No final de dezembro de 2019, foi reportado em Wuhan, na China, a ocorrência de uma síndrome respiratória aguda grave que estava causando internamentos por insuficiência respiratória. O causador dessa síndrome ainda era desconhecido. Mas, logo identificou-se que essa síndrome era causada por um novo coronavírus, até então desconhecido. Esse vírus ficou conhecido como SARS-CoV-2, causador da doença Covid-19.
O SARS-CoV-2 espalhou-se rapidamente pelo globo devido a sua alta capacidade de transmissão. Com menos de 100 dias após o primeiro caso reportado, já haviam sido registrados mais de 1 milhão de casos no mundo. A quantidade de pessoas doentes que necessitavam de internação causou sobrecarga do sistemas de saúde em diferentes países durante os picos de infecção.
A contenção da dissipação do vírus, inicialmente, só era possível com o distanciamento social, uso de máscara e constante lavagem das mãos. No entanto, no final de 2020, as primeiras vacinas começaram a ser aprovadas para uso na população. Com isso, surgiu a esperança da situação pandêmica ser controlada.
O início da COVID-19 e a identificação do vírus
Em janeiro de 2020, ocorreu a identificação do agente causador da síndrome de insuficiência respiratória aguda grave, através do sequenciamento genético. Esse agente foi denominado SARS-CoV-2 por apresentar alta similaridade com o coronavírus SARS-CoV que causou epidemia no início dos anos 2000. No entanto, o novo coronavírus apresenta maior capacidade de transmissão, mas menor letalidade do que o SARS-CoV.
A fim de controlar a disseminação do vírus, em meados de janeiro de 2020, a Organização Mundial de Saúde (OMS) publicou um guia com orientações para que os países supervisionassem o surto da Covid-19. Nesse guia recomendou-se: prevenir e controlar infecções, testagem laboratorial, supervisão clínica e vigilância de casos confirmados.
A finalização do sequenciamento genético do SARS-Cov-2, contribuiu imensamente para que o vírus fosse compreendido pelos cientistas. Com o sequenciamento, foi possível identificar in silico que havia 85% de homologia (semelhança) entre o SARS-CoV-2 (2019) e o SARS-CoV (2003). Isso facilitou encontrar quais os melhores candidatos à vacina tendo como base o SARS-CoV.
Os países que tinham casos confirmados de Covid-19 realizaram o sequenciamento do vírus para a análise e acompanhamento do genoma. O tempo médio para isso era de 15 dias, mas duas cientistas brasileiras realizaram-o em 48 horas.
O diagnóstico e a biotecnologia
O diagnóstico foi, por muito tempo, a ferramenta mais eficaz para controlar a disseminação viral. Isso porque, pessoas contaminadas devem ficar isoladas até não serem mais capazes de transmitir o vírus. Hoje, a forma mais eficaz contra o desenvolvimento de casos graves da doença é a vacinação.
Os testes para identificar se a pessoa estava ou não infectada pelo SARS-CoV-2 foram desenvolvidos após seu sequenciamento genético. Por ter conhecimento das estruturas do vírus e a importância delas durante o processo infeccioso e replicativo, foi possível determinar alvos com maior capacidade de detecção para o diagnóstico. Esses alvos são estruturas essenciais do vírus, pois são altamente conservadas e possuem alvos específicos para o SARS-CoV-2.
E como a biotecnologia contribuiu para o desenvolvimento dos testes diagnósticos? A definição de biotecnologia, segundo a Organização das Nações Unidas (ONU) é “qualquer aplicação tecnológica que utilize sistemas biológicos, organismos vivos ou seus derivados para fabricar ou modificar produtos ou processos para utilização específica”. Os testes mais conhecidos para a detecção de indivíduos com Covid-19 são: RT-PCR, ELISA e testes rápidos (imunocromatografia).
RT-PCR: Considerado o padrão ouro, sendo uma técnica de biologia molecular muito utilizada na biotecnologia. Uma das variações desse teste é o RT-LAMP.
ELISA: O teste de ELISA necessita de derivados do organismos vivos (o antígeno ou o anticorpo) para a sua confecção. Quando o ELISA possui antígeno em sua confecção ele irá identificar a presença de anticorpo contra o antígeno. O teste de ELISA é realizado em uma placa de 96 poços. Essa placa é sensibilizada (fixação de antígeno aos poços) para que haja identificação da presença de anticorpos contra o antígeno.
