Nos últimos anos, estudos com o microbioma intestinal vêm ganhando o cenário científico. Mas o que as análises desses estudos podem dizer sobre nós?

O corpo humano e da maioria dos mamíferos é composto por um conjunto de células eucarióticas, que compõe os tecidos dos organismos, somados a um conjunto de células microbianas. Esses microorganismos são responsáveis por compor o microbioma desses organismos. Estima-se que o microbioma humano é composto por 100 trilhões de micro-organismos e maioria está presente no intestino.

 A maior parte desse microbioma possui herança materna, através do fluído vaginal rico em microorganismos. Entretanto, cada indivíduo possui sua própria e única assinatura de micro-organismos compondo o microbioma, que sofre influência direta dos hábitos alimentares e do ambiente. Recentemente, estudos vêm demonstrando a influência da microbiota intestinal sob o sistema nervoso central, através do eixo microbiota intestinal – cérebro. A microbiota intestinal tem sido considerada o segundo cérebro dos seres humanos.

Ilustração da conexão cérebro-intestino. Fonte: Elaborado pela autora.

Diversas patologias que atingem nosso organismo possuem diagnóstico muito invasivo ou nem mesmo apresentam uma forma de diagnóstico. Com o crescente estudo da microbiota intestinal e suas influências no organismo como um todo, a identificação dos micro-organismos que a compõe tem ganhado visibilidade. A identificação pode ser feita por meio de de técnicas biotecnológicas, como sequenciamento e a análise metagenômica, utilizando as fezes (o famoso cocô) como amostra. A principal vantagem é que essa é uma técnica não invasiva de identificação de biomarcadores.

Mas como o cocô pode ajudar nesse tipo de diagnóstico? As fezes são compostas pelos alimentos não absorvidos que ingerimos e pela microbiota intestinal. Isso acontece porque ao serem produzidas,percorrem toda a extensão do intestino e acabam levando as bactérias junto. Nesse sentido, ao estudar a composição microbiológica das fezes é possível determinar possíveis alterações no organismo de origem e, inclusive, diagnosticar várias patologias.

E como essa composição é avaliada? As bactérias possuem uma região genômica bem conservada, com baixas taxas de evolução – a região de RNA para o ribossomo 16s. Essas regiões são conhecidas há bastante tempo e são utilizadas em processos de amplificação por reação em cadeia da polimerase (PCR) e sequenciamento. Para essas técnicas, utilizam-se primers específicos e os resultados passam por análises de bioinformática para identificação de gêneros e espécies.

Esquema mostrando como se dá a identificação das bactérias presentes na microbiota intestinal a partir de amostra de fezes. Fonte: Adaptado de Koh, 2017.

Quais avanços essas técnicas têm obtido no diagnóstico de patologias? 

A disbiose é o desequilíbrio da microbiota intestinal, ou seja, os micro-organismos com efeitos positivos acabam ficando em menor número quando comparados aos com efeito negativo. Sendo assim, está associada a diversas doenças, incluindo a síndrome do intestino irritável (SCI). Em 2015, um grupo de pesquisa propôs uma nova forma de diagnóstico para SCI. Eles utilizaram amostras de fezes para caracterizar o perfil da microbiota do paciente e identificar a disbiose.

Além de auxiliar o diagnóstico de doenças do trato gastrointestinal (TGI), a microbiota intestinal pode ser biomarcador para diversas outras doenças. Em 2017, pesquisadores chineses traçaram um perfil da diversidade microrganismos da microbiota intestinal e, como resultados, conseguiram traçar as diferenças nessa diversidade entre pacientes com cirrose e com carcinoma hepatocelular (HCC, tipo mais comum de câncer de fígado). Dessa forma, conseguiram estabelecer biomarcadores microbianos para o HCC de forma não invasiva, além de fornecer ferramentas para o seu diagnóstico antecipado.

Estudos também mostram que a microbiota intestinal e o ambiente do TGI influenciam e funcionam como biomarcadores não-motores para a Doença de Parkinson (PD). As disfunções presentes no TGI que influenciam na PD se estabelecem quase duas décadas antes das disfunções motoras. Nesse sentido, a constipação, disbiose, alteração na permeabilidade intestinal, acúmulo entérico de α-sinucleína e inflamação do TGI estão presentes em pacientes que apresentaram PD em algum momento da sua vida. Acredita-se que um perfil da microbiota de pacientes com PD e com altas chances de desenvolver PD possa ser traçado a fim de utilizar as alterações no GI como possíveis biomarcadores para PD.

 Se interessa pelo assunto? Acompanhe o nosso blog para saber mais sobre e também leia nossas notícias antigas tratando sobre microbiota intestinal no tratamento do câncer e sobre a produção de produtos biotecnológicos nesse microambiente. Além disso, compartilhe sua opinião conosco e fique ligado em nossas atualizações!

Texto revisado por Letícia Cruz e Ísis Venturi

Referências:
CASÉN, C. et al. Deviations in human gut microbiota: A novel diagnostic test for determining dysbiosis in patients with IBS or IBD. Alimentary Pharmacology and Therapeutics, [s. l.], v. 42, n. 1, p. 71–83, 2015.

NAIR, A. T. et al. Gut Microbiota Dysfunction as Reliable Non-invasive Early Diagnostic Biomarkers in the Pathophysiology of Parkinson’s Disease: A Critical Review. Journal of Neurogastroenterology and Motility, [s. l.], v. 24, n. 1, p. 30–42, 2018.

REN, Z. et al. Gut microbiome analysis as a tool towards targeted non-invasive biomarkers for early hepatocellular carcinoma. Gut, [s. l.], v. 68, n. 6, p. 1014–1023, 2019.

ROUNGE, T. B. et al. Evaluating gut microbiota profiles from archived fecal samples. BMC Gastroenterology, [s. l.], v. 18, n. 1, p. 1–11, 2018. 

Sobre Nós

O Profissão Biotec é um coletivo de pessoas com um só propósito: apresentar o profissional de biotecnologia ao mundo. Somos formados por profissionais e estudantes voluntários atuantes nos diferentes ramos da biotecnologia em todos os cantos do Brasil e até mesmo espalhados pelo mundo.

Recentes

Assine nossa newsletter

Ao clicar no botão, você está aceitando receber nossas comunicações.