Anticorpos monoclonais são um tipo de anticorpo muito usados em terapias e diagnósticos. Os primeiros foram produzidos por meio do hibridoma.

Anticorpos são, por definição, proteínas produzidas pelo sistema imunológico de vertebrados em resposta a estruturas “estranhas”, que, em geral, são microrganismos causadores de doenças. Eles são caracterizados por sua capacidade de reconhecimento altamente específico a um antígeno (uma molécula “estranha” ao organismo) e por agirem, exclusivamente, sobre aquela molécula identificada. 

Por conta do seu reconhecimento específico a antígenos, foram desenvolvidos os anticorpos monoclonais (mAbs) que são, atualmente, muito utilizados em terapias, diagnósticos e pesquisas. O motivo dessa utilização e formas de produzi-los você vai entender no decorrer deste texto.

Breve história dos anticorpos

Os anticorpos nem sempre tiveram esse nome. O conhecimento acerca dessas glicoproteínas começou com a descoberta de Behring e Kitasato de uma substância no sangue capaz de neutralizar toxinas, no final do século XIX. Por isso, inicialmente foram classificados como “antitoxinas”, mas, com o avanço dos estudos, foi observado que essas proteínas eram capazes de responder a diferentes substâncias e, então, foram denominadas de  anticorpos.

Devido aos anticorpos terem se mostrado  moléculas muito importantes, vários estudos foram realizados para  entender como eram produzidos pelo sistema imune e para que poderiam ser utilizados. Em 1975, os cientistas já sabiam qual tipo de célula do corpo produz os anticorpos e desenvolveram a tecnologia de produção de hibridoma, que possibilitou a produção de mAbs

Um hibridoma é uma linhagem celular, produzida em laboratório, formada por fusão celular entre dois tipos distintos de células, sendo elas as células B (produtoras de anticorpos) e as células mutantes de mieloma (células cancerígenas capazes de se replicarem indefinidamente  na presença de substratos).

O que são anticorpos monoclonais?

Antígeno é uma molécula, que pode ser um microrganismo patogênico ou parte dele, que o sistema imune reconhece como estranha, não pertencente ao indivíduo. Devido a esse reconhecimento, o sistema imune irá induzir reações químicas para contenção ou eliminação do antígeno. No entanto, o antígeno costuma ser uma molécula muito grande para ser reconhecida por inteiro. As estruturas menores que compõem o antígeno e são reconhecidas pelos anticorpos são os epítopos. Sendo assim, a produção de anticorpos ocorre em resposta a epítopos de um antígeno, este último podendo conter um ou vários epítopos.

Antígeno linear com cinco diferentes epítopos. Contra cada um desses epítopos há a formação de um anticorpo específico para ele. #ParaTodosVerem: no esquema ilustrativo, há um antígeno linear em verde com cinco diferentes epítopos representados por cores e formatos diferentes. Para cada um desses epítopos há a representação de um anticorpo com a mesma cor do epítopo que ele reconhece. Fonte: a autora.

Anticorpos monoclonais são tipos de anticorpos que respondem a apenas um epítopo de um antígeno. Esses anticorpos, por se tratarem de clones, são capazes de reconhecer somente o epítopo que o anticorpo que foi clonado reconhece.

Representação de um anticorpo monoclonal. O anticorpo roxo que reconhece o epítopo roxo é clonado (cópias idênticas) originando vários anticorpos roxos aptos a identificar e responder ao mesmo epítopo roxo.  #ParaTodosVerem: um anticorpo roxo que responde ao epítopo roxo é clonado e origina vários anticorpos roxos que são capazes de responder somente ao mesmo epítopo do anticorpo original. Fonte: a autora

Para que são utilizados os mAbs?

Os mAbs são moléculas artificiais extremamente versáteis e que podem ser usadas em terapias (tratamentos), imunodiagnóstico, identificação tumoral e análise de marcadores. Essa versatilidade dos mAbs está diretamente relacionada à sua capacidade de reconhecer antígenos específicos a nível de epítopo. Exemplos de utilização dos mAbs incluem:

1. Imunodiagnósticos são testes que têm como objetivo detectar anticorpos, antígenos ou linfócitos (um dos tipos de células que compõem o sistema imune). Como exemplo desse tipo de teste se tem os imunoensaios, incluindo o ensaio imunossorvente ligado a enzima (ELISA). No ELISA sanduíche ou indireto, os mAbs são comumente utilizados para o reconhecimento de um outro anticorpo, normalmente, específico de uma espécie. Esse imunoensaio é amplamente utilizado na rotina laboratorial, pois é capaz de detectar doenças infecciosas, como por exemplo, a Covid-19.

2. Análise de marcadores é muito utilizada para definir/reconhecer diferentes tipos de células, assim como seu estágio de maturação. Isso porque células distintas expressam diferentes marcadores celulares em sua membrana, além de haver variedade de expressão a depender do nível de maturação em que a célula se encontra. Com o desenvolvimento dos mAbs, tornou-se possível diferenciar e identificar populações celulares que apresentavam características morfológicas similares, mas com expressão distinta de marcadores. Esses marcadores podem ser utilizados para, por exemplo, diferenciar os linfócitos T CD4+ (auxiliares) dos T CD8+ (citotóxicos), que são diferentes populações de células da resposta imune com mecanismos e funções diferentes.