Testes rápidos: Os testes rápidos, também denominados de imunocromatográficos, são produzidos utilizando antígenos ou anticorpos. Quando possuem antígenos têm como objetivo a detecção da presença de anticorpos sendo realizados usando pequena amostra de sangue ou plasma. Quando feitos com anticorpos têm a capacidade de detectar a presença de antígeno, que, no caso do Covid-19, é necessária a utilização do swab nasal.
Os testes rápidos possuem pelo menos duas bandas. A banda do controle, normalmente denominada “C” e as bandas teste. A banda controle serve para validar o teste, pois caso ela não acenda significa que qualquer resultado obtido naquele teste é inválido, sendo necessária a realização de outro sem custo adicional.
Com o diagnóstico de pessoas contaminadas e o distanciamento social, observou-se redução no número de casos nos países que levaram as medidas de contenção a sério. Porém, isso também foi sendo revertido à medida em que as regras de isolamento tornaram-se menos rígidas.
Desenvolvimento das vacinas
No final de 2020, a OMS aprovou o uso de uma vacina a fim de prevenir a disseminação da doença e, consequentemente, reduzir o número de óbitos. O início da vacinação ocorreu em diferentes momentos ao redor do mundo: alguns países iniciaram a vacinação após autorização de seus órgãos de vigilância, enquanto outros aguardaram a liberação da OMS.
Considerando que os países com maior economia poderiam comprar boa parte das vacinas e causar atraso na vacinação de países com menor poder econômico, foi criado o COVAX. O COVAX é uma iniciativa da OMS, juntamente com outras instituições, que compra e distribui vacinas contra a Covid-19 aos países mais pobres. Isso porque, a OMS reconhece que para o controle efetivo da pandemia é necessário que todos os países tenham grande parte da população com o esquema vacinal completo.
Não existe uma vacina única contra a Covid-19, mas foram, e estão sendo desenvolvidas vacinas com diferentes tecnologias. As diferentes tecnologias demonstraram resultados positivos, não sendo possível determinar qual é o melhor tipo de vacina contra essa doença. O que mais impressiona é que foram desenvolvidas vacinas eficazes e seguras em tempo recorde, inferior a 1 ano. Isso só foi possível devido ao compartilhamento das informações das pesquisas.
O que mudou após a vacinação
O avanço da vacinação, que ocorreu primeiro nos países mais ricos, resultou na redução do número de casos e sua gravidade. Com isso, as medidas para evitar a propagação do vírus foram se afrouxando em alguns países, criando uma sensação de segurança e de que a vida iria “voltar ao normal”.
No entanto, a pandemia ainda não tem “uma data para acabar”. E isso ficou nítido com o surgimento da nova variante, a ômicron. Essa variante é altamente transmissível (capacidade ainda maior de infectar pessoas) e está causando aumento no número de casos em todo o mundo. No entanto, devido às características intrínsecas da variante e do aumento dos índices de vacinação, boa parte dos casos de contaminação pela ômicron são leves e não necessitam de internação hospitalar. Mais de 60% dos indivíduos que, atualmente, desenvolvem casos moderados a graves são pessoas que não se vacinaram ou não completaram o esquema vacinal.
A situação atual demonstra que a aplicação da biotecnologia na produção de vacinas está contribuindo para o controle da pandemia. Não só reduzindo o número de casos, mas também contribuindo para que, caso a pessoa se infecte, ela tenha menores chances de desenvolver sintomas graves. Isso faz com que muitas vidas sejam poupadas.
A pandemia da Covid-19 demonstra como a biotecnologia, e suas aplicações, têm sido fundamentais para identificação, diagnóstico e prevenção da doença. Sem a biotecnologia o número de testes disponíveis seria muito restrito, dificultando o diagnóstico, e não teríamos a principal ferramenta para voltarmos ao normal, as vacinas.
Cite este artigo:
LOPES, N. R. Como os avanços biotecnológicos influenciaram a pandemia de Covid-19. Revista Blog do Profissão Biotec, v.9, 2022. Disponível em: <https://profissaobiotec.com.br/como-os-avancos-biotecnologicos-influenciaram-a-pandemia-de-covid-19/>. Acesso em: dd/mm/aaaa.
Referências
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IODETA, P. A. A combinação de fatores que deixa Brasil e América do Sul mais protegidos contra a ômicron. BBC News Brasil (2022). Disponível em: <https://www.bbc.com/portuguese/brasil-59917056>. Acesso em: 9 jan. 2022.
(MAJUMDER; MINKO, 2021) Recent Developments on Therapeutic and Diagnostic Approaches for COVID-19. The AAPS Journal (2021). Acesso em 01 jan. 2022. DOI: 10.1208/s12248-020-00532-2
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