos ou a melhoria das técnicas já existentes, reduzindo o tempo de fermentação e aumentando sua produtividade.
A produção de biocombustíveis é outro exemplo incrível de aplicação da biotecnologia: o etanol, um dos biocombustíveis mais utilizados atualmente, é produzido a partir da fermentação de matérias-primas de origem biológica, como a cana-de açúcar, o milho ou a beterraba. A grande vantagem é que essas matérias primas, genericamente chamadas de biomassa, são renováveis, o que não acontece com combustíveis fósseis; além disso, a geração de CO2 na produção dos biocombustíveis é mais favorável, pois as matérias-primas utilizam essa molécula durante o seu crescimento.
Produção de vacinas, antibióticos e vitaminas; utilização de micro-organismos para tratamento do esgoto doméstico; produção de plásticos biodegradáveis a partir de biomassa… até mesmo os resíduos agroindustriais deixam de ser uma grande dor de cabeça devido ao seu difícil descarte e passam a ser matérias-primas mais baratas e abundantes para diversos processos, como já explicamos no nosso vídeo sobre Economia Circular e aqui também. A lista de aplicações científicas é gigantesca, e cresce a cada dia!
O potencial infinito da natureza
A gama de possibilidades da utilização das ferramentas da biotecnologia para uma produção sustentável e competitiva é enorme. Podemos modificar os micro-organismos que já conhecemos por meio da engenharia genética, alterando seu metabolismo para maximizar a produção de compostos de interesse industrial, transformar a estrutura desses metabólitos para torná-los mais eficientes ou alterar as células produtoras para facilitar sua extração. Quando pensamos nos milhões e milhões de micro-organismos que ainda não foram descobertos, o potencial torna-se quase inimaginável.
A biotecnologia não só transforma os produtos que produzimos hoje, como permite a criação de tecnologias que nem imaginávamos há alguns anos. Utilizada de forma inteligente, ela será uma grande aliada para alcançarmos a tão almejada (e necessária) sustentabilidade, a qual – longe de ser somente uma palavra que está na moda – é o único caminho para o futuro.
Referências:
BIO. What’s Industrial Biotechnology?. Disponível em <https://www.bio.org/articles/what-industrial-biotechnology>. Acesso em 05/06/2019.
BRASIL ESCOLA. Disponível em <https://brasilescola.uol.com.br/geografia/biocombustivel.htm>. Acesso em 07/06/2019.
CEL. Disponível em < https://center4eleadership.org/sustainability/>. Acesso em 07/06/2019.
CiB. Como a biotecnologia pode ser aplicada à área de energia?. Disponível em <https://cib.org.br/faq/como-a-biotecnologia-pode-ser-aplicada-a-area-de-energia/>. Acesso em 07/06/2019.
EMBRAPA. Biotecnologia aplicada à agropecuária. Disponível em <http://www.cpac.embrapa.br/publico/usuarios/uploads/cursobiotec9/folder9ed2017.pdf>. Acesso em 07/06/2019.
HERZEFELD. Disponível em <https://fr.wikipedia.org/wiki/Fleuriste_artificiel#/media/Fichier:Blumenmanufaktur_Werkstatt.jpg>. Acesso em 08/06/2019.
PORTAL LEOUVE. Disponível em <https://www.google.com/search?q=queijo+e+vinho&source=lnms&tbm=isch&sa=X&ved=0ahUKEwiWjd_lkNviAhUlA9QKHXoeCwUQ_AUIECgB&biw=1366&bih=625#imgrc=67Cj-uCq70hGqM:> Acesso em 07/06/2019.
OUR WORLD IN DATA. Disponível em <https://ourworldindata.org/plastic-pollution#note-1> Acesso em 12/07/2019.
WWF. Disponível em <https://www.wwf.org.uk/fight-plastic-pollution>. Acesso em 12/07/2019
Palavra-chave: biotecnologia industrial, sustentabilidade, economia circular, reutilização de resíduos, aplicações da biotecnologia no dia-a-dia.