3. Identificação tumoral foi aprimorada a partir da análise de marcadores celulares, pois com os mAbs é possível identificar qual origem de uma célula tumoral de um câncer em metástase, por exemplo. Isso ocorre devido aos marcadores característicos da célula tumoral de origem se manterem presentes mesmo após se difundirem pelo corpo. Os marcadores de identificação tumoral são usados para identificar a presença de células tumorais.

4. Os mAbs também são muito utilizados em terapias contra o câncer, em que são benéficos por reduzirem a ocorrência de efeitos colaterais. E isso acontece porque os mAbs são uma terapia alvo-específica e agem especificamente nas células que expressam o marcador característico. Os mAbs são utilizados também no tratamento de outras doenças como, por exemplo, a enxaqueca e a Covid-19.

A tecnologia do hibridoma

O desenvolvimento da tecnologia do hibridoma possibilitou a produção dos mAbs, pois permite gerar grande quantidade de anticorpos específicos contra um único epítopo de um antígeno. Essa técnica envolve a formação de células de mieloma fundidas com uma célula B e é capaz de produzir células híbridas que são preparadas para identificar um epítopo. Porém, um antígeno pode possuir mais de um epítopo e, para diferenciar os epítopos, é realizada a separação dos hibridomas de acordo com a sua especificidade. Feito isso, os hibridomas são submetidos aos processos de clonagem e propagação para que haja a formação de um grande volume de anticorpos específicos.

Representação esquemática da produção de anticorpos monoclonais pela tecnologia do hibridoma. Fonte: Imagem modificada de Frank lectures
#ParaTodosVerem: no esquema ilustrativo, um rato é submetido à imunização com um antígeno para que sejam removidas suas células B. Essas células são colocadas em meio de cultivo com células de mieloma para que ocorra a fusão celular. A etapa seguinte é a seleção dos hibridomas, seguindo-se para o isolamento de acordo com a sua especificidade. Esses produtos são clonados e propagados para, por fim, ser realizada a caracterização e o armazenamento de cada tipo de mAb produzido contra o antígeno administrado. 

Outras tecnologias para a produção de mAbs

A tecnologia do hibridoma foi a primeira desenvolvida e possibilitou a produção dos primeiros mAbs. Mas, atualmente, ela não é a única existente. Outras técnicas utilizadas para a produção de mAbs são:

  • Biblioteca de composição combinatória, em que os anticorpos produzidos e doados pelo homem têm a sequência de seus genes amplificados por transcrição reversa (RT-PCR) e, por fim, clonados em vetor (fagos, leveduras ou células de mamíferos).
  • Clonagem de célula B única, que consiste na seleção de um anticorpo por meio de citometria de fluxo e a amplificação da sequência dos genes do anticorpo por PCR. Por fim, os anticorpos produzidos são clonados em vetor.
  • Imortalização de células B de memória, em que as células B de memória são imortalizadas (tornam-se incapazes de morrer) pelo vírus Epstein-Barr e as células viáveis são subclonadas.
  • Cultura de células B de memória, que consiste no cultivo de células B de memória, seguido da amplificação dos genes dos anticorpos de interesse por PCR e clonagem em vetor.

O desenvolvimento dos mAbs foi muito útil para maior compreensão das células e para a identificação de  quando há algo de incomum nelas, sendo muito favorável a sua aplicação em diagnósticos e terapias. Por conta do seu benefício nas terapias, e por serem elas um dos seus principais usos, a produção de mAbs foi se aprimorando cada vez mais.

perfil Natalia Lopes
Texto revisado por Luísa Valério e Elaine Latocheski

Cite este artigo:
LOPES, N. R. Anticorpos monoclonais: tudo que você precisa saber. Revista Blog do Profissão Biotec, v.9, 2022. Disponível em: https://profissaobiotec.com.br/anticorpos-monoclonais-tudo-que-voce-precisar-saber/<>. Acesso em: dd/mm/aaaa.

Referências:

ABBAS, A. K.; LICHTMAN, A. H.; PILLAI, S. Imunologia Celular e Molecular. 8ᵃ Edição. Elsevier, 2015.
GAO, Y.; HUANG, X.; ZHU, Y.; LV, Z. A brief review of monoclonal antibody technology and its representative applications in immunoassays. Journal Of Immunoassay And Immunochemistry. Vol. 39, n. 4, 351–364, 2018. Disponível em: <https://doi.org/10.1080/15321819.2018.1515775> Acesso em: ago. 2021.
WALKER, L; BURTON, D. Passive immunotherapy of viral infections: ‘super-antibodies’ enter the fray. Immunology (Nature Reviews), 2018. DOI:10.1038/nri.2017.148. Acesso em: ago. 2021.
YAMADA, T. Therapeutic Monoclonal Antibodies. The Keio Journal of Medicine, 2011. DOI: 10.2302/kjm.60.37. Acesso em: ago. 2021.
Fonte da imagem destacada: News-medical.

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