Para celebrar o Dia do Profissional de Biotecnologia, continuamos trazendo conteúdos as diferentes aplicações da biotecnologia. A Inteligência Artificial (IA) é um tópico em alta. Logo você a associa a um software de GPS, mas sabia que ela pode acelerar vários processos biotecnológicos?

Nos últimos anos, tem se falado muito sobre o fato da inteligência artificial (IA) conquistar uma vaga em todas as possíveis áreas de estudo e trabalho. Mas afinal, o que ela é? Como ela pode auxiliar a biotecnologia? Neste texto, serão abordados alguns conceitos da IA e o que ela tem a oferecer às pesquisas biotecnológicas.   

Uma breve introdução ao conceito de Inteligência Artificial…

Inteligência Artificial é a ciência de fazer máquinas que não apenas pensam e agem como humanos, mas que aprendem e resolvem problemas. Essa área de conhecimento surgiu em meados da década de 1950, porém o sistema foi se aprimorando ao longo das últimas décadas, com o desenvolvimento de melhores algoritmos.

Entre uma de suas tecnologias, o Aprendizado de Máquina (Machine Learning, ou ML) se destaca. O ML utiliza uma série de dados iterados, brutos e seus resultados/outcomes e, com base nestes, constrói modelos preditivos. Entre suas abordagens, utiliza o modelo de Redes Neurais Artificiais (ou se preferir, Artificial Neural Networks) – sim! é isso que você está pensando mesmo: NEURAIS – esse método foi inspirado nas redes de conexões dos neurônios no cérebro.


Ilustração de Redes Neurais Artificiais. Nós múltiplos estão interconectados, assim como os neurônios. Os sinais de cada nó são transformados e chegam aos nós da próxima camada. As camadas entre os nós da camada de entrada (input layer) e de saída (output layer) são denominadas camadas escondidas (hidden layer(s)). Durante o treinamento da rede, os pesos de cada nó são ajustados. Fonte: HESSLER; BARINGHAUS, 2018.

Entre as aplicações gerais da IA, encontram-se o reconhecimento facial e de imagem (este, aliás, muito utilizado em novos métodos de diagnóstico por imagem), mapeamento (programas de GPS), e diversas outras.  

Inteligência Artificial na biotecnologia

Qual seria o papel da inteligência artificial no âmbito das ciências biotecnológicas? Sabe-se que esta área trabalha e gera  um grande número de dados (Big Data), dos quais se torna difícil a extração e o entendimento. Essa dificuldade se deve, em parte, à forma manual (ou humana) de seleção e análise dos dados (alô, Excel e Graphpad!) que, caso contrário, é analisada com ferramentas de bioinformática (o que requer conhecimentos em programação nas linguagens R e Python, pelo menos); mas também devido ao fato de que, com grande volume de dados, a rede se torna tão robusta que dificulta a extração daquilo que é relevante de fato.

Nesse contexto, a IA tem a capacidade de fazer o trabalho de uma forma mais rápida e barata, encontrando padrões muitas vezes invisíveis aos nossos olhos, ou captando-os de uma forma muito mais rápida, uma vez que ela é construída com base em algoritmos de análise de dados. A IA já está presente, entre muitas outras, nas seguintes aplicações:    

Predição de Interações Proteicas


    • O estudo das interações entre proteínas permite compreender as interações nos estados fisiológicos saudável e patológico. Assim, pode contribuir para o design de medicamentos. A partir da extração de um conjunto de dados, o ML pode construir padrões que serão base do seu aprendizado.       
Ilustração de interações entre moléculas.Fonte: 470906/Pixabay

Desenho de medicamentos

  • Neste caso, a tecnologia de IA tem o potencial de predizer tanto as propriedades (por exemplo, as físico-químicas e ADMET – absorção, distribuição, metabolismo, excreção e toxicidade)  quanto a atividade da droga, com base na sua estrutura. Isto é particularmente útil no desenho de novo (ou seja, algo que parte de um nada, é criado do zero, não pré-existe em outra forma) de medicamentos, já que se pode obter novas moléculas desenhadas de maneira customizada (do jeito que você quer!)    
Ilustração da variedade de medicamentos Fonte: stevepb/Pixabay

Análises pela literatura

Bakkar e colaboradores (2018) utilizaram o sistema IBM Watson para identificar novas proteínas ligantes ao RNA (ou RBPs – RNA binding proteins) associadas à uma doença neurodegenerativa esclerose lateral amiotrófica (ELA). Algumas dessas proteínas, de fato, se mostraram alteradas na doença via validações. O sistema realizou essa descoberta por meio do processamento (via análise de similaridades e criação de conexões) de resumos (ou abstracts) dos artigos científicos publicados. Esta abordagem (também chamada de Processamento de Linguagem Natural) é muito útil em doenças complexas, cujas causas moleculares são inúmeras e de difícil validação via experimentação. Como exemplo, um estudo utilizou esta ferramenta para melhorar o entendimento da endometriose, doença caracterizada pelo desenvolvimento de tecido do endométrio fora do útero.

