Confira como é possível usar microrganismos ​​para produzir aromas e sabores usados em alimentos!

Olá pessoal, tudo bem com vocês? Espero que estejam todos bem! Acho que não sou a única que ama ficar em casa na companhia da família e desfrutar dos temperos caseiros que cada lar tem de especial.

Não há como negar que, de maneira geral, estamos nos tornando consumidores cada vez mais exigentes e no que se refere aos alimentos, as empresas  estão sendo  desafiadas a desenvolvê-los de forma que sejam nutritivos ao organismo, com sabor agradável e sem agredir ao meio ambiente. Destas características, uma das mais importantes é o sabor, pois de nada adiantaria ter disponível nas gôndolas dos supermercados um alimento altamente nutritivo, cujo processo produtivo é ecológico, porém com um sabor desagradável. Ninguém iria adquiri-lo.

Antigamente, a maioria dos sabores e especialmente dos aromas que conhecemos eram totalmente extraídos das plantas. Hoje, eles são produzidos quimicamente (processo petroquímico). Neste texto, darei dois exemplos de como a biotecnologia pode ser usada como ferramenta promissora no mercado do aroma e do sabor. 

Aroma

Vamos começar falando do aroma, e para isso vou citar a vanilina (molécula que dá à baunilha seu sabor característico) encontrada em refrigerantes, sorvetes, chocolates, bolos e vários outros alimentos. A vanilinaé produzida industrialmente por meio das moléculas precursoras  guaiacolp-cresol, sendo apenas 1%  proveniente da planta de baunilha propriamente dita. Além destes, na produção sintética da vanilina são consumidos vários outros compostos provenientes de fontes não renováveis.

Planta de baunilha, uma das mais utilizadas para saborizar alimentos. Também é usada para aromatizar ambientes. Fonte: Sitio da Mata, 2018

 Neste cenário, a biotecnologia apresenta algumas propostas interessantes, que podem revolucionar o mercado dos aromas com técnicas mais sustentáveis, por meio de compostos naturais como a vanilil-amina, por exemplo, que é extraída da pimenta. 

As pesquisas para se descobrirem caminhos mais viáveis para produção de aromas são antigas, como um artigo de 1997  que cita várias rotas para obtenção da vanilina. Entre elas, as vias metabólicas do ácido vanílico pelo fungo Pycnoporus cinnabarinus, o qual degrada o ácido ferúlico, um dos componentes da lignina,e que é  usado como molécula precursora para a produção biotecnológica da vanilina.  

Desde então, diversos outros fungos (p.e. Aspergillus niger) e bactérias (p.e. Pseudomonas sp.) têm sido estudadas quanto a capacidade de biodegradar o ácido ferúlico para obtenção rentável de vanilina. 

Foto: O fungo Pycnoporus cinnabarinus  não ocorre no hemisfério sul, porém é da mesma família que o Pycnoporus sanguineus, conhecido popularmente  como “orelha de pau” no Brasil Fonte: Wikipédia

A produção de compostos aromáticos por fermentação é também uma técnica rentável ao se utilizar alguns gêneros de bactérias, como o Amycolatopsis, que rende cerca de 11,5 g/L de vanilina pela fermentação microbiológica do ácido felúrico. 

Novos microrganismos  estão sendo investigados para a biotransformação de vanilina industrialmente, ao mesmo passo que diferentes vias de obtenção são testadas, seja pela ação endógena dos microrganismos, uso de enzimas específicas para facilitarem o processo ou com técnicas de biologia molecular para direcionar a engenharia metabólica de Escherichia coli para a produção de bioaromas a partir de glicose, por exemplo. 

Para que esse processo seja viável em escala industrial, ainda é necessário descrever uma metodologia de biotransformação rentável e viável, cuja etapa de transformação de um substrato ou a síntese de produtos pela fermentação seja possível em um controlado e aperfeiçoado processo técnico. 

Veja na tabela abaixo a relação de obtenção de aromas naturais produzidos por via biotecnológica:

Fonte: RODRIGUES et al., 2017.

Quer aprender mais sobre o assunto? Descubra como é a rota biotecnológica de produção de outros aromas neste texto.

Sabor do açúcar 

Não há como negar que o açúcar é um dos produtos mais procurados na indústria de alimentos, apesar de seu consumo excessivo causar danos à saúde como diabetes e/ou obesidade. No entanto, graças a biotecnologia existe a possibilidade de soluções alternativas baseadas em ciência!

