Os microrganismos são seres ubiquitários, ou seja, onipresentes. Estes, são encontrados até mesmo em situações extremas tais quais: elevadas temperaturas, baixíssimas temperaturas e pH ácido. Conhecidos como microrganismos extremófilos, estes seres são capazes de sobreviver em situações extremas, podendo suportar até elevadas concentrações de radiação. No ano passado, pesquisadores da UFSCar avaliaram os microrganismos presentes em painéis solares fotovoltaicos e o resultado foi surpreendente.
A poeira dos microrganismos e a eficiência dos painéis solares
Os painéis solares estão em contato direto com diferentes condições climáticas como elevada irradiação solar, dessecação e flutuações térmicas. No entanto, mesmo em condições tão extremas, já foi relatado crescimento de uma variedade de tipos de vida microbiana nestas estruturas. Essa presença tem sido expressiva ao ponto de gerar preocupações quanto à funcionalidade dos painéis fotovoltaicos, tendo em vista que o acúmulo de material microbiológico pode formar biofilme (comunidades biológicas com um elevado grau de organização), o que pode limitar a absorção dos raios solares.
Um estudo realizado pela pesquisadora Márcia Aiko Shirakawa, do Departamento de Engenharia de Construção Civil (PCC), da Escola Politécnica (Poli) da USP, determinou que o biofilme é um componente significativo na “poeira” dos painéis solares. Segundo a pesquisadora: “Até cerca de 50% da poluição depositada sobre os painéis pode ser composta por matéria orgânica e que os fungos são preponderantes em relação aos organismos fototróficos”. Segundo o grupo, o biofilme formado pode reduzir em até 10% a produção de energia em painéis fotovoltaicos.
Microrganismos presentes nos painéis solares
Contudo, não há somente efeitos negativos relacionados à presença destes organismos, um outro estudo avaliou como as condições adversas afetam a composição microbiana dos painéis solares em São Paulo. Os resultados revelam que as comunidades microbianas presentes nas superfícies dos painéis solares variam com o tempo e as variações sazonais. A composição microbiana é caracterizada por um conjunto de microrganismos altamente resistentes, estes tendo sido descritos em amostras de solo dos desertos de Taklamaken (China), de Gobi (Mongólia), e do Atacama (Chile).
Curiosamente o grupo observou similaridade na composição microbiana observada em estudos conduzidos em outros países. “Observamos que a composição dessa microbiota é muito parecida com a encontrada em painéis fotovoltaicos em Valência (Espanha), Berkeley (Estados Unidos) e mesmo no Ártico e na Antártica”, conta Juliane Moura, autora do estudo.
É interessante pontuar que mesmo em condições climáticas diferentes, os gêneros Methylobacterium-methylorubrum e Hymenbacter foram observados tanto por Juliane Moura quanto por Márcia Shirikawa. O processo que ocorre é a seleção natural extrema e os organismos presentes necessitam se adaptar à radiação solar, variações de temperatura, escassez de água e ao material de que as placas são constituídas.
A título de curiosidade, vale a pena mencionar que o gênero Methylobacterium-methylorubrum é tão amplamente distribuído na natureza, que já foi até descrito fora da atmosfera terrestre. Astronautas da Estação Espacial Internacional (ISS – International Space Station, em inglês ), inocularam em solução salina, amostras oriundas de um filtro HEPA (High Efficiency Particulate Arrestance),que possui alta pureza de filtração e é utilizado para filtrar o ar da ISS. Nesta amostra, foi encontrada uma bactéria identificada como pertencente à espécie Methylorubrum rhodesianum, espécie do mesmo gênero das observadas nos painéis solares. Caso deseje saber mais sobre bactérias no espaço sideral, acesse o link do PB: A vida, o universo e tudo mais.
O potencial biotecnológico dos microrganismos presentes nos painéis solares
O excesso de luz resulta em um aumento no estresse oxidativo e na expressão de espécies reativas de oxigênio nos microrganismos. Desta forma, estes precisam balancear o excesso energético. Como resposta os microrganismos aumentam a produção de pigmentos, de forma a conseguir balancear o excesso de energia resultante da alta concentração luminosa. Não surpreendentemente, a maior parte dos microrganismos encontrados nos painéis solares possuem alta concentração de pigmentos como beta caroteno e astaxantina. Estes pigmentos são de grande interesse industrial tendo aplicações nos segmentos de alimentos, química, têxtil, farmacêutica e de cosméticos.
Conforme acima abordado, os microrganismos estão em todos os lugares, sendo encontrados desde a Estação Espacial Internacional, até os painéis fotovoltaicos responsáveis por gerar energia. Na verdade, até no corpo humano eles são quase que unanimidade já que se considerarmos os genes microbianos que o habitam, o corpo humano é composto por 99% de genes microbianos e apenas 1% de genes humanos. No entanto, não há o que temer, a biotecnologia vem mostrando para a humanidade ao longo dos anos o grande potencial e utilidade desses seres microscópicos.
Cite este artigo:
LEAL, G. C. Os microrganismos presentes nos painéis solares. Revista Blog do Profissão Biotec, v.10, 2023. Disponível em: <https://profissaobiotec.com.br/os-microrganismos-presentes-nos-paineis-solares/>. Acesso em: dd/mm/aaaa.
Referências
CAVALCANTE, MICHELLE MELO et al. Protótipo de um sistema automatizado para higienização de painéis solares planos agrupados a um sistema de reaproveitamento de água. In: Anais do V SINGEP–SIMPOSIO INTERNACIONA DE GESTAO DE PROJETOS E INOVAÇÃO E SUSTENTABILIDADE. São Paulo–SP–Brasil. 2016.
DELGADO ROMERO, José A. Microorganismos extremófilos. Vida microbiana más allá de sus condiciones óptimas. 2021.
GREEN, Peter N. Methylobacterium. Bergey’s Manual of Systematics of Archaea and Bacteria, p. 1-8, 2015.
TANNER, Kristie et al. Extremophilic microbial communities on photovoltaic panel surfaces: a two‐year study. Microbial Biotechnology, v. 13, n. 6, p. 1819-1830, 2020.
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