A produção de frutas sem sementes é uma realidade que pode contribuir em vários aspectos na agricultura e agradar ao consumidor.

Nos dias de hoje, é bastante comum encontrarmos algumas frutas sem sementes quando vamos à feiras ou supermercados. Para muitos, comer uvas ou melancias sem sementes pode ser algo mais prazeroso e, dependendo da variedade, acredita-se que o sabor e textura sejam mais atrativos. Mas será que a produção desse tipo de fruta tem apenas finalidades estética e prática para o consumidor? Você já se perguntou como elas são produzidas? Neste texto vamos trazer informações científicas sobre essas questões.

A biologia por trás das frutas sem sementes

Se fizermos uma breve recordação sobre as aulas de botânica da escola, nos lembraremos que o desenvolvimento de frutos pela reprodução sexuada nas plantas ocorre através da fertilização da oosfera (gameta feminino) presente no óvulo das flores através do gameta masculino que é transportado pelo grão de pólen. No entanto, existem frutos que conseguem se desenvolver sem o processo de fertilização, seja em decorrência de processos naturais ou através de programas de melhoramento genético, o que gera a ausência ou degeneração das sementes.

A partenocarpia é um dos processos que culmina na formação de frutos sem sementes na ausência de fecundação, como é o caso da banana. Neste caso, as causas naturais da partenocarpia podem ser genéticas (mutações ou desbalanço cromossômico), e em geral ocasionam a infertilidade da planta e ausência de sementes. O fruto acaba se desenvolvendo a partir do óvulo não fecundado por indução de hormônios específicos. Já na estenoespermocarpia, ocorre a fecundação, no entanto, a semente é degenerada e ocorre o que chamamos de aborto embrionário.

Seis abacates sem sementes
#ParaTodosVerem: na foto estão representados, lado a lado, seis abacates sem sementes. O último está cortado ao meio, onde se pode observar a ausência de semente em sua polpa esverdeada. Fonte: Fitness World

       Outros fatores que culminam na formação de frutos sem sementes em algumas espécies de plantas são as falhas ou ineficiência da polinização, gametas não funcionais e a incompatibilidade genética entre os genitores. A banana que consumimos é triploide, ou seja, apresenta três cópias para cada cromossomo. Isto dificulta que os gametas sejam formados com um número balanceado de cromossomos, o que gera a infertilidade da planta. Dessa forma, uma nova planta só é gerada a partir de brotos da genitora, caracterizando um clone.

A partir destes conhecimentos a respeito da biologia reprodutiva das plantas é que os pesquisadores e agricultores desenvolveram diferentes técnicas para produzir frutas sem sementes visando vantagens para a sua produção e comercialização.

Frutas sem sementes e seu valor

São vários os intuitos de se produzir determinados cultivares que apresentam frutas sem sementes. Do ponto de vista do consumidor, pode ser interessante ter frutas sem sementes duras como a laranja, o abacaxi e até mesmo a banana (sim, a banana selvagem tem sementes). O tamanho, textura e o sabor (mais adocicado) da fruta também podem ser afetados quando se obtém a fruta sem sementes. Frutas obtidas por partenocarpia, ainda, se desenvolvem mais rápido por não passarem pelo processo de embriogênese e têm maior durabilidade após coletadas.

Outra finalidade de se obter frutas sem sementes é trazer uma alternativa para contornar problemas de polinização que alguns cultivares enfrentam (tomate, figo e abobrinha), como por exemplo a limitação de insetos polinizadores devido às características próprias da estrutura floral. de alguns cultivares como os que o figo,o  tomate e a abobrinha encontram. Para a horticultura, trabalhar com plantas partenocárpicas que não produzem sementes pode ser um meio de contornar as variáveis ambientais e sazonais que podem acarretar baixa disponibilidade e maturação do pólen, o que afeta a reprodução sexuada e diminui a produtividade no campo. 

A partenocarpia, visando a produção de frutas sem sementes, pode ser induzida em algumas plantas através de cruzamentos entre espécies ou tratamento com fitohormônios. Neste último caso, as flores são tratadas antes da polinização com hormônios  (auxina, giberelina e citocinas) que induzem a formação do fruto sem que ocorra a fecundação e formação das sementes. Essa técnica hormonal é muito utilizada em cultivares de berinjela, uma vez que a ausência de sementes diminui o escurecimento da polpa após a colheita.