Você provavelmente já ouviu falar em estévia, não é mesmo? Ela é uma planta cultivada na América do Sul que produz um adoçante não calórico 250 vezes mais doce que a sacarose, o açúcar da cana, porém assim como qualquer outra planta, é suscetível às alterações climáticas e sazonais, que interferem na sua disponibilidade para o mercado. 

Foto: Planta de Estévia: Stevia rebaudiana, nativa do Brasil e Paraguai, cujas folhas têm um princípio adoçante natural muito potente. Fonte: Greenme.

Atualmente, encontra-se disponível no mercado o EverSweet, um adoçante vendido aos fabricantes de alimentos e bebidas, inspirado na estévia, feito de duas moléculas-chave – Reb M e Reb D – ( nomes comerciais das moléculas que dão à estévia sua doçura) e que não afeta os níveis de glicose no sangue e é bem tolerado por pessoas com diabetes. 

O grande diferencial do EverSweet é que ao invés de ser obtido pela planta cultivada na natureza, ele foi produzido totalmente em laboratório por fermentação! Neste processo, adiciona-se uma levedura geneticamente modificada a um tanque de fermentação, e estairá converter o substrato em açúcares simples e após o processo, a levedura usada para produzir o adoçante é completamente filtrada e removida.

A empresa suíça Evolva também está desenvolvendo um método biológico para extrair, a partir de plantas, compostos naturais que podem ser usados ​​como adoçantes. É importante ressaltar que é mais difícil substituir o açúcar em alimentos sólidos, uma vez que ele desempenha um papel na textura: escurece, carameliza e cristaliza os alimentos. Para superar esse desafio, a empresa está pesquisando compostos naturais em plantas de beterraba que possuem uma estrutura química semelhante à do açúcar. 

Ao passo que a demanda por alternativas mais saudáveis e ecológicas crescem, a biotecnologia estará cada vez mais presente nos alimentos que ingerimos. Entretanto, um dos principais entraves é o preço, uma vez que majoritariamente os métodos químicos foram otimizados para produzir moléculas de sabor com alta demanda e custos extremamente baixos; em contrapartida, o desenvolvimento de alternativas biotecnológicas inovadoras requer um investimento significativo. 

Nós do Profissão Biotec acreditamos que com o avanço das pesquisas essas barreiras serão superadas e iremos nos surpreender, e muito, com as inúmeras possibilidades benéficas oriundas da biotecnologia. E você o que achou sobre esse assunto? Siga nossas redes sociais para conhecer muito mais sobre biotecnologia!

Texto revisado por Bianca Chaves e Natália Videira
REFERÊNCIAS:
TEXTO INSPIRADOR: https://www.labiotech.eu/in-depth/natural-flavors-biotech-industry/.
Chiappini, C.C.J. Aromas naturais produzidos por microrganismos, Revista eletrônica de jornalismo científico: Com Ciência, 2007. Disponível em: http://www.comciencia.br/comciencia//handler.php?section=8&edicao=28&id=325. Acesso em: 02/07/2020.
Daugsch, A.; Pastore, G. Obtenção de vanilina: oportunidade biotecnológica. Química Nova, v.28, n.4, p.642-645, 2005. 
Gallage, N.J.; Møller, B.L. Baunilha: o sabor mais popular. Biotecnologia de produtos naturais, 3-24, 2017.
Janssens, L., De Pooter, H.L, Schamp, N.M.; Vandamme, E.J. Produção de sabores por microorganismos. Process Bioquímica, v.27, n.4, p.195-215, 1992.
LESAGE-MEESSEN, L.; HAON, M.; DELATTRE, M.; THIBAULT, J.F.; CECCALDI, C. e ASTHER, M. An attempt to channel the transformation of vanillic acid into vanillin by controlling methoxyhydroquinone formation in Pycnoporus cinnabarinus with cellobiose. Applied Microbiology and Biotechnology, n. 4, p. 393-397, 1997.
RODRIGUES, Cristine; OLIVEIRA, Juliana de; BIER, Mario César Jucoski; ROSSI, Suzan Cristina; CARVALHO, Julio César de; VANDERBERGHE, Luciana Porto de Souza; SPIER, Michele Rigon; MEDEIROS, Adriane Bianchi Pedroni; SOCCOL, Carlos Ricardo; “Bioprocessos na produção de aditivos alimentares”, p. 249 -282. In: Biotecnologia Aplicada à Agro&Indústria – Vol. 4. São Paulo: Blucher, 2017.

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