Computadores Quânticos: Como a biotecnologia irá se beneficiar desta inovação?

Os computadores quânticos surgiram em 1981. No entanto, de forma nunca antes vista, essa tecnologia se mostra uma promissora protagonista de nosso futuro.

Diversas descobertas tecnológicas durante toda a história promoveram avanços astronômicos nos mais variados campos da Ciência. A descoberta da penicilina, em 1928, permitiu o combate de doenças causadas por bactérias e foi o passo inicial para o descobrimento de outros fármacos. Já o desenvolvimento da internet permitiu uma revolução na forma de se compartilhar conhecimento e gerar inovações.

Nos últimos tempos, outra tecnologia possui a responsabilidade de levar a Ciência a alcançar novos patamares: os computadores quânticos. As máquinas quânticas são dispositivos capazes de executar cálculos fazendo uso direto de propriedades da mecânica quântica. Sua grande vantagem é a velocidade com que consegue processar informações e realizar cálculos algébricos em relação à computação contemporânea.

Um computador quântico no centro em forma de um cilíndro de cabeça para baixo

Fotografia do computador quântico finlandês criado pela empresa IQM.#Paratodosverem: A fotografia apresenta um computador quântico no centro em forma de um cilíndro de cabeça para baixo. Ele apresenta compartimentos e fios dourados, além de uma estrutura metálica brilhante. Fonte: Ragsxl/Wikimedia Commons

Com isso, um novo horizonte se abriu na Ciência em geral. As áreas que dependem diretamente da computação aguardam o desenvolvimento dessas inovações com a esperança de que a humanidade avance décadas de pesquisa em pouquíssimo tempo. A biotecnologia, em específico, se aproveitará dessa inovação para aprimorar o desenvolvimento de novos fármacos e análises moleculares.

O que são computadores quânticos?

Tudo começou em 1981, quando Richard Feynman, um dos mais incríveis físicos teóricos que o mundo já viu, elaborou a primeira proposta de utilizar um fenômeno quântico para executar rotinas computacionais.

Essa mecânica quântica utilizada por Feynman afirma que é possível que uma partícula esteja em dois ou mais estados ao mesmo tempo, o que é conhecido como superposição. O exemplo do gato de Schrödinger e o princípio de Heisenberg nos provam que, até que seja observada a real posição daquilo que se quer analisar, nunca saberemos seu real estado. Basicamente, essa é a teoria que permeia o desenvolvimento de computadores quânticos. 

Físico Richard Feynman
Fotografia de Richard Feynman tirada durante sua passagem pelo Massachussets Institute of Technology (MIT), nos Estados Unidos. #Paratodosverem: A fotografia apresenta o físico Richard Feynman no centro utilizando camisa social. Seu cabelo é longo e chega próximo aos ombros. Ele parece estar explicando algo para alguém. Fonte:: Uuganmn/Wikimedia Commons.

Em computadores convencionais, a memória é feita de bits. Cada bit é representado por “1” ou “0” de informação. No entanto, um computador quântico apresenta um conjunto de qubits, que podem representar tanto um “1”, um “0” ou uma sobreposição de ambos. Ou seja, o valor apresentado pode ser um “1” e um “0” ao mesmo tempo, permitindo, assim, uma maior capacidade de variabilidade de resultados.

Em um primeiro contato, entender como essas máquinas funcionam pode ser bem difícil. Dessa forma, a fim de facilitar a compreensão, aqui vai um exemplo: Imagine que dois computadores são colocados sobre uma mesa: um utiliza física quântica em seu processamento e o outro não. Ambos possuem a missão de resolver um labirinto extenso e com somente uma saída.

Dessa forma, enquanto o computador convencional realizará um caminho diferente por vez até encontrar o correto, o computador quântico testará todas as possibilidades possíveis de saída ao mesmo tempo. Com isso, supondo que o primeiro resolva o problema em 30 minutos, o segundo irá achar uma resposta em menos de 1 minuto.

Esses processadores quânticos podem ser construídos a partir de átomos que podem estar excitados e não excitados ao mesmo tempo (como, por exemplo o de silício), com fótons, prótons e nêutrons que podem estar em dois lugares simultaneamente. Os elétrons e pósitrons que podem ter estados de spin ao mesmo tempo “para cima” e “para baixo” também podem ser utilizados para a construção dos processadores.

Dispositivo dourado
Os físicos do National Institute of Standards and Technology (Instituto Nacional de Padrões e Tecnologia) usaram esse aparelho para persuadir dois íons de berílio (átomos eletricamente carregados) a trocar as menores unidades mensuráveis ​​de energia de um lado para o outro, uma técnica que pode simplificar o processamento de informações em um computador quântico. #Paratodosverem: Dispositivo dourado, quadrado, preso por parafusos, com cabos elétricos que se ligam a ele e com ranhuras de circuitos elétricos, semelhante a um processador de computador. Fonte: National Institute of Standards and Technology/Wikimedia Commons.

A biotecnologia e a computação quântica

Agora que entendemos um pouco mais sobre o funcionamento dessa tecnologia, podemos relacioná-la ao seu uso biotecnológico na indústria e como essa área se beneficiará a partir do momento em que esses computadores forem comercializados.

Os computadores quânticos permitirão uma progressão nunca antes vista na descoberta, produção e desenvolvimento de medicamentos, dando aos cientistas a capacidade de combater doenças que atualmente são incuráveis. Veja alguns exemplos:

1 – Criação de modelos 3D mais complexos

A criação de modelos 3D com maior acurácia e complexidade, que aproximem os dados dos estudos da realidade humana. Por exemplo, um modelo ideal de cérebro poderia fazer com que nós entendêssemos as doenças neurodegenerativas, como o Alzheimer, de forma mais clara.