Ilustração de rede de conexões, utilizada pela ferramenta de IA. Fonte: geralt/Pixabay

Genômica

  • Pode atuar na predição de mutações fora do alvo do sistema CRISPR/Cas9! Sabe-se que o sistema CRISPR/Cas9, embora muito aplaudido, pode acarretar em eventos fora do alvo, o que o impossibilita de ser utilizado na prática clínica até o momento. Como uma das formas de contornar tal problema, pesquisadores do Instituto Wellcome Sanger desenvolveram uma ferramenta baseada em ML que permite a predição dos sítios em que este sistema pode atuar, uma vez que age dentro da célula. Dessa forma, no futuro, a eficiência e a segurança do uso deste sistema biológico como método de tratamento pode aumentar.   
Ilustração do processamento de dados para busca de eventos fora do alvo realizados pelo sistema CRISPR. Fonte: TheDigitalArtist/Pixabay


Enfim, a IA chegou pra valer e não irá embora. Sua participação nos processos diários laboratoriais, seja otimizando buscas, permitindo modelagem, prevendo eventos, ou ainda automatizando o dia a dia laboratorial, apenas está no começo e irá se expandir. Ela é uma peça chave para o futuro da biotecnologia. Cabe, portanto, ao biotecnologista manter a mente aberta para a introdução desta ferramenta ao seu cotidiano laboratorial, de maneira a aprimorar e respaldar seus achados.

Por outro lado, a chegada da IA traz um desafio técnico a esses profissionais, pois também serão necessários que apliquem as necessidades (das mais variadas) laboratoriais ao contexto da inteligência artificial – pode surgir aqui uma nova área de especialização para os BIOcientistas (por que não?).


Quer saber mais?  Sugerimos alguns links úteis sobre o assunto:

TED Talks ( mais de 60 palestras sobre IA).
Cursos sobre IA: Coursera, EDx, entre outros.
Acervo Profissão Biotec sobre Inteligência Artificial.

Texto revisado por Carolina Vasconcelos e Thaís Semprebom
Referências:

Allen, F.; Crepaldi, L.; Alsinet, C.; Strong, A. J.; Kleshchevnikov, V.; De Angeli, P.;  Páleníková, P.; Khodak, A.; Kiselev, V.; Kosicki, M.; Bassett, A. R.; Harding, H; Galanty, Y.; Muñoz-Martínez, F.; Metzakopian, E.; Jackson, S. P.;  Parts, L. Predicting the mutations generated by repair of Cas9-induced double-strand breaks. Nature Biotechnology. (2018).

Artificial Intelligence. [(accessed on 16 June 2018)]; Available online:https://en.wikipedia.org/wiki/Artificial_intelligence.

Bakkar, N.; Kovalik, T.; Lorenzini, I.; Spangler, S.; Lacoste, A.; Sponaugle, K.; Ferrante, P.; Argentinis, E.; Sattler, R.; Bowser, R. Artificial intelligence in neurodegenerative disease research: use of IBM Watson to identify additional RNA-binding proteins altered in amyotrophic lateral sclerosis.  Acta Neuropathologica, [s.l.], v. 135, n. 2, p.227-247, 13 nov. 2017. Springer Nature. http://dx.doi.org/10.1007/s00401-017-1785-8.

Bouaziz, J.; Mashiach, R.; Cohen, S.; Kedem, A.; Baron, A.; Zajicek, M.; Feldman, I.; Seidman, D.; and Soriano, D. How Artificial Intelligence Can Improve Our Understanding of the Genes Associated with Endometriosis: Natural Language Processing of the PubMed Database. . Biomed Research International, [s.l.], v. 2018, p.1-7, 2018. Hindawi Limited. http://dx.doi.org/10.1155/2018/6217812.

Hamp, T.; Rost, B. More Challenges for Machine-Learning protein interactions. Bioinformatics, [s.l.], v. 31, n. 10, p.1521-1525, 12 jan. 2015. Oxford University Press (OUP). http://dx.doi.org/10.1093/bioinformatics/btu857.

Hessler, G.; Baringhaus, K. Artificial Intelligence in Drug Design. Molecules, [s.l.], v. 23, n. 10, p.2520-2532, 2 out. 2018. MDPI AG. http://dx.doi.org/10.3390/molecules23102520.


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