A pandemia de COVID-19 direcionou o foco do mundo para a área da saúde humana, em busca de maneiras para controlar essa doença. Um dos grandes avanços que vimos nesse período foi a aprovação de vacinas em um período de tempo nunca visto antes. Essa rápida disponibilidade de vacinas foi resultado, principalmente, do desenvolvimento de plataformas vacinais. Mas o que são essas plataformas? Elas são capazes de nos preparar para novas doenças?
Possibilidade de outras pandemias
Assim como a COVID-19, cerca de 70% das doenças que geram epidemias e pandemias são zoonoses, ou seja, causadas por patógenos transmitidos de animais para humanos. Mas o que leva a esse alto nível de transmissão? Segundo a Plataforma Intergovernamental sobre Biodiversidade e Serviços Ecossistêmicos (IPBES), atividades como tráfico de animais silvestres, intensa produção pecuária, desmatamento e mudanças climáticas aumentam o risco de espalhamento de zoonoses.
A cada ano, cerca de cinco novas doenças infecciosas são descobertas e existe uma chance de pelo menos uma delas possuir um potencial para gerar uma pandemia. Frente a esse cenário de possibilidades, o mundo precisa se preparar para evitar danos catastróficos. Por isso, investir no desenvolvimento de plataformas vacinais pode ser crucial para lidar com futuros desafios na área da saúde.
As plataformas vacinais são qualquer tecnologia utilizada como base para o desenvolvimento de novas vacinas. Mas qual a importância de se investir em plataformas vacinais?
Rapidez na formulação de vacinas
A pandemia de COVID-19 trouxe uma necessidade por resultados rápidos. Seu início foi marcado por uma corrida contra o tempo para o desenvolvimento de novas vacinas. Nesse contexto, duas vacinas contra a COVID-19 ganharam destaque em seu processo de desenvolvimento.
As vacinas Pfizer/BioNtech e Moderna foram aprovadas para uso pela agência americana FDA (Food and Drug Administration) em apenas 11 meses desde o primeiro sequenciamento do genoma do SARS-Cov-2. Esse curto período de tempo fez com que essas se tornassem as vacinas com mais rápida aprovação na história.
O que essas duas vacinas têm em comum? Ambas foram produzidas a partir de uma plataforma de RNA mensageiro (RNAm). O RNA mensageiro é a molécula que leva informações genéticas para a síntese de proteínas. As vacinas de RNAm carregam o código genético do SARS-Cov-2, contendo as instruções para produção da proteína Spike, para estimular a resposta imune do corpo.
As vacinas para COVID-19 foram as primeiras liberadas no mercado utilizando essa tecnologia. Essas novas plataformas vacinais tem como principal benefício a velocidade. Isso só é possível porque, uma vez que a base do imunizante já está elaborada, ela pode ser facilmente adaptada para criar diferentes vacinas para diferentes patógenos.
Em comparação com vacinas convencionais, que levam anos para serem formuladas, as plataformas vacinais permitem a criação de imunizantes de forma rápida e segura. A vacina da Moderna, por exemplo, foi projetada em apenas dois dias. Já a da Pfizer/BioNTech em apenas algumas horas! Essas duas vacinas são aplicadas em muitos países e possuem eficácia acima de 90%.
Flexibilidade de utilização
Um fator que permite às indústrias farmacêuticas projetar e direcionar vacinas para doenças específicas em um tempo tão impressionante é a flexibilidade das plataformas vacinais. Utilizando a tecnologia de RNAm como exemplo, pesquisadores podem direcionar esforços para uma doença específica somente substituindo a sequência de RNA mensageiro utilizada. Então, além do sucesso com a vacina para COVID-19, essas plataformas são fortes candidatas para criação de vacinas para outros vírus, como o influenza.
Não apenas as plataformas baseadas em RNAm demonstram alto potencial no mercado farmacêutico. A vacina Oxford/Astrazeneca utiliza em sua composição um vetor viral não replicante. Nessa estratégia, um adenovírus de Chimpanzé (grupo de vírus que normalmente causam doenças respiratórias) carrega o trecho de DNA que codifica a proteína Spike do SARS-CoV-2, uma das peças-chave no processo de infecção do vírus em células humanas.
Esse adenovírus é modificado geneticamente para conseguir entrar nas células humanas, mas se mantém incapaz de se replicar dentro dela. Dessa forma, esse vetor não é capaz de gerar doenças, mas pode estimular o sistema imune.
O modelo vacinal baseado em vetores virais já havia sido desenvolvido há muitos anos e testado para diferentes doenças. Em 2020, uma vacina contra o Ebola que utiliza essa tecnologia foi aprovada. Outras vacinas utilizando essa plataforma vêm sendo estudadas, como as para HIV e Zika.
Perspectivas para as plataformas vacinais
O desafio de controlar a pandemia de COVID-19 possibilitou avanços científicos históricos, principalmente no desenvolvimento de vacinas, que são nossas principais aliadas na luta contra o vírus. A demanda mundial por esses imunizantes possibilitou o financiamento e comprovação da segurança de muitas plataformas vacinais, utilizando diversas estratégias moleculares.
A pandemia atual também deixou clara a necessidade de nos prepararmos para o futuro agora. O financiamento e esforços voltados para o desenvolvimento de diferentes tecnologias e plataformas vacinais podem controlar em um menor tempo e com maior eficiência novas doenças que venham desafiar a humanidade.
Cite este artigo:
NASCIMENTO, L. X. Plataformas vacinais: estamos preparados para uma próxima pandemia? Revista Blog do Profissão Biotec, v.9, 2022. Disponível em:<https://profissaobiotec.com.br/plataformas-vacinais-estamos-preparados-para-proxima-pandemia/>. Acesso em: dd/mm/aaaa.
Referências
A era das epidemias pode estar só no início, diz virologista francês. In: Viva Bem Uol. [S. l.], 16 fev. 2021. Disponível em: https://www.uol.com.br/vivabem/noticias/rfi/2021/02/16/a-era-das-epidemias-pode-estar-so-no-inicio-diz-virologista-frances.htm. Acesso em: 9 nov. 2021.
Comissão Europeia aprova vacina contra Ebola. In: Viva Bem Uol. [S. l.], 2 jul. 2020. Disponível em: https://www.uol.com.br/vivabem/noticias/redacao/2020/07/02/comissao-europeia-aprova-vacina-contra-ebola.htm. Acesso em: 9 nov. 2021.
CORUM, Jonathan; ZIMMER, Carl. How the Oxford-AstraZeneca Vaccine Works. In: The New York Times. [S. l.], 7 maio 2021. Disponível em: https://www.nytimes.com/interactive/2020/health/oxford-astrazeneca-covid-19-vaccine.html. Acesso em: 9 nov. 2021.
RAWAT, Sachin. How Vaccine Platforms Can Prepare Us for Future Pandemics. In: LABIOTECH. [S. l.], 15 fev. 2021. Disponível em: https://www.labiotech.eu/in-depth/vaccine-platforms-future-pandemics/. Acesso em: 9 nov. 2021.
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