Já em melancias, o processo de induzir a partenocarpia é bem curioso. Na verdade, as plantas que produzem frutas sem sementes são cultivadas a partir de sementes que foram originadas do cruzamento de uma planta parental diplóide com uma triplóide, o que gera um desbalanço cromossômico e impede que a próxima geração consiga ter sucesso em formar sementes através da fecundação. Em muitos casos, a planta parental triplóide é produzida através de cruzamentos entre uma planta diplóide com uma tetraplóide, sendo que esta última pode ser obtida por manipulação genética.

Uma melancia sem sementes cortada ao meio
#ParaTodosVerem:  Sobre uma mesa marrom, em um prato azul, está uma melancia sem sementes cortada ao meio. Sua polpa apresenta a cor vermelha, enquanto a sua casca tem a tonalidade esverdeada. Fonte: Scott Ehardt

Algumas variedades de tomate sem sementes também são produzidas por partenocarpia, e apresentam um apelo industrial para a produção de molhos variados, uma vez que a etapa de retirada das sementes não se torna mais necessária. Para o consumidor, esses frutos podem apresentar uma melhor aceitação e validade após a compra.

O processo de estenoespermocarpia também é bastante utilizado para a produção de uvas, tangerinas e melancias sem sementes. Neste caso, após a fecundação do óvulo das flores, é aplicada uma substância, geralmente a hidrazida maleica, que induz falhas na divisão celular do embrião formado e o aborto da semente.

Reflexões sobre as frutas sem sementes

É interessante pensarmos que processos de melhoramento de plantas através da seleção artificial e partenocarpia são antigos e podem nos fornecer cultivares com características desejáveis e que até solucionam problemas diversos na produção de alimentos. Os casos em que há manipulação genética de algumas espécies, como vimos anteriormente, não configuram transgenia, já que o que ocorre é apenas uma modificação do número de cromossomos de uma das plantas parentais.

O cultivo de plantas com frutas sem sementes, ainda que apresente diversos fins que vão desde solucionar problemas no campo até o agrado do consumidor, deve ser olhado com ética e cuidado ambiental. As plantas que apresentam frutas sem sementes perdem a capacidade de contribuir com a  variabilidade genética da espécie, pois não ocorre a troca de material genético na ausência da fecundação, e assim não podem dispersar sementes no ambiente. Por outro lado, isso pode ser vantajoso para determinadas variedades de plantas, pois estas se reproduzem assexuadamente produzindo clones idênticos que preservam a genética dos pais e características importantes para a agricultura e consumo. 

  Há também uma preocupação com o consumidor. Caso as frutas sem sementes ganhem a nossa preferência, poderia haver uma redução na dispersão de sementes de frutos convencionais que descartamos no lixo orgânico, as quais poderiam gerar novas plantas no ambiente? Ficaríamos reféns dos produtores de frutas sem sementes? Os órgãos de biossegurança e comitês de bioética devem avaliar cada caso para que se estabeleçam parâmetros ideais para cultivo e disseminação desse tipo de fruta.

Perfil Fabiano
Texto revisado por Arthur Enrici e Isis V. Biembengut

Cite este artigo:
ABREU, F. C. P. Como as frutas sem sementes são produzidas? Revista Blog do Profissão Biotec. V. 10, 2023. Disponível:<>. Acesso em: dd/mm/aaaa.

Referências

CARVALHO, Camila Israela Freire Silva. Fertilização boratada na prevenção da estenoespermocarpia e qualidade de frutos de mangueira cv. Palmer. 2018. Dissertação de Mestrado. Universidade Federal do Vale do São Francisco.
FARIA, João Pedro Bernardes. Alterações hormonais no mutante ovate de tomateiro (Solanum lycopersicum L. cv Micro-Tom) e seu impacto na morfologia, qualidade do fruto, produtividade e partenocarpia. 2014. Tese de Doutorado. Universidade de São Paulo.
MESEJO, Carlos et al. Cell division interference in newly fertilized ovules induces stenospermocarpy in cross-pollinated citrus fruit. Plant Science, v. 225, p. 86-94, 2014.
Mundo Ecologia. Fruto Partenocárpico. Disponível em < https://www.mundoecologia.com.br/plantas/fruto-partenocarpico/nggallery/slideshow?q=plantas/fruto-partenocarpico > Acesso em 22 de maio de 2023
PANDOLFINI, Tiziana. Seedless fruit production by hormonal regulation of fruit set. Nutrients, v. 1, n. 2, p. 168-177, 2009.
Scientific American. How do seedless fruits arise and how are they propagated? Disponível em < https://www.scientificamerican.com/article/how-do-seedless-fruits-ar/ > Acesso em 12 de maio de 2023.
Fonte da imagem destacada: Wikimedia.

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