2 – Obtenção de medicamentos de forma mais rápida

Com seu poder de processamento extremamente alto, essas máquinas também poderão revisar simultaneamente várias moléculas, proteínas e produtos químicos por meio de simulação quântica – algo atualmente inatingível com um computador padrão – permitindo que opções de medicamentos sejam desenvolvidas de forma mais rápida e eficaz do que hoje.

O desenvolvimento de medicamentos é o processo de trazer uma nova molécula de medicamento para a prática clínica. Em sua definição mais ampla, isso engloba todas as etapas desde o processo de pesquisa básica para encontrar um alvo molecular adequado até o apoio ao lançamento comercial do medicamento. #Paratodosverem: A imagem apresenta diversos tipos de medicamentos com cores e formatos diferentes. Eles estão empilhados de forma bagunçada. Fonte: Myriam Zilles/Unsplash.

Atualmente, o tempo de desenvolvimento médio de um medicamento, da descoberta ao lançamento, é superior a 10 anos e seu custo varia entre 1,5 a 2,5 bilhões de dólares. Desde a parte pré-clínica até os ensaios em humanos, o processo passa por etapas que exigem grandes análises de dados em diversas circunstâncias e é nesse momento que os computadores quânticos poderão ser utilizados.

3 – Química quântica

Gigantes da tecnologia como IBM e Microsoft apontam para a química como a primeira aplicação para a computação quântica. Certamente, a química tem muitas possibilidades de aplicação da bioinformática. A química quântica também tem aplicações na agricultura e epigenética e em muitas outras disciplinas. Com o desenvolvimento desta área, poderemos projetar novos materiais, entender interações catalíticas e interações moleculares.

4 – Estudo de DNA e proteínas

Além disso, poderemos continuar em nosso caminho de desenvolver terapias direcionadas ao câncer investigando os segredos das proteínas e do DNA. Essas máquinas nos permitiriam mapear as proteínas em sua totalidade, assim como fazemos com os genes.

Os cientistas Remo Rohs e Daniel Lidar demonstraram que um processador quântico pode ser usado como uma ferramenta preditiva para avaliar um processo fundamental em biologia: a ligação de proteínas reguladoras de genes na molécula de DNA . Este é um dos primeiros exemplos documentados em que um processador quântico físico foi aplicado a dados biológicos reais. A pesquisa foi realizada em uma máquina D-Wave Two X no USC Information Sciences Institute (Instituto de Ciências da Informação da USC).

Um passo chave na transcrição do DNA é a ligação de uma proteína. No entanto, o evento de ligação acontecerá apenas quando certas condições forem atendidas: uma sequência específica das letras do alfabeto do DNA (adenina, timina, guanina e citosina) e apenas no local certo em uma fita de DNA conhecida como sítio de ligação. Um possível sítio de ligação só é funcional em menos de um por cento das circunstâncias. Dessa forma, para testar todas as possibilidades de forma rápida, foi necessário muito estudo e a implementação da computação quântica.

A molécula chamada ácido desoxirribonucleico ou DNA é um tipo de ácido nucleico, onde encontramos todas as informações necessárias para a síntese de proteínas e, por isso, ele é o responsável por armazenar todas as características de um indivíduo. #Paratodosverem: A ilustração representa o DNA dupla-fita em branco com pequenas bolinhas azuis. Fonte: Braňo/Unsplash.

5 – Identificação de alvos para tratamento de doenças

A computação quântica também pode ser útil na fase de identificação de alvos, permitindo uma exploração mais profunda de doenças multifatoriais complexas que exigem a modulação de vários alvos, podendo haver aplicações no desenvolvimento clínico.

Como resultado, o processo de produção de medicamentos se tornaria menos oneroso e custoso, o que permitiria desenvolvimentos em massa e combate à doenças de forma mais eficaz. 

Ninguém sabe ao certo quando a era da computação quântica irá começar. Temos todos os gigantes como Microsoft, IBM e Google investindo milhões de dólares em novas pesquisas. No entanto, há uma série de desafios técnicos na construção dessas máquinas em larga escala. Um dos maiores desafios envolvidos na construção de computadores quânticos é controlar ou remover a decoerência quântica. Isso geralmente significa isolar o sistema de seu ambiente, pois as interações com o mundo externo causam mudanças brutais no sistema.

Texto revisado por Jennifer Medrades e Ísis V. Biembengut

Cite este artigo:
ENRICI, A. W. Computadores Quânticos: Como a biotecnologia irá se beneficiar desta inovação? Revista Blog do Profissão Biotec, v.9, 2022. Disponível em: <https://profissaobiotec.com.br/computadores-quanticos-como-biotecnologia-beneficiar-desta-inovacao/>. Acesso em: dd/mm/aaaa.

Referências

DIANE. Advanced computing in pharma: 3 reasons why quantum computing could disrupt the pharma R&D. Disponível em: https://www.alcimed.com/en/alcim-articles/advanced-computing-in-pharma-3-reasons-why-quantum-computing-could-disrupt-the-pharma-rd/#:~:text=The%20development%20time%20of%20a,approved%20drugs%20for%20new%20applications. Acesso em: 12/02/2022.
KAAFARANI, Ali. Four Ways Quantum Computing Could Change The World. Disponível em:https://www.forbes.com/sites/forbestechcouncil/2021/07/30/four-ways-quantum-computing-could-change-the-world/?sh=4e3bc6864602. Acesso em: 11/02/2022.
LAPOLA, Marcelo. Como os computadores quânticos podem mudar o mundo que conhecemos. Disponível em: https://revistagalileu.globo.com/Ciencia/noticia/2021/12/como-os-computadores-quanticos-podem-mudar-o-mundo-que-conhecemos.html. Acesso em: 11/02/2022.
Fonte da imagem destacada: Unsplash.

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