Você sabe o que são microrganismos extremófilos? Conheça estas quatro classes!

Veja neste texto quatro tipos interessantes de microrganismos extremófilos, que vivem nos lugares mais inóspitos e possuem muito potencial biotecnológico!

Microrganismos extremófilos são ótimos exemplo de que a vida, de fato, sempre encontra um caminho (fãs de Jurassic park entenderão). Vários mecanismos de adaptação evoluíram em uma variedade de espécies microbianas, ao longo de milhões de anos, para permitir que esses microrganismos habitassem as zonas mais diferentes e inóspitas do planeta!

O termo extremófilo se refere aos microrganismos que possuem ótimas taxas de crescimento em condições ambientais severas, as quais normalmente são inviáveis para outras formas de vida. O modo como esses organismos conseguem viver tão bem nesses ambientes é uma boa fonte de exploração científica e de oportunidades biotecnológicas.

Microrganismos extremófilos são ótimos exemplos de processos adaptativos extraordinários. Fonte: Buzzfeed.

Existem várias classes de extremófilos de acordo com o tipo de situação ambiental (temperaturas muito altas ou baixas, presença de metais, valores extremos de pH, entre outros). Em muitos casos os extremófilos são tão adaptados aos seus ambientes que eles nem sequer são capazes de sobreviver em condições normais

Quer saber um pouco mais sobre os extremófilos? Acompanhe neste texto alguns dos principais exemplos e suas curiosidades. 

1 – Termófilos

Termófilos são microrganismos que conseguem sobreviver e se multiplicar em altas temperaturas, geralmente em uma faixa entre 40 a 70 ˚C. Grande parte dos membros desse grupo vivem em águas quentes associadas a atividades vulcânicas ou fontes hidrotermais.

Bactérias e algas em uma fonte termal nos EUA. A coloração é devido pigmentos microbianos. Fonte: Brian W. Schaller/WIkimedia.

Há algum tempo foram descobertas arqueas e algumas bactérias que crescem em temperaturas muito maiores, em torno de 80 ˚C, 100 ˚C ou até mais. É uma condição tão extrema que esses microrganismos são chamados de hipertermófilos, para diferenciar do grupo anterior. 

O recorde de temperatura já relatada é da espécie Methanopyrus kandleri, a única forma de vida no planeta que consegue suportar uma temperatura de 122 ˚C. Para muitos microrganismos termófilos e hipertermófilos, temperaturas mais amenas são fatais.

Bactéria Thermus aquaticus, usada na PCR e isolada pela primeira vez em um parque de águas quentes nos EUA. Fonte: Wikimedia.

Um dos exemplos de maior sucesso da aplicação biotecnológica de extremófilos foi seu uso na PCR (veja uma melhor descrição dessa técnica aqui). A enzima DNA polimerase, responsável por sintetizar as fitas novas de DNA no processo, foi obtida da bactéria Thermus aquaticus. A vantagem da enzima é sua termoestabilidade, capaz de suportar os ciclos de temperatura da PCR, e sua ótima atividade em alta temperatura (entre 72-80˚C).

2 – Halófilos

Uma célula microbiana comum perderia água até secar se estivesse em um ambiente muito salino. Porém, para um seleto grupo de microrganismos chamados halófilos, viver sob alta salinidade não é um problema. Halófilos possuem mecanismos de adaptação que impedem os efeitos maléficos do excesso de sais.

As microalgas Dunaliella salina são uma espécie de halófilos extremos, presentes no Mar Morto e outros lagos hiper-salinos. Fonte: Researchgate

Esses microrganismos habitam algumas das regiões mais salgadas do planeta, como o Mar Morto em Israel e o Grande Lago Salgado nos EUA, entre outros exemplos. Para se ter uma ideia, a concentração de sais no Mar Morto é em média 10 vezes maior do que no oceano,  o que acaba sendo fatal para quase toda forma de vida.

Um fato interessante é que muitas vezes os halófilos utilizam pigmentos em seu processo de obtenção de energia. Como resultado, vários lagos habitados por microrganismos halofílicos possuem um aspecto colorido, geralmente em tom avermelhado. A Halobacterium salinarum é um dos principais exemplos desse grupo.

Lagoas de sal avermelhadas devido atividade metabólica de halófilos. Fonte: Futurism.

Os halófilos podem ser peças chaves para processos de biorremediação, pois muitos agentes químicos poluidores formam altas concentrações de sais no ambiente, inibindo o crescimento de outras formas de vida. Algas halófilas do gênero Dunaliella são a principal fonte de betacaroteno comercial, um pigmento com vários usos industriais.

3 – Psicrófilos

Psicrófilos vivem no extremo oposto dos termófilos. São microrganismos que se reproduzem em baixas temperaturas, de no máximo 20 ˚C, e que possuem uma temperatura ótima de crescimento de até 15 ˚C. Muitas espécies vivem em regiões com frio abaixo de zero.

Encontrar e caracterizar psicrófilos é um dos principais motivos para expedições nas regiões polares da Terra. Esses organismos também podem ser encontrados em altas altitudes ou nas profundezas do oceano. A menor temperatura para atividade microbiana parece ser próxima aos 20 ˚C negativos (embora possa mudar com novas descobertas).

A Antártica abriga várias espécies microbianas que conseguem viver em temperaturas negativas. Fonte: Pixabay.

Um dos principais problemas da vida microbiana no gelo é, ironicamente, acesso à água. Quando a água em estado líquido existe, costuma conter alta concentração de sais, acidez ou potencial oxidativo. Por esse motivo, é comum que psicrófilos sejam “poli-extremófilos“, isto é, adaptados a mais de uma condição extrema. 

Enzimas extraídas de psicrófilos podem ter muitas aplicações industriais. A empresa Novozymes já patenteou várias enzimas psicrófilas para serem usadas na produção de detergentes enzimáticos. Os psicrófilos também são estudados no intuito de se encontrar novas moléculas com potencial antimicrobiano para uso clínico. 

4 – Acidófilos

Acidófilos são microrganismos que, como o nome sugere, vivem em ambientes ácidos. Ambientes com pH menor que 4 são muito ácidos para a maioria dos seres vivos, e em geral existem devido à atividade vulcânica ou à mineração, embora haja exceções.

Os acidófilos mais extremos que existem são arqueas do gênero Picrophilus. As duas espécies de Picrophilus (P. oshimae and P. torridus) conseguem viver, incrivelmente, em valores de pH em torno de zero! Isso significa pura acidez, o que poderia ser usado para corroer um tecido vivo. As espécies foram encontradas no Japão na década de 1990.

Rio Tinto (Espanha), conhecido pela extrema acidez (pH 2 – 2,5), abriga espécies acidófilas como Acidithiobacillus ferroxidans e Ferroplasma acidophilum. Fonte: Wikimedia.

Enzimas acidófilas também possuem muita aplicação comercial, especialmente na área de alimentos. Porém, um potencial inovador para os acidófilos é seu uso na geração de bioenergia. É uma ideia ainda em desenvolvimento, baseada na tecnologia de Célula Combustível Microbiana (CCM), a qual consiste em utilizar energia química para gerar energia elétrica, através da ação de microrganismos.

Gostou de conhecer essas classes de extremófilos? O interesse por esses microrganismos cresce cada vez mais no campo da pesquisa devido a variedade de características e adaptações únicas que eles possuem. Existe muito potencial biotecnológico nas extremoenzimas (enzimas provenientes de extremófilos), que pode ser aplicado para áreas da saúde, indústria, meio ambiente, e outras ainda nem sequer exploradas!

Um outro campo que vem crescendo e que tem tudo a ver com extremófilos é a astrobiologia. A descoberta de microrganismos vivendo em condições tão diferentes do que geralmente vivem a maioria dos animais, despertou muitos questionamentos sobre os limites de habitabilidade no universo. Confira mais sobre esse assunto nesse texto.

Continue acompanhando nossas publicações para conhecer mais sobre o universo da microbiologia aplicada! 

Texto revisado por Letícia Cruz e Ísis Venturi
Referências:
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