Cobertura: Jamboré Brasuca 2019 e o florescer da biologia sintética no Brasil

A biologia sintética promete revolucionar a maneira como enxergaremos o mundo no futuro, mas como está o cenário para a área no Brasil? Confira agora, como foi um dos maiores evento de biologia sintética organizado por estudantes no Brasil e descubra a resposta.

A seguir, a cobertura do Jamboré Brasuca deste ano, evento de biologia sintética que reuniu times de iGEM de todo o Brasil, com professores e empresas da área; mas primeiro vamos conhecer um pouco dessa área que promete mudar a maneira como vemos a biotecnologia..

A nova era

Aviões feitos de teias de aranha sintéticas, as primeiras carnes produzidas em laboratório, reconstrução de fragrâncias de plantas extintas e microrganismos vivos para o tratamento de doenças parecem verdadeiras invenções de obras de ficção científica, mas e se eu te falasse que todos esses exemplos são projetos em andamento ou concluídos em diferentes empresas? Nós estamos testemunhando o início de uma nova revolução: o momento em que os seres humanos estão cada vez mais próximos de dominar a sua própria tecnologia – a vida.

Mas como isso é possível?

Apesar de ser um termo descrito pela primeira vez em 1920, foi nos anos 2000 que a biologia sintética se tornou um termo cada vez mais citado na comunidade acadêmica.

Este campo multidisciplinar que utiliza conhecimentos de bioinformática, engenharia, microbiologia e biologia molecular, rompe com a abordagem padrão de como sequências de DNA são descritas, tratando seus componentes como partes biológicas que podem ser modificadas, catalogadas, padronizadas e caracterizadas.

 Foi devido a tecnologia da síntese de nucleotídeos que sequências de DNA sintéticas puderam ser construídas e, consequentemente, regiões promotoras, RBS (Ribosome binding site, em português: Sítio de ligação ao ribossomo) e até mesmo proteínas puderam ser engenheirados. A evolução dirigida de proteínas gerou até um Nobel!

A biologia sintética constrói organismos sintéticos (microorganismos procariotos ou eucariotos, e até mesmo plantas OGM), enxergando-os como o produto de uma série de ciclos iterativos, conhecidos como DBTL (Design, Build, Test and Learn, em português: Projete, Construa, Teste e Aprenda). Tais ciclos, quando acompanhados de modelos matemáticos e ferramentas de ciência de dados bem elaborados, são capazes de desenvolver os mais complexos organismos com comportamento desejado e previsível.

O novo mercado

Atualmente, a área deixou de ser um brinquedo de cientistas e pesquisadores para se transformar em um verdadeiro mercado que está movimento a bioeconomia mundial. Startups de biologia sintética receberam investimento total de 3,8 bilhões de dólares em 2018, valor acima do dobro em relação ao ano anterior.  E são estas startups que estão tornando possível projetos tão impressionantes quanto os citados no início do texto. O futuro é um mundo de possibilidades para a biologia sintética, é bem como o nosso querido Drew Endy, biólogo sintético muito conhecido, disse uma vez: ‘Haverá dragões! ’.


Investimentos em empresas de Biologia sintética (2009 – 2018). Fonte: Synbiobeta, 2018.

Mas neste cenário incrível, onde se encontra o Brasil?

É aí que começamos a falar do Jamboré, um evento criado em 2013 por estudantes da USP, Unicamp e UFAM, logo após terem participado da fase regional do iGEM (international genetically modified machine competition), a maior competição de biologia sintética do mundo.

O nome surgiu como uma paródia do evento principal da competição: o “Giant Jamboree”, que em sua versão tupiniquim se torna “Jamboré Brazuca”. Com o passar dos anos, o evento continuou acontecendo e novos times começaram a participar, e hoje o evento é o principal ponto de intersecção entre times de iGEM brasileiros, professores universitários e outras iniciativas relacionadas à biologia sintética no Brasil.

No ano passado, o evento aconteceu em Piracicaba-SP, reunindo representantes da Braskem, Instituto SENAI de Inovação em Biossintéticos (RJ), empreendedores internacionais e até Drew Endy por vídeo conferência.

O Jamboré 2019

Em sua sexta edição, o evento aconteceu em Lorena-SP, na EEL-USP nos dias 29 e 30 de março deste ano e recebeu cerca de 85 pessoas, dentre elas professores universitários, representantes de empresas e institutos de biologia sintética, além dos próprios times brasileiros. Com o principal objetivo de proporcionar um ambiente colaborativo para a construção da biologia sintética brasileira, o evento contou com palestras, painéis, mesas-redondas, apresentação de painéis e workshops com direito a atividades práticas.

Brasil e BioSin: cenário acadêmico, empreendedorismo, inovação e como chegar lá

Para quem vê biologia sintética como algo além do iGEM e deseja construir um futuro profissional na área, muitas dúvidas e inseguranças surgem naturalmente, como “Devo seguir área acadêmica?”, “É possível fazer biologia sintética fora da academia no Brasil?”, “ Existem empresas fazendo biologia sintética por aqui?”. É pensando nessas dúvidas, que o evento trouxe discussões, painéis e mesas-redondas envolvendo o cenário da academia, empreendedorismo e ciência aberta no Brasil.

A primeira atração do evento contou com Tiago Mendes, professor na UFV; Guilherme Kundslatsch, coordenador do programa de embaixadores do After iGEM e CEO da empresa Peabiru; Otto Heringer, CFO da empresa LOTAN agrosciences e Maria Clara Astolfi, atualmente trabalhando em uma das maiores empresas de biologia sintética do mundo a Ginkgo Bioworks. Eles contaram um pouco de sua trajetória na biologia sintética e como chegaram onde estão.

A mesa redonda “Oportunidades na academia” também composta pelo professor Tiago e a professora Danielle Pedrolli da Unesp de Araraquara-SP, proporcionou uma visão madura sobre a pesquisa em biologia sintética nas universidades brasileiras, suas perspectivas em relação ao cenário atual da pesquisa brasileira e visões sobre parceiras universidade e empresas.

A mesa redonda “Inovação no brasil – empreendendo e atuando no cenário atual”, trouxe Lucas Cespedes do Instituto SENAI de Inovação em Biossintéticos do Rio de janeiro, Otto Heringer e Yukio Shibata da Onovolab. Eles discutiram o cenário brasileiro e os desafios para o empreendedorismo e inovação em biologia sintética e biotecnologia, além do cenário da Pesquisa e Desenvolvimento (P&D) e a indústria brasileira. Por fim, a mesa redonda “Ciência para todos” com Rita Wu (FAB LAB USP) e Heloísa Oss Boll (UFRGS) deu um gostinho de como a ciência pode ser feita fora dos muros da universidade.


Mesa redonda “Inovação no brasil – empreendendo e atuando no cenário atual”. Fonte: Organização Jamboré 2019.

Vamos ao que interessa: aprendendo com o Jamboré

Além das discussões, o Jamboré proporcionou atividades que buscavam ensinar ou discutir conceitos básicos ou relacionados a biologia sintética. Além do painel “Bê-á-bá da biologia sintética”, o evento disponibilizou workshops práticos em 3 blocos:

Bloco 1 Databases e bioCADs: construindo rotas sintéticas e realizando o design de DNAs e RNAs in silico;

Bloco 2 – Bioinformática- do básico da programação ao Biopython;

Bloco 3 – Faça você mesmo: da montagem do seu próprio lab a apresentação de seu projeto.


Workshops de Databases e BioCADs (esquerda) e guia apresentações e pitchs (direita). Fonte: Organização Jamboré 2019.

Um gostinho do Giant Jamboree 2018

Se 2017 foi bom para os times brasileiros de iGEM, 2018 foi ainda mais inesquecível! Tivemos no Giant Jamboree a participação de 3 times brasileiros medalhistas: USP-Brazil (prata), USP-EEL-Brazil (bronze) e Unesp Brazil (ouro). Mas mais importante que as medalhas classificatórias, foi que o Brasil realizou um feito inédito e recebeu duas premiações. A primeira premiação foi “Best measurement” para o time USP-Brazil, por ter desenvolvido um método mais eficiente para leitura da atividade de promotores de seu sistema de quorum-sensing. A segunda, “Best Hardware”, premiou o time da Unesp pela construção de um biorreator que simula a geometria do intestino humano; essa equipe, também foi nomeada para dois outros prêmios: “Best part collection” e “Best education & public engagement”. No Jamboré Brasuca, os times exibiram as apresentações premiadas que fizeram no Giant Jamboree de 2018.

Integrantes do time Unesp Brazil recebendo o Prêmio de melhor Hardware em 2018. Fonte: Página do facebook iGEM Unesp Brazil.


O florescer da biologia sintética no Brasil

Enquanto a biologia sintética desfruta de um boom ao redor do mundo, a comunidade no Brasil inicia seu florescer e o Jamboré deste ano (2019) é o reflexo disso. Levando sua principal missão no slogan: “Colaborando para construção da biologia sintética brasileira”, o evento contempla parte de um ecossistema em crescimento no Brasil, tanto para novos times de iGEM, quanto para pesquisadores e empresas em geral, levando a um clima de colaboração que contribui para a construção sólida de uma nova comunidade pronta para participar desta revolução.

Participantes do evento Jamboré 2019. Fonte: Organização do evento.

Ficaram curiosos para conhecer um pouco mais e ajudar os projetos das equipes que querem participar do iGEM este ano? Dê uma olhada no nosso arquivo com a ficha técnica das equipes!

 

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O Profissão Biotec é um coletivo de pessoas com um só propósito: apresentar o profissional de biotecnologia ao mundo. Somos formados por profissionais e estudantes voluntários atuantes nos diferentes ramos da biotecnologia em todos os cantos do Brasil e até mesmo espalhados pelo mundo